Discurso da Presidenta da República, Dilma Rousseff, durante jantar por ocasião da entrega do Prêmio por Serviço Público, oferecido pelo Instituto Woodrow Wilson
Nova Iorque-EUA, 20 de setembro de 2011
Queria dirigir um cumprimento emocionado à senhora Jane Harman, presidenta do Woodrow Wilson Center, e dizer que, de fato, muito me emocionou esse retrospecto sobre a minha vida.
Queria agradecer também ao senhor Josué Gomes da Silva, presidente da Coteminas e ao senhor John Melo, presidente da Amyris.
Queria agradecer também a todos os que aqui prestigiam este encontro, este jantar.
Agradecer às senhoras e aos senhores empresários, acadêmicos, representantes do governo e da sociedade civil, brasileiros e americanos, que aqui se encontram hoje.
Cumprimentar os ministros e as ministras de Estado que me acompanham.
Cumprimentar cada um dos presentes, inclusive aos amigos, alguns dos quais eu tenho, nesta noite, o prazer de rever.
Quero dizer para vocês que eu recebo esta distinção em nome do povo brasileiro, verdadeiro agente dos avanços que meu país vem experimentando nesses últimos anos e responsável por eu estar aqui hoje.
Sem sombra de dúvida, eu tenho muita honra de ser – na cerimônia de amanhã da abertura do Debate Geral da 66ª Assembleia Geral da ONU – a primeira mulher a fazer uso da palavra naquela reunião, e acredito que naquele momento, também, eu represento a luta das mulheres de todo o mundo, tanto aquelas anônimas, como também as mulheres que chegaram a postos de liderança, a situações diferenciadas e que mostram que, sem dúvida nenhuma, este século XXI é o século das mulheres.
Eu queria agradecer a cada um de vocês e dizer que eu tenho muito orgulho do momento que o meu país vive, mas, ao mesmo tempo, muita preocupação com a situação do mundo.
Nós sabemos que o Brasil, nos anos recentes, obteve um incremento de sua renda média e uma forte redução da desigualdade social e, ao mesmo tempo, atingiu, nos últimos meses – para não dizer nos últimos dois anos – uma situação de quase pleno emprego.
Esse fato permite que eu externe, também, aqui a minha imensa preocupação com o que está ocorrendo nos países desenvolvidos no que se refere não só aos efeitos da crise econômica, mas também aos efeitos sobre a sociedade, principalmente aos efeitos que o desemprego produz.
Eu queria dizer que hoje o mundo passa por uma situação muito especial e que cada um de nós, mesmo países que, por características da sua trajetória, não são objetos, não estão inteiramente comprometidos e contagiados com a crise pela qual o mundo atravessa, principalmente o mundo desenvolvido, não podem ficar numa situação confortável e passiva, olhando os fatos acontecerem.
Por isso que a trajetória do meu país me é tão cara e acredito também que pode servir para dar uma contribuição nessa situação por que o mundo passa.
Nós fizemos um vasto programa de inclusão social, que trouxe para a classe média mais de 40 milhões de brasileiros, que trouxe para o poder de consumo, que trouxe para atividades... enquanto trabalhadores, enquanto empreendedores.
Nós sabemos que, mesmo assim, persistem grandes desafios que nós nos determinamos a enfrentar. Um desses desafios é consolidar o nosso mercado interno e assegurar que esse mercado interno se combine com a nossa situação no mundo, garantindo não só oportunidades de investimento para os brasileiros e para os demais países do mundo, mas também permitindo que esse grande mercado interno muitas vezes sirva de âncora para que nós enfrentemos os momentos mais turbulentos dos próximos anos e deste ano.
Quero dizer aos senhores que, além de ser uma questão moral, a luta contra a extrema pobreza tem grande significado econômico no meu país. É ela a responsável pela importância do Brasil como país emergente, porque um país emergente, com 190 milhões de consumidores, trabalhadores e empreendedores, é muito diferente de um país cortado e dividido pela desigualdade social.
