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Entrevista coletiva concedida pela Presidenta da República, Dilma Rousseff, na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20) - Rio de Janeiro/RJ

Transcrição do Áudio

 

Rio de Janeiro-RJ, 22 de junho de 2012

 

Jornalista: Presidenta, boa tarde.

Presidenta: Boa tarde.

Jornalista: O Correio Braziliense, no último final de semana publicou uma matéria sobre...

Presidenta: Ô gente, primeiro vamos para as matérias da Rio+20?

Jornalista: Então, quem é que vai perguntar sobre Rio+20?

Presidenta: Pelo amor de Deus. Eu estou aqui na Rio+20. Eu proponho que nós nos concentremos nas matérias internacionais. Eu dou a entrevista que vocês quiserem, no finalzinho. Agora, primeiro Rio+20.

Mariazinha, com a palavra.

Jornalista: Presidente, como é que a senhora vê essa reação da sociedade civil ao documento final da Rio+20 e essa avaliação de que o governo brasileiro, a diplomacia, tem alguma responsabilidade nisso, de fechar um documento fraco, para ter um documento, para não repetir conferências anteriores, que fracassaram?

Presidenta: Eu vejo com muita normalidade a manifestação da sociedade civil. Agora, eu acho importante a gente entender do que se trata, o que está acontecendo aqui. O que está acontecendo aqui é uma conferência entre países soberanos. No passado nós tivemos um momento, durante a Guerra Fria, em que havia bipolaridade. As discussões estavam dadas entre duas concepções do mundo e os países se dividiam em relação a ela. Depois houve aquele momento em que o pensamento único e uma proposta de unipolaridade pareciam ter se adonado do mundo. Nós, agora, vivemos numa outra circunstância histórica e que é muito importante que a gente entenda, que é o multilateralismo.

No multilateralismo, você constrói consensos históricos. O que é consenso histórico? É o consenso possível num determinado momento histórico. Um país, como o Brasil, que recebeu a missão de organizar uma conferência entre as partes, que envolvem mais de 190 países, ele é responsável por construir o consenso possível. O consenso possível é um ponto de partida, não é um ponto de chegada. Se hoje é possível ter esse consenso, é porque as nações evoluíram até ali. Isso não significa que, a partir dali, os países não possam ter suas próprias políticas. Por exemplo, o Brasil definiu, em 2009, na Conferência de Copenhague, quando não houve consenso nenhum - porque lá não houve consenso nenhum - não é que não havia nenhuma plataforma. É que não havia nenhuma compatível com o conjunto dos países, porque era o momento, talvez, de maior acirramento dos conflitos. Agora, não.

Agora, nós construímos um ponto de partida. Um documento de Conferência sobre o Meio Ambiente e sobre Desenvolvimento Sustentável, a Biodiversidade, a Erradicação da Pobreza é, necessariamente, um ponto de partida, porque é até onde as nações chegaram, no seu conjunto.

Agora, o que nós temos de exigir é que, a partir desse documento, as nações avancem. O que nós não podemos conceber é que alguém fique aquém dessa posição, além dessa posição todos devem ir, todos devem ir. E isso significará que a próxima Conferência terá de ter um salto na frente. Eu tenho certeza que, se a gente tivesse 190, mais de 190 Organizações Não-Governamentais, seria muito difícil obter um consenso. Agora, todo consenso é uma construção.

O Brasil se orgulha muito de receber a Rio+20. Se orgulha muito de ter conseguido realizar essa Conferência, e realizá-la de forma organizada, e assegurar a mais ampla participação de todas as conferências que já ocorreram, tanto no que se refere à questão dos diferentes países como no que se refere à participação na Cúpula dos Povos, no Fórum das Cidades, nos Fóruns Empresariais, em todos os fóruns em que as pessoas tiveram interesse de participar.

