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Discurso da Presidenta da República, Dilma Rousseff, na cerimônia de abertura da III Cúpula América do Sul-África

 

Malabo-Guiné Equatorial, 22 de fevereiro de 2013

 

Senhoras e senhores, nessa nossa reunião entre duas grandes regiões do mundo: a África e a América Latina.

Queria cumprimentar o excelentíssimo senhor Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, presidente da República da Guiné Equatorial e a senhora Constancia Mangue de Obiang Nguema Mbasogo.

Senhoras e senhores Chefes de Estado e de Governos presentes na III Cúpula América do Sul-África.

Excelentíssimo senhor Hailemariam Desalegn, primeiro-ministro da Etiópia e presidente da União Africana.

Excelentíssimo senhor Nicolás Maduro, vice-presidente da Venezuela.

Senhora Maria Coloma Edjang, prefeita de Malabo.

Senhoras e senhores ministros integrantes das delegações.

Senhoras e senhores profissionais da imprensa.

Senhoras e senhores.

 

Eu tenho grande satisfação em regressar ao continente africano e visitar pela primeira vez a Guiné Equatorial.

Saúdo meus colegas africanos e sul-americanos. Muitos dos quais tive o prazer de receber no Rio de Janeiro durante a Conferência Rio+20. Agradeço especialmente ao presidente Teodoro Obiang e ao povo da Guiné Equatorial que nos acolhem de modo tão hospitaleiro, fraterno, generoso e cujo empenho resultou na excelente organização deste encontro.

Senhoras e senhores,

Esta III Cúpula ocorre em momento especial para a América do Sul e a África. Em contraste com o cenário internacional de crise econômica-financeira, que neste momento atinge de forma mais aguda a Europa, a chamada Zona do Euro, nossos continentes têm experimentado, nos últimos anos, considerável dinamismo com taxas de crescimento sustentadas, aumento da renda e redução da pobreza.

Foi-se o tempo em que nós éramos parte de uma periferia distante, silenciosa ou calada e problemática. O mundo em desenvolvimento tornou-se vital para a economia global, e já responde por mais da metade do crescimento econômico, e por mais de 40% do investimento em escala mundial.

Desafiando os céticos de sempre, a África e a América Latina são hoje uma região em processo de transformação política e econômica, que constrói suas nações, sua democracia, sua economia com estabilidade e olhando para sua população.

A África é um continente a cada dia mais rico em realizações e em possibilidades. Aliás, dos dez países com maior crescimento previsto até 2015, sete são africanos. O comércio entre a África e a América do Sul passou de US$ 7 bilhões em 2002, para US$ 39 bilhões em 2011. Um crescimento de 447% em dez anos. No entanto, ele é pequeno se nós considerarmos o nosso potencial. Ele é pequeno se nós considerarmos o tamanho dos nossos continentes, da nossa população, dos nossos recursos naturais.

Apesar da nossa corrente comercial ser equilibrada, ainda temos um percentual pequeno de intercâmbio – apenas 2,8% das vendas sul-americanas são destinadas à África, foram destinadas à África em 2011. Enquanto só 3% das exportações africanas orientaram-se para o mercado sul-americano. Portanto, o nosso potencial de crescimento do comércio intercontinental é excepcional. As perspectivas do crescimento nos nossos continentes também são muito boas. E isto ocorre em ambas as margens do Atlântico Sul. E, sem dúvida nenhuma, a parceria, a cooperação na ASA é um elemento estratégico e fundamental para que isto se materialize.

Senhoras e senhores, meus amigos, minhas amigas,

O Brasil construiu na última década - a partir da chegada ao poder do nosso ex-presidente Lula - um modelo de desenvolvimento que tem por eixo estruturante e por motor do nosso crescimento, do nosso crescimento econômico, a inclusão de milhões e milhões de brasileiros e brasileiras, de trabalhadores a partir de uma nova visão de política econômica e social.

No nosso país sempre afirmaram as vozes do conservadorismo que primeiro o Brasil tinha de crescer e depois a gente poderia distribuir renda. O que nós descobrimos foi que: países possuem riquezas naturais, mas a maior riqueza de um país é a sua população. E por isso, nós acreditamos e desenvolvemos um modelo de crescimento em que a formação de um grande mercado consumidor, trabalhador e empreendedor é a base do crescimento econômico e também do resgate social, cultural e político.