Por isso, que quero dizer para vocês que um dos maiores desafios do meu governo é, de fato, reduzir a extrema pobreza, tratando de incorporar os restantes bilhões [milhões] de brasileiros e brasileiras que ainda vivem na extrema miséria para [a] uma situação de civilização, de consumo, de renda e de trabalho.
Nós, de fato, fomos um dos primeiros países a sair da primeira fase da crise, em 2008. Estamos, hoje, ainda mais preparados para enfrentar essa nova fase da crise internacional. Nossos fundamentos são sólidos; reservas internacionais aumentadas em relação ao que tínhamos anteriormente; bancos saudáveis; contas públicas ordenadas; uma relação de dívida sobre o Produto Interno Bruto muito baixa para os padrões internacionais; empresariado confiante; empresariado experiente; e um Estado que assumiu suas responsabilidades estratégicas para com a economia, sobretudo a garantia do controle da inflação e a garantia de um processo de crescimento e um processo de inclusão social no Brasil.
Nossa medida anticíclica mais eficaz foi, sem dúvida, a ampliação no nosso mercado interno por meio da inclusão, como eu já disse, de milhões de brasileiros.
Hoje o Brasil está adotando, também para fazer face à crise, uma ativa política de investimento e expansão da demanda, tanto por meio do investimento público, mas também, e sobretudo pelo que nos interessa, pelo investimento privado.
No que se refere ao investimento público, o Programa de Aceleração do Crescimento, os programas que levam em conta toda a sustentação do investimento privado no Brasil com desonerações, melhoria das condições de crédito, e também o nosso programa habitacional têm sido elementos fundamentais, não só de garantir o emprego, de garantir as nossas políticas sociais inclusivas, mas também de ser fortes elementos anticíclicos.
Considero que as políticas industriais que fortalecem a inovação, as desonerações fiscais a que eu já me referi, as políticas de capacitação profissional impulsionam hoje a transformação produtiva do meu país, contribuindo para enfrentar este mundo mais competitivo e as novas demandas sociais.
Mantemos uma matriz energética limpa, mantemos nossos compromissos, assumidos voluntariamente, em relação à questão da Conferência de Copenhague e da redução da emissão de gases de efeito estufa, e temos muito orgulho da nossa agricultura, produtora de alimentos, eficiente e de elevada competitividade. Temos também muito orgulho dos nossos programas de produção de energia limpa, baseada no etanol.
Senhoras e senhores,
Nós sabemos que a paz universal foi a causa a que o presidente Woodrow Wilson consagrou a sua vida. Em meio ao nacionalismo mais exacerbado da sua época, e que provocou a Primeira Guerra Mundial, ele não hesitou em defender o multilateralismo. Tinha convicção de que não haveria paz enquanto não se abolisse o uso da força entre as nações e se estabelecesse o diálogo.
Hoje, 92 anos após, a comunidade internacional encontra-se em encruzilhada distinta, mas igualmente grave. Não estão superadas as velhas ameaças que preocupavam Woodrow Wilson. Acirra-se hoje a corrida mundial por recursos e mercados sem que as guerras localizadas tenham sido abolidas.
O aquecimento global e a crise financeira, para serem enfrentados, vão exigir soluções mais interdependentes, coletivas, multilaterais. O mundo é, sem dúvida, hoje, muito mais complexo e multipolar. Os países em desenvolvimento emergem como fator positivo na economia global, mas eles também sofrem os efeitos de uma crise nascida da insensatez e da incapacidade política de comandar a economia.
Precisamos de iniciativas para reorientá-la rumo ao crescimento e redefinir o sistema financeiro global, de forma a assegurar maior estabilidade para todos os países do mundo.
No momento em que debatemos o clima, a política internacional e a economia do século XXI, fica patente a importância de dar continuidade às reformas dos organismos econômicos multilaterais, como o Fundo Monetário e o Banco Mundial, e a importância também da reforma da ONU.
Senhoras e senhores,
Sopram ventos de mudança na América Latina, em especial na América do Sul, que consolida sua democracia e sua soberania, que cresce e distribui renda.