Utilizamos um instrumento fundamental, que foi a internet, para receber as sugestões para os diálogos que seriam feitos entre os líderes. Selecionamos todas as perguntas e levamos essas perguntas e essas indagações, essas considerações ao conhecimento de todas as lideranças. Achamos que a multiplicidade de vozes que se fez ouvir aqui na Conferência, inclusive aquelas que nos criticaram e, inclusive, o debate que houve aqui dentro, ele é uma demonstração de uma certa maturidade do mundo no que se refere a discussões.

Nós, de fato, mudamos de patamar. Ser multilateral significa levar em conta a outra posição. Nós não temos como tirar uma posição comum nas conferências das partes, que são os diferentes países, sem levar em conta que eles têm estágios diferenciados de consciência e de compromisso.

Agora, nós também percebemos que há muitas questões que têm de avançar e vou dar uma, por exemplo: em Copenhagen, mesmo não tendo chegado a um acordo, que expressou-se em um documento, algumas questões foram levantadas e eram mais ou menos um consenso implícito. Exemplo: a necessidade de financiamento de diferentes países, notadamente, os países mais frágeis da África e as pequenas ilhas e os países que estavam ameaçados de conseqüências danosas por desastres naturais, inclusive alguns que ficavam submersos em alguns momentos. E que isso implicaria em criar um fundo dos países desenvolvidos para financiá-los. Ora. E que isso era uma função dos países desenvolvidos. Obviamente, os demais países, emergentes, quem pudesse poderia dar a sua contribuição.

O que a gente vê, três anos depois. Isso não ocorreu. O que eu acho que é importante quando você tem um documento escrito é que ninguém pode negar ou esquecer o que está escrito no documento. A vantagem do que nós chegamos aqui com o documento da Rio+20 é, primeiro, ele foi discutido entre centenas de países; segundo, é que está escrito os compromissos que terão de ser cumpridos.

Agora, muitos países não quiseram assinar a questão do financiamento. Uma das formas de se evoluir daqui para frente é colocar isso na pauta. Porque lá em Copenhague não foi posto. Os países desenvolvidos não querem que isso seja posto na pauta. E nós queremos que seja posto na pauta. Agora, tem de respeitar quem não quer. Então, só pode avançar daqui para frente. Até onde estamos, foi até onde avançamos em conjunto. Para avançar mais vai ter de ter a construção de um consenso. Nós não vivemos em um mundo bipolar mais, nem o mundo do pensamento único. Então, respeitar as diferenças para cada um de nós é fundamental. Eu posso até achar a minha posição mais avançada, eu posso até achar que a minha posição é mais evoluída, mais lúcida. Agora, isso não me dá o direto é, em geral, eu não estou falando Brasil, eu estou falando em tese, não dá direito a ninguém de impor a sua posição a outro país. Eu tenho de construir um consenso. E construir um consenso é necessariamente um processo de diálogo e discussão e de conclusões mínimas.

Eu acho que nós temos, nós mostramos duas coisas na Rio+20. Nós mostramos que um país emergente é capaz de fazer uma reunião com padrão internacional e mostramos também que esse país tem responsabilidade política de construir um documento em conjunto com as nações mais diversas desse planeta.

Num momento em que é tão difícil, você vê, haver consensos no mundo, onde até pessoas, organismos e países que criaram uma zona comum econômica, com dificuldade de estruturar um consenso, é muito importante que a Rio+20 tenha chegado a um documento único e tenha sido essa conferência participativa que a Rio+20 foi.

Jornalista: (incompreensível)

Presidenta: Mariazinha, vai haver protestos porque você não está sendo muito multilateral, porém eu responderei a sua pergunta. Eu responderei. É o seguinte Mariazinha: eu acho que o secretário-geral da ONU manifestou a posição dele, não me cabe analisá-la. Não é papel do governo brasileiro fazer análise de nenhum posicionamento de nenhum país. Nem tão pouco de organismos internacionais.