Nós somos um país que tem uma raiz profunda na desigualdade. Como os senhores sabem, e nós nos orgulhamos muito das nossas raízes fincadas no continente africano, mas nós temos uma história de escravidão, de colonialismo, de desigualdade social que temos de resgatar. E por isso, ao olhar a década, essa última década no Brasil, nós olhamos com orgulho e satisfação. Nós geramos mais de 19 milhões de empregos, recuperamos o poder de compra dos salários e, com o nosso programa Bolsa Família, retiramos 36 milhões de brasileiros da condição de miséria. Nós aprendemos nesse caminho. E é por isso, que nos últimos dois anos do meu governo nós conseguimos retirar da miséria, da pobreza extrema, 22 milhões de brasileiros.

Talvez seja essa tecnologia social que está baseada na determinação política, que está baseada na eficiência de gestão, que está baseada, também, num firme compromisso e numa percepção da importância do povo brasileiro no desenvolvimento, que nós conseguimos formatar essa tecnologia social que é a nossa maior honra. Ela está baseada numa prioridade, a questão da miséria. Ela está baseada numa prioridade, a questão do povo brasileiro.

Por isso, a grande contribuição entre as grandes contribuições que o Brasil pode prestar, está todos os nossos programas sociais. Tanto baseados na renda como baseado ao acesso dos serviços públicos - como é o caso da eletricidade, da água; como é o caso também do acesso a serviços públicos de educação e saúde. Todos os nossos países têm um passado de desigualdade e tem de ser nosso compromisso superar.

Agora, nós sabemos no Brasil, que o fim da miséria é apenas o começo. É um glorioso começo, porque a partir daí as pessoas demandam melhoria na qualidade da educação, melhoria na produção de tecnologias, acesso à banda larga, acesso à internet, enfim, demandam todas aquelas condições que é dada por países mais desenvolvidos.

Por isso, paralelamente à questão do enfrentamento da miséria, nós também tomamos um conjunto de medidas para melhorar a produção e manter o cenário de quase pleno emprego em que o Brasil se encontra. E temos e compartilhamos muito dos problemas - todos os presentes, os dirigentes presentes nessa sessão enfrentam - o problema da infra-estrutura, do aumento da energia, enfim, nós aqui falamos a mesma língua porque temos problemas e histórias similares.

Mas eu estou aqui hoje para propor e construir parcerias concretas. Quero propor como mais uma parceria entre nós e para os países africanos no âmbito da ASA, uma parceira na área da formação de professores e gestores para o ensino técnico profissionalizante para a formação de estudantes especialmente do setor agropecuário.

O Brasil e a África não só nós temos uma raiz cultural, social e histórica do ponto de vista da nossa nação, acredito que sejamos o país que tenha a maior quantidade de africanos na sua formação, mas também porque somos, fizemos parte de um mesmo grande continente. Portanto, características da agricultura brasileira estão presentes aqui na África, na medida em que nosso solo tem similaridade, os nossos climas têm similaridades, e nós demos um grande passo na questão da agricultura tropical e de toda uma política também de garantia e de combate à fome. Nós usaremos toda a rede que o Brasil tem de institutos federais de ensinos técnicos, profissionais. Usaremos a nossa Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, a parceria com entidades empresariais do setor agrícola e do setor industrial para dar suporte à formação tanto de estudantes quanto de professores, de técnicos como de agrônomos, na área do ensino médio como na área do ensino universitário. Na última década, o Brasil ofertou mais de 5 mil bolsas de estudo de graduação e pós-graduação. Nós também criamos a universidade, a chamada Unilab, universidade voltada para a integração com a África e América Latina, que hoje já tem mais de mil estudantes. Mas nós queremos caracterizar essa cooperação e focá-la mais ainda em áreas que nós podemos fazer a diferença com a nossa cooperação.

Outra iniciativa importante que também nós colocamos à disposição é a Universidade Aberta do Brasil, de ensino à distância, que hoje já opera um pólo presencial em Moçambique. Estamos dispostos a ampliar essa rede especialmente para os cursos, repito, de agronomia e da área de saúde. Queremos também ampliar as parcerias de pesquisa científica e tecnológica em todos os campos. Com o apoio das 37 embaixadas do Brasil na África nós nos dispomos a oferecer cursos de língua portuguesa para facilitar o acesso aos programas mencionados.

Queria lembrar aos senhores que no passado nós construímos a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária enviando para o exterior na década de 70, 80, final da década de 70 e início da década de 80, enviando mil estudantes para os Estados Unidos e a Europa. A partir desses mil estudantes nós criamos, talvez, uma das tecnologias agrícolas mais competitivas do mundo. O que nós estamos oferecendo aos senhores é uma trajetória diferente dessa. Nós estamos oferecendo não só a formação lá no Brasil, mas também - com o apoio dos senhores - aqui na África, o que nós consideramos que nós temos de melhor. Aliás as atividade do escritório da Embrapa, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, em Gana; e de projetos como a fazenda modelo para produção de algodão, nos países do Cotton 4 e o Pró-Savana, em Moçambique, são exemplos bem sucedidos de cooperação para o desenvolvimento agrícola.