Estamos forjando, por meio da Unasul, uma integração que reflete o potencial de uma região com vastos recursos energéticos, minerais, alimentares, de água e de biodiversidade; de uma região sem armas de destruição em massa, sem conflitos étnicos e sem nenhuma forma de violência armada.
Senhoras e senhores,
A eleição do presidente Obama aproximou ainda mais os Estados Unidos e o Brasil, duas democracias multiculturais e pluriétnicas. Concordamos em que o multilateralismo é fiador da paz, em que a justiça social é garantia da democracia. Temos muitos princípios em comum.
O Brasil, como vocês sabem, pratica uma diplomacia universalista. Aproximamo-nos da África, consolidamos a integração latinoamericana e fortalecemos laços de comércio e investimento com uma Ásia que cresce e é pujante. Forjamos coalizões em defesa de causas que projetam as convicções mais profundas do povo brasileiro no Ibas, nos Brics, no G-20, buscando alternativas para resolver uma crise de imprevisíveis consequências.
O Planeta, sem dúvida nenhuma, tem dificuldade de suportar as pressões de uma globalização que é... com efeitos muito fortes sobre o meio ambiente, sob o aspecto social e sob o aspecto econômico. Por isso, é muito importante para o Brasil sediar a Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, porque isto significa – naquela conferência que é sobre economia verde, sobre economia sustentável, sobre meio ambiente e energia limpa –, significa colocar em perspectiva o próprio crescimento e a sustentabilidade.
Em todos esses temas, queremos os Estados Unidos como um dos interlocutores mais próximos. Hoje estivemos juntos na abertura de um encontro que eu considero muito importante e que é uma iniciativa conjunta – que começa com a sugestão do presidente Obama na Conferência, do ano passado, das Nações Unidas –, que é o governo aberto. É uma questão que diz respeito não apenas ao combate da corrupção, mas, sobretudo, à maior eficiência, ao melhor uso dos recursos públicos e à utilização da tecnologia em prol de um governo aberto, de um governo que permite aos seus cidadãos terem acesso a todas as informações e a controlarem também a qualidade dos serviços prestados por este governo aos seus cidadãos.
Senhoras e senhores,
A intensificação dos fluxos de comércio e de investimento entre o Brasil e os Estados Unidos mostra o quanto podemos realizar juntos. Os Estados Unidos são o principal investidor estrangeiro direto no Brasil, e o meu país se tornou importante investidor aqui nos Estados Unidos.
Nosso comércio bilateral ultrapassa os US$ 46 bilhões e nosso desafio é torná-lo mais equilibrado e permitir que as partes façam uma estrutura de ganha-ganha. Sem sombra de dúvida, o Brasil e os Estados Unidos, pelos seus princípios democráticos, podem e devem – nesta região e no resto do mundo – assumir parcerias como esta do governo aberto, que vão contribuir muito para o desenvolvimento, para uma melhor utilização dos recursos do Planeta.
Nós, Brasil e Estados Unidos, somos sociedades dinâmicas e empreendedoras, capazes, portanto, de forjar uma aliança em favor de um planeta mais próspero, mais comprometido com a energia limpa e com o desenvolvimento sustentável e democrático.
Woodrow Wilson nos deixou lições. Entre elas, eu queria destacar uma. Ele compreendeu que a ação política só é eficaz quando sustentada pelo idealismo, pelos ideais e pela capacidade dos homens e das mulheres de transformarem suas convicções em realidade, principalmente quando essa política está baseada e sustentada pelo idealismo de querer almejar um mundo melhor.
Construir essa aliança e essa ação é a melhor homenagem que nós, brasileiros e americanos, podemos prestar a Woodrow Wilson.
Muito obrigada.
Eu tenho muita honra, e agradeço o convite feito pela Jane Harman, de integrar o conselho de mulheres líderes do mundo. Muito obrigada pelo convite. Eu estou muito honrada de aceitar e de participar do Conselho.
Obrigada.
Ouça a íntegra do discurso (20min08s) da Presidenta Dilma