Jornalista: Presidente, a senhora falou da ampla participação na Rio+20, por meio de ONGs e número de países, não obstante, um representante das ONGs discursou pedindo para que retirasse um trecho do documento que fazia menção a esta ampla participação. Isso reduz um pouco o mérito dessa ampla participação?  E dois, quando a senhora falou do fundo, que a partir de agora ficaria na agenda. Esse fundo, no seu entendimento, demora quanto para ser criado e há uma discussão se o Brasil deve contribuir e com quanto para esse fundo também. E por último, queria que a senhora falasse sobre os desenvolvimentos do Paraguai, para onde foi o ministro Patriota ontem.

Presidenta: Perfeitamente. Primeiro, então, o que você perguntou, porque é difícil, vamos fazer a primeira. A primeira é se um representante pode pedir a saída de um trecho. Olha, o documento é um documento entre países e como tal, ele não está assinado por nenhum órgão da sociedade civil. Ele está assinado por nações e países. É óbvio que é possível ter um documento das ONGs. Agora, veja você, eu não posso substituir a fala de uma pessoa pela fala de um país. Eu não posso tratar com o mesmo peso. E não foi essa e nem é esse o objetivo de nenhum documento de nenhuma conferência das partes.

Aliás, eu participei ativamente da Conferência de Copenhague e quero dizer que eu nunca vi isso ocorrer em lugar nenhum. Agora, acho que aqui no Brasil nós construímos um espaço para as ONGs participarem e falarem. Nós construímos um espaço para escutá-las, porque os diálogos foram feitos por iniciativa do governo brasileiro. Os diálogos foram abertos a quem quisesse participar e discutir conosco. Agora, eu não posso impor à ONU um padrão, que o da ONU é o seguinte: ela escuta, mas a participação final é de países. Ela é uma organização, como o próprio nome diz, das Nações Unidas. Eu cumpro também esse formato, que é o formato ONU de conferência entre partes. Partes significa sempre países, ou seja, é assim: a parte francesa fala uma coisa, a parte brasileira fala outra; a parte chinesa fala uma coisa; a parte americana fala outra. A conferência das partes é uma conferência entre nações e países.

A segunda pergunta sua...

Jornalista: O Fundo...

Presidenta: O Fundo. Olha, eu vou olhar uma coisa para vocês. Eu tenho participado, esta semana, de duas reuniões. Participei, primeiro, da reunião, em Los Cabos, do G-20. Nessa reunião de Los Cabos, do G-20, eu assisti uma coisa fantástica. Eu assisti os países dos BRICS colocarem US$ 75 bilhões no Fundo Monetário Internacional. Até aí havia uma discussão a esse respeito. Nós colocamos, exigindo que se respeite a proporcionalidade existente hoje entre a força econômica dos países do mundo, considerando a força dos países dos BRICS, a força dos países emergentes, a força do Brasil, da Índia, da China, da Rússia, da África do Sul. Até aí tudo bem, mas uma coisa eu queria registrar e ressaltar. Um país africano, a África do Sul, teve a generosidade, a consciência política da importância internacional da Europa, e contribuiu com US$ 2 bilhões para se criar o chamado firewall ou o muro de contenção que o FMI pode resultar.

Aí, nós chegamos aqui, nesta questão da participação nos fundos verdes ou no PNUMA, ou em todos os fundos para os países africanos e para as pequenas ilhas. O Brasil assumiu, junto com a China, o compromisso similar de colocar, no PNUMA, mais US$ 6 milhões. E na África, para os países africanos e para os países, as pequenas ilhas, para os processos de mitigação e adaptação desses países, mais US$ 10 milhões.

Obviamente, nós iremos acompanhar todas as iniciativas, proporcionalmente ao peso deste país, ao peso do Brasil. Nós achamos e, com esse gesto, nós achamos que é fundamental introduzir a questão dos fundos na pauta, daqui para frente. É  voluntário, o Brasil põe o que quer, cada um põe o que quer, mas é um sinal de que nós achamos que temos de caminhar nessa direção.

Jornalista: (incompreensível)

Presidenta: Não, nós botamos já. Só falta... Só temos de aprovar, não é? Nós temos de fazer. Vocês sabem como é que a lei brasileira é, nós temos de aprovar, mas não vejo nenhum obstáculo nisso.