Na área da saúde, nós também temos muito interesse no estabelecimento do escritório da Fundação Oswaldo Aranha, que é a nossa fundação que produz remédios e vacinas. E aqui na África, a fábrica de produção de antirretrovirais, que amplia as fontes de suprimento de medicamentos e, nós queremos também nesta área, fazer transferência de tecnologia de conhecimentos acumulados pelo Brasil nesse campo.

Ao mesmo tempo, nós consideramos muito importante a diversificação das pautas comerciais e dos investimentos. Achamos que a parceria governo, ela tem de contemplar também a  parceria entre empresas, a parceria também com a sociedade, a parceria cultural. E, olhamos com muito interesse a formação de mecanismos de incentivo para que mais empresas, produtos e serviços, cruzem o Atlântico nos dois sentidos.

Saúdo, nesse sentido a aprovação do programa para o desenvolvimento da infraestrutura na África, com a execução pelo Banco Africano de Desenvolvimento, que inclui projetos de infraestrutura energética, transporte, tecnologia da informação e recursos hídricos.

Nós achamos importante e fundamental, e por isso estamos abertos e motivados a construir o grupo de trabalho que irá definir de forma muito clara as condições para um fundo de financiamento de projetos em todas as áreas nas nossas regiões. Esse fundo de financiamento terá de ser colocado em pé e aí se definirão os fundings, as participações e os métodos de liberação de recursos.

Na área da política internacional eu ressalto os grandes avanços institucionais nos dois continentes. Saúdo na América do Sul, a formação da Unasul que une todos os países do continente, e que tem afirmado um perfil muito claro em favor do desenvolvimento, da distribuição de renda, da ampliação da renda, do emprego e da democracia em nossos países. A União Africana, por sua vez, pavimenta a construção da paz e a consolidação da democracia nesse lado do Atlântico. Unasul e União Africana são dois elementos cruciais da ASA e da nossa cooperação.

Em janeiro, em Montevidéu, fortalecemos nossa Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul, a ZOPACAS. Os acordos da Comunidade Econômica dos Estados da África Central evitaram a  escalada de conflito. A Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental e a CPLP – Comunidade dos Países de Língua Portuguesa têm apoiado a ordem constitucional. A situação no Sahel suscita preocupações. Consideramos que o encaminhamento para a situação no Mali deve seguir moldura definida pelo Conselho de Segurança da ONU e envolver - sobretudo e essencialmente – a participação de países africanos.

Para o Brasil é urgente a reforma da ONU. Nada justifica que África e América do Sul permaneçam sem representação permanente no Conselho de Segurança. É também urgente a reforma na governança do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial para que esses organismos multilaterais sejam mais sintonizados com as demandas, com os pleitos e com os anseios do mundo em desenvolvimento.

Na Conferência Rio+20 nós incorporamos crescimento com a inclusão social à agenda da sustentabilidade. Os interesses comerciais e as nossas parcerias econômicas recomendam esforços articulados para expressão dos nossos interesses na Organização Mundial do Comércio. Temos a oportunidade de constituir um amplo entendimento na eleição do novo diretor-geral dessa importante instituição multilateral. O Brasil oferece uma candidatura.

Senhoras e senhores, estamos unidos em um grande projeto comum. Um projeto de crescente aproximação e de objetivos compartilhados. Uma parceria entre iguais, diferentemente do que fizeram conosco ao longo de várias e várias décadas. Uma parceria entre iguais que se constrói no respeito mútuo, voltada para o desenvolvimento e para o bem-estar de seus povos. Uma parceria que não admite que se introduza em qualquer relacionamento entre os nossos países ou nossas empresas exigências extra-pauta, exigências estranhas e muitas vezes que não atendem o interesse das nossas nações. Sobretudo exigimos uma parceria voltada para o desenvolvimento e o bem-estar dos nossos povos em que ela só é admissível se nós todos ganharmos.

Acredito, do fundo do coração, que o século 21, as próximas décadas, serão de afirmação do mundo em desenvolvimento e, especialmente, da África e da América Latina. Nós temos a oportunidade histórica de reduzir a distância, tanto econômica quanto social, que ainda nos separa dos países mais avançados. Seremos – África e América do Sul – protagonistas decisivos desse novo cenário histórico e de uma cultura de paz, solidariedade, justiça social e cooperação fraterna. Alegra e honra pensar que nós podemos fazê-lo juntos. Viva a Unasul e a América do Sul. Viva a África. Viva a Ásia. Vamos juntos. Muito obrigada.

 

Ouça a íntegra do discurso (20min12s) da Presidenta Dilma