Jornalista: Paraguai?

Presidenta: Paraguai. Nós estamos, aqui na América, com dois grandes organismos bilaterais. Um organismo é a Unasul, e o outro organismo é o Mercosul. A Unasul tem 12 membros, todos países da América do Sul, que não América Central, nem Caribe, América do Sul, integram a Unasul, são 12 países.

No acordo, no protocolo que nós assinamos, que constitui a Unasul, foi assinado pela Argentina – vou dar os países – a Bolívia, o Brasil, o Chile, a Colômbia, o Equador, a Guiana, a República do Paraguai, a do Peru, o Suriname, a Oriental do Uruguai e a Bolivariana da Venezuela. Esses países assinaram o texto da Unasul. E nesse acordo, no chamado Protocolo Adicional do Tratado Constitutivo da Unasul sobre Compromisso com a Democracia, tem o item 1, artigo 1: “O presente protocolo se aplicará em caso de ruptura ou ameaça de ruptura da ordem democrática, de uma violação da ordem constitucional ou de qualquer situação que ponha em risco o legítimo exercício do poder e a vigência dos valores e princípios democráticos”.

Quando ocorrer ou como diz aqui é se criar uma situação que põe em risco esses valores, o organismo prevê uma ação, que é uma ação ou dos presidentes e chefes, geralmente, na América do Sul, é presidente, ou uma reunião, ou ação por mandato dos presidentes dos ministros de Relações Exteriores, dos chamados chanceleres. E foi isso que foi feito.

Nós tomamos conhecimento, esses 12 países, a maioria estava aqui e os que não estavam aqui no momento tinham chanceleres ou representantes, ou alguns participaram por telefone. Se eu não me engano, o Chile, que já tinha ido embora. E nós avaliamos que a situação no Paraguai era uma situação muito complicada. Por quê? Porque achávamos que a gente tinha de cuidar para que houvesse o respeito aos princípios elementares de justiça que caracteriza uma democracia: direito de defesa, direto de apuração. Enfim, que houvesse a manutenção da ordem democrática. Para isso, os países enviaram os chanceleres de todos nós. O único que não pode ir foi o da Guiana, mas de todos os demais países – Colômbia, Chile, Argentina, Brasil, é Equador, Venezuela, Uruguai e Peru – todos compareceram – e Suriname. Todos foram lá e estão lá ainda.

É óbvio que a tentativa dos chanceleres é criar um ambiente que viabilize uma solução menos traumática para a democracia, na medida em que, o presidente Lugo tenha o mandato dele, mais oito meses, nove meses, entre oito e nove meses, não tenho certeza aqui do tempo exato, e que não pode ser reeleito. E assim sendo, para todos nós seria importante uma solução negociada ou uma solução que respeitasse o direito de defesa. Obviamente, nós não temos poderes ilimitados, ainda não há uma solução clara de como é que vai ficar. Então, eu tenho, o que eu tenho para relatar a vocês é isso.

Jornalista: (incompreensível)

Presidenta: Olha, o que o Protocolo prevê, o que o protocolo prevê é, caso os países considerem que houve alguma falha neste processo, ou algum processo de ruptura da ordem ou ruptura democrática, ou o que seja, o que o Protocolo prevê – não posso falar pela soberania de cada país – mas o Protocolo prevê é problema de sanção na representação dos órgãos bilaterais, ou seja, a não-representação ou qualquer equivalência. Não está decidido e nem ainda foi inteiramente discutido, eu não tenho como te responder, eu estou falando o que é previsto no Protocolo.

Agora, é importante que vocês tenham uma informação que torna a situação mais complicada um pouco. O presidente Lugo é o presidente pro tempore da Unasul, ou seja, ele está no exercício da Presidência da Unasul. Portanto, a situação ainda é um tanto ou quanto mais constrangedora, porque além dele ser um integrante da Unasul, ele é o presidente pro tempore.

Jornalista: Presidente, Tânia Monteiro, do Jornal Estado...

Presidenta: Não, nós não discutimos isso e nem ninguém está falando nisso. Não acho que caiba se ficar fazendo ameaça por aí.

Jornalista: Pois é, isso que eu ia perguntar, Presidente, se por acaso, nesse episódio todo, já que tanto no Mercosul, quanto na Unasul existem regras de respeito à democracia, esse processo sumário contra o presidente Lugo pode ser considerado um golpe e, aí, com isso, a retirada dele do poder pode significar a expulsão, por exemplo, na próxima reunião do Mercosul, que vai ser semana que vem, a expulsão do Paraguai desse grupo e, posteriormente, da Unasul, como é que isso está sendo... ?

Presidenta: Tânia, eu não vou raciocinar em hipótese num caso tão delicado desses. O que eu posso te dizer é o que está previsto no Protocolo. O que está previsto no Protocolo é a não participação nos órgãos multilaterais. É isso que está previsto no Protocolo. O Protocolo não, pelo menos, assim, ele só se estende em questões mais gerais. Não acredito que seja e que contribua a gente ficar discutindo uma situação que ainda não ocorreu, e o que pode ser visto como uma forma de ameaça.

Eu acho que a atitude dos 12 chanceleres e dos 12 países que os chanceleres representam é uma atitude de muito respeito pela soberania do Paraguai. Agora, é também uma atitude de muito respeito pela democracia. Dessa situação eu te asseguro que sai uma consequência. Esses 12 países que são diferentes, e têm posições diferentes - nenhum de nós é igual ao outro -, tiveram a capacidade de agir rápido e em conjunto, e têm uma posição unida. É uma grande, mas uma grande garantia de que a América Latina evoluiu, que nós somos países que conseguem agir por nós mesmos e conseguimos acompanhar os eventos.

Nós, que passamos por um processo muito doloroso de golpes – porque passamos por processo doloroso de golpes –, passamos por processos de retomada da democracia, dar valor a ela é algo muito importante. Acho que mostra a maturidade da América Latina. Nesse contexto que o mundo vive, eu acho que é uma grande vitória estar lá 12 chanceleres, com uma posição sóbria, ninguém fazendo ameaça para ninguém, ninguém fazendo discursos ideológicos para ninguém, preocupados em construir uma saída ou acompanhar e tentar garantir, ao máximo, pela sua presença – sem o uso de nada, a não ser a presença, que é uma presença simbólica importante –, garantir o direito de defesa mais amplo possível.

Jornalista: (incompreensível)

Presidenta: O Mercosul, a não ser que eu me equivoque, se reúne na sexta e no sábado desta semana...

Jornalista: (incompreensível)

Presidenta: Em Mendoza. Eu não sei se é sexta ou sábado, ou quinta e sexta.

Jornalista: Mas está garantido?

Presidenta: Está. Eu estou naquela fase que eu já... Tem hora que eu tenho de pensar “mas, mesmo, que dia é hoje?”. A gente, quando sai deste país e... fica muito triste, mas... porque o Rio e o Brasil é um país muito bonito, mas quero te assegurar que a América Latina, também, e o México, porque eu estive em Los Cabos, é um lugar... Tem horas em que você olha assim e fala: é por isso que temos essa proximidade, porque praias lindas, etc. E eu tenho certeza que Mendoza é um lugar desses também. Acho que vocês, que irão para lá, vocês me agradeçam, hein, porque vocês vão me seguindo e vão tomar um bom vinho lá em Mendoza.

Jornalista: (incompreensível) para ajudar a resolver o problema do Paraguai.

Presidenta: Esfria, não é, Tânia?

Jornalista: Presidenta, boa tarde. A senhora falou que o Brasil já passou por golpes. A senhora, inclusive, foi vítima de tortura. Inclusive o Correio Braziliense publicou uma matéria sobre o seu depoimento no ano 2000, já recentemente, não é, neste século, final do século passado. Então, eu queria que a senhora comentasse um pouco essa reportagem. Como é que a senhora deu esse depoimento e se a senhora conseguiu identificar o seu torturador , que dizem que já existe aí alguma informação a respeito, mas nada confirmado. Eu quero saber se a senhora, o que a senhora pode dizer sobre isso. Eu sei que é um assunto doloroso.

Presidenta: Posso te falar uma coisa? Eu venho dando depoimento ao longo da minha vida, alguns, te asseguro, muito difíceis. E esse país, como a gente estava comentando há pouco, evoluiu muito e tem de evoluir mais, porque os depoimentos difíceis têm de ser eliminados em todas as esferas, inclusive, na atividade da polícia em geral.

Eu acredito que, eu vou te dizer assim com sinceridade, eu acredito que eu entendo o interesse de vocês, porque eu sou presidente, afinal de contas, e vocês querem saber o que aconteceu comigo. Eu acho que é um interesse legítimo de vocês. Agora, em geral, assim, eu posso te dizer o seguinte: algumas das figuras que me torturaram não tinham nomes verdadeiros. Há, vamos dizer assim, há elucubrações.

Agora, eu quero te dizer que a questão não é o torturador. É a tortura. O torturador é um agente. Mesmo ele tendo a sua responsabilidade reconhecida depois do que aconteceu no julgamento dos crimes de guerra e de Nuremberg, que aprovaram uma avaliação, de que mesmo sendo mandado quem faz é responsável, que é uma coisa importante, eu não acho que seja o torturador o problema. O problema é em que condições a tortura é estabelecida e é operada. E isso, nós todos sabemos em que condições foi. Ninguém aqui desconhece o que aconteceu neste país num determinado período de sua história. E todos nós, eu tenho certeza, que estamos aqui nesta sala temos todo o compromisso de jamais deixar isso acontecer.

Eu te digo, com o passar dos anos, uma das melhores coisas que me aconteceu foi não me fixar nas pessoas, nem ter por elas qualquer sentimento. Como eu disse no meu discurso, nem ódio, nem vingança, mas também tampouco perdão. Não há sentimento que se justifique contra este tipo de ato. Há a frieza da razão. E a frieza da razão é não esquecer. Por isso, nós criamos a Comissão da Verdade.

Vingar, ou se magoar, ou odiar é ficar dependente de quem você quer vingar, de quem você quer magoar ou odiar. Isso não é um bom sentimento para ninguém. Agora, trata-se de virar a página desse país. Trata-se disso. Para virar a página, nesse país, nós temos a Comissão da Verdade e é isso que essa comissão, eu espero que faça. Nós precisamos saber a verdade em épocas de Grécia, nós vivemos na época da Grécia, nós estamos vendo um sofrimento imenso do povo grego. E sempre temos de lembrar que eles falam o seguinte: Se eu não me engano, a palavra verdade que é alétheia é o contrário de lethe, que é esquecimento. A verdade é isso. Não esquece. Mas não esquece do ponto de vista histórico, não do ponto de vista individual.

Jornalista: (incompreensível) que a senhora nunca pegou em armas....(incompreensível).

Presidenta: Olha, eu já cansei de falar sobre isso, gente. Vocês passaram a campanha eleitoral me perguntando isso. Dia sim e, não é, o outro não. Dia sim e o outro também. Não vou ficar explicando isso mais.

Ministra Helena Chagas: Pessoal, o tempo que a presidenta tinha já está se esgotando.

Presidenta: Posso falar uma coisa com você?

 

Ministra Helena Chagas: Ela ainda está precisando voltar para o gabinete dela.

Presidenta: Sabe quanto tempo tem que vocês me perguntam isso? Dois mil e três, quando eu assumi o Ministério de Minas Energia. E eu respondo, cito o que eu respondi lá atrás. Não é definido pela lei, por mim.

Ministra Helena Chagas: Vamos aqui. Por favor. Eu pediria que vocês não tumultuassem com perguntas aí, por favor. Venha até aqui. Mais duas perguntas. Se você quiser, você vem até aqui e faz.

Presidenta: Agora, eu quero só declarar o seguinte: eu tenho mais duas perguntas. E vou fazer o pronunciamento de fechamento.

Ministra Helena Chagas: Ela tinha meia hora e já se passaram 35 minutos. Não pode, não pode. Problema de agenda. Está bom? Vamos fazer mais duas perguntas aqui. Por favor, vocês se entendam para saber quem são os dois, ok?

Jornalista: Boa tarde, presidente, Gabriel Mascarenhas, do Correio Braziliense. Queria voltar à Rio+20. Muito se comentou que a evolução insatisfatória para alguns das negociações se deveu à inflexibilidade dos países europeus. E ontem e anteontem, a gente viu chefes de Estado europeus criticando o documento, o chefe de Estado cubano também criticou, dizendo que nós falhamos, eu queria que a senhora comentasse isso. E, emendando, antes da Rio+20, a senhora tinha uma expectativa. Em que medida esse documento acertado atingiu plenamente a expectativa da senhora?

Presidenta: Olha...

Jornalista: Só complementando. Presidente, foi acordado aqui... só complementando a pergunta dele, porque a minha também é de Rio+20, a senhora falou que foi o acordo possível, mas ele permite as mudanças na velocidade que o mundo precisa?

Presidenta: Eu queria, primeiro, destacar. Não acho que ninguém é responsável pelo atraso de nada, não acho que cabe eu fazer aqui esse tipo de discurso, nem falar sobre as questões que um país ou outro falou ou deixou de falar.

É certo que muitos países estão enfrentando uma conjuntura difícil. Agora, eu te digo o seguinte: na Europa se fala muito da Taxa Tobin. Mas lá, na reunião do G-20 e na reunião europeia, a Taxa Tobin é para resolver o problema da dívida bancária e da dívida soberana. Eu, de fato, me surpreendi ao saber que aqui também estavam usando a Taxa Tobin para garantir investimento na área ambiental. É uma questão que vai ser solucionada a partir de agora, a gente vai ver onde ela vai ser usada. Eu não sei, não tenho como responder. Estou te dizendo, porque eu saí de uma reunião na segunda e terça-feira, em que a Taxa Tobin foi aventada para essa questão, da dívida soberana e dos bancos, fazer o que eles chamam de firewall. Então, eu não poderia te responder quem é responsável por essa etapa. Acho que todos os países envolvidos, eles têm de ser responsabilizados. Ninguém aqui pode ficar apontando o dedo para outro. Não é uma boa prática.

Jornalista: E a respeito da expectativa da senhora sobre a Rio+20 (incompreensível)? O documento atende plenamente?

Presidenta: Olha, eu vou te dizer uma coisa: eu acho... que atende à nossa prática? É óbvio que não. Nós somos talvez o país com uma política mais avançada no que se refere a gastos ambientais. Então, não corresponde. Agora, também, eu não posso medir todos os países pelo metro do Brasil. O que eu acho que ele corresponde, a minha expectativa é a minha expectativa numa relação bilateral com os demais países, corresponde plenamente, é uma conquista, acho que de todos nós. Eu não acho que a soberba de pegar o meu metro, aí sair por aí medindo os outros países dá certo. Não dá certo ter esse tipo de atitude internacionalmente.

No que refere-se as minhas expectativas sobre a Rio+20, eu vou repetir. Acho que o Brasil mostra que é capaz de fazer uma conferência desse porte com tantos países, organizá-la e torná-la uma conferência de nível. Todos os países, praticamente, reconheceram a qualidade dessa conferência e dessa organização. Além disso, todos os países aqui presentes, que atuam na área multilateral, sabem perfeitamente o que significa tirar um documento. O que significou de esforço da democracia deste país, mas, sobretudo, da diplomacia, das condições técnicas, da capacidade de se dedicar, da capacidade de não ser soberbo. Porque é fácil o Brasil ser soberbo.

Agora, aqui a matriz energética é 45% renovável. Nos países da OCDE é 7%. Aqui, nós temos 60% das nossas florestas nativas preservadas. Nos países da OCDE, não é mais do que 30, não é mais... E 30, eu estou sendo generosa. Então, o que é possível, é o seguinte: o que significa esse documento? É uma plataforma comum para todos os países das Nações Unidas. Isso é uma grande conquista da diplomacia brasileira, do Ministério do Meio Ambiente, de todos que participaram, dos funcionários da ONU, que ajudaram a construir, dos países-membros que aceitaram discutir, daqueles que não perderam a paciência quando todos os seus argumentos não foram aceitos – só alguns. Então, eu quero dizer o seguinte: a minha expectativa está amplamente, mas amplamente satisfeita. Acho que é um grande passo a frente para o mundo e para o Brasil.

Jornalista: Permite os avanços na velocidade que o mundo precisa? Só para complementar a pergunta.

Presidenta: Acho que... é importante saber que velocidade é essa, viu? Porque essa é uma pergunta genérica. Se você me disser velocidade em relação a quê, por exemplo, se for velocidade em relação à recuperação dos países africanos, não só no que se refere ao combate à pobreza, ao seu desenvolvimento e o respeito ao meio ambiente, seguramente não. O mundo precisa de muito mais rapidez e esse conceito de preservar, incluir e proteger é um conceito, que é muito importante, porque uma das conquistas do documento é qual? Não se pode medir crescimento pelo PIB, tem de ter critérios sociais e ambientais.

Aí, se o metro é esse, eu te digo: é a primeira vez que esse metro foi incluído num documento final. A partir de agora, nós vamos medir com esse metro qual é o atraso do mundo, que nós sabemos que é imenso, porque tem milhares e milhões de pessoas que não têm acesso à comida, à água tratada, que não têm acesso a uma condição de vida adequada.

Há problemas incríveis nos países desenvolvidos, totalmente dependentes de combustíveis fósseis. Há problemas também no desenvolvimento do meu país. Nós estamos aqui num processo de lutar contra a pobreza, de buscar erradicar a pobreza. Não é possível construir um metro genérico sem ver as condições das quais os países partem.

Por isso, esta pergunta é aquela pergunta que quer construir a armadilha. Vou te falar qual é a armadilha: que só tem uma forma de crescimento, quando existem várias formas de crescimento. Nós provamos que a nossa existe. Qual é a nossa? Nós podemos crescer, incluir 40 milhões de brasileiros e preservar a Floresta Amazônica. Agora, eu vou impor esse modelo para todo o mundo? Então, a rapidez depende também de eu considerar economias nacionais diferentes, costumes diferentes, política diferente. Eu não posso ter um metro só.

Jornalista: Presidenta, rapidinho. A senhora, ontem, confidenciou à presidente Graça Foster que o ministro Guido Mantega faria o anúncio do aumento da gasolina.

Presidenta: Não falei isso para a Graça Foster.

Jornalista: A senhora falou assim: “Ah, o Guido vai anunciar”.

Presidenta: Não, eu disse para a Graça Foster que ela teria de ter uma conversa com o Guido sobre outro assunto que ela me pediu.

Jornalista: Então não tem anúncio semana que vem?

Presidenta: Meu querido, eu não sei.

Ministra Helena Chagas: Obrigada, gente, a todos.

Jornalista: (incompreensível)

Presidenta: Eu não sei. Sou uma pessoa que, de fato, não sabe.

Tchau, gente. Tânia, Mariazinha, meninas e meninos. Beijos. E fiquem orgulhosos deste país, viu? Fiquem orgulhosos, porque vai fazer uma conferência dessas ...

Jornalista: (incompreensível), premier da Noruega, (incompreensível)

Presidenta: Não, eu fiz questão de falar, porque país não pode ignorar que nós estamos num multilateralismo. Pensamento único, never!

 

 

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