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Discurso da Presidenta da República, Dilma Rousseff, durante cerimônia do Dia Internacional em memória das vítimas do Holocausto - Brasília/DF

Transcrição do Áudio

 

Hotel Golden Tulip Brasília Alvorada – Brasília-DF, 30 de janeiro de 2013

 

Eu queria cumprimentar o meu amigo Cláudio Lottenberg, presidente da Confederação Israelita do Brasil,

Cumprimentar o presidente do Senado Federal, senador José Sarney,

Cumprimentar o embaixador de Israel no Brasil, Rafael Eldad,

Queria cumprimentar todos os ministros que me acompanham neste momento: a ministra Luiza Bairros, da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial; a ministra Maria do Rosário, da Secretaria de Direitos Humanos; o ministro Antonio Patriota, das Relações Exteriores; a ministra Marta Suplicy, da Cultura; o ministro Alexandre Padilha, da Saúde; a ministra Helena Chagas, da Secretaria de Comunicação Social; o general José Elito, do Gabinete de Segurança Institucional; a ministra Eleonora Menicucci, da Secretaria de Políticas para as Mulheres.

Queria cumprimentar também o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz,

O meu querido governador da Bahia, senhor Jaques Wagner,

Os senadores aqui presentes: Eduardo Suplicy, Sodré Santoro,

Os deputados federais Jean Wyllys, Walter Feldman, Alessandro Molon,

Queria cumprimentar as senhoras e os senhores sobreviventes do Holocausto: Ana Kurtz Baum Futer, Lulu Landver, Ben Abraham, Efraim Raimon Fragimun, Jorge Legman, Miriam Nekrycz,

Queria dirigir um cumprimento especial ao nosso ex-prefeito Gilberto Kassab, aqui presente,

Queria também cumprimentar o presidente da Associação Cultural Israelita de Brasília, senhor Samuel Szerman,

Os senhores Eduardo Tess, filho de Guimarães Rosa e Marcos de Souza Dantas, sobrinho-neto de Luiz Martins de Souza Dantas, os homenageados nesta ocasião,

Queria também cumprimentar Miguel Krigsner, criador do primeiro Museu do Holocausto do Brasil, sediado em Curitiba,

Cumprimentar o presidente do Congresso Judaico Latino-Americano, senhor Jack Terpins,

Cumprimentar o rabino David Weitman, por intermédio de quem saúdo toda a comunidade judaica,

Dirigir um cumprimento também à professora da Universidade de São Paulo, Maria Luiza Tucci Carneiro,

Cumprimentar o representante da Comunidade Bahai, Iradi Roberto Egrari

 

Queria cumprimentar os senhores jornalistas, os senhores fotógrafos e os senhores cinegrafistas.

É com muita honra que eu compareço nesta terceira vez, minha terceira vez como presidente da República, a essa cerimônia do Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto.

Eu acrecito que essa presença aqui tem um significado especial, porque o Brasil também, como a maioria das nações, passou por períodos difíceis na sua história. Nós não podemos, por exemplo, esquecer os 300 anos de escravidão da população negra ou os anos de ditadura que nós tivemos que enfrentar.

O Holocausto sempre será, para o Brasil, uma questão que, de maneira alguma, se pode negar. O Holocausto é, necessariamente, para nós, brasileiros, algo que tem de ser objeto da memória e da verdade. Felizmente, para nós, o Brasil se transformou em um país democrático. Em nosso país vivem pessoas originárias de diferentes culturas, de diferentes etnias, somos um país formado por imigrantes, temos várias origens. E aqui convivem em harmonia todos os povos, mesmo aqueles em que, de forma recente, como é o caso dos judeus e dos árabes, há relações atritadas em outras partes do mundo.

Nós somos capazes, como nação, de construir uma grande riqueza, que é nos desenvolver tendo um profundo respeito pelos direitos humanos nesta construção da democracia política e social no nosso país, respeitando a diversidade, respeitando a liberdade de pensamento e, sobretudo, percebendo a extrema riqueza que há em sermos diferentes, mas tão parecidos, tão iguais, tão humanos. Isso não significa que nós podemos deixar de avaliar, de conhecer, de estudar as mais dolorosas lições da história humana. Pelo contrário, é sobretudo por isso mesmo e para que nós nunca esqueçamos, é que é necessário lembrar, repetir, sistematicamente, para impedir que isso se repita.

O Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto, para nós, é uma data importante e é uma data muito importante para o povo judeu e uma data muito importante para toda a Humanidade. Nós devemos fazer uma sincera reflexão e devemos perceber que, nesse processo, o mal conviveu com gestos de heroísmo e de coragem. O mal conviveu com a indignação, com a capacidade de luta, mesmo sabendo, a priori, que essa luta resultaria em mortes e, aparentemente, numa derrota.

Mas sabemos que, num certo sentido – e não estou falando pura e simplesmente sobre quem venceu a guerra –, mas, num certo sentido, todos que morreram foram também vitoriosos, porque nós hoje estamos aqui recordando, repetindo, refazendo e reafirmando a existência do Holocausto e dizendo para nós mesmos: nós vamos fazer tudo o que for necessário para que algo assim, similar, nunca aconteça. E é muito importante dizer isso na América Latina porque aquele processo que ocorreu com o nazismo, que levou a esse horror, a essa barbaridade industrial, serviu de padrão para que muitos países exterminassem seus próprios cidadãos.

Fazer tudo para que jamais aconteça é um exercício de lembrança pessoal, mas é, sobretudo, um exercício de lembrança histórica, e nesse exercício, eu acho que esta reunião aqui ou em outras cidades do Brasil, ela constitui um momento de respeito pelas vítimas, de reflexão e de projeção para o futuro.

Para todos nós, judeus e não judeus, seres humanos de todas as etnias, religiões, aquele momento foi o mal em seu estado mais agressivo, deliberado, metódico e sistemático, o chamado, o pensado mal absoluto, paroxístico, inaudito, mas nem por isso impossível de se repetir.

A ideologia, como eu disse, que resultou no Holocausto, ela não foi formulada repentinamente. Ela teve vários exercícios anteriores. Ela não chegou abruptamente. Sem dúvida nenhuma os guetos são uma antecipação disso. A expulsão dos judeus de Portugal são outra... foi uma outra manifestação histórica de uma longa preparação secular, que desembocou naquele momento terrível da história da Humanidade, que foi a perseguição aos diferentes, aos judeus. E se repete sempre que foi aos judeus porque em relação aos judeus tinha uma sistemática tentativa de descaracterizar seres humanos como humanos. Ganhou dimensão coletiva ao longo dos anos, foi crescendo e acabou se impondo, até que era tarde demais.

Por isso eu quero, mais uma vez, relembrar o famoso poema do alemão Martin Niemöller, porque é de um alemão que mostra como o Holocausto é uma ameaça, uma agressão a todos os seres humanos e como ele começa de forma insidiosa. Esse poema diz o seguinte: “Quando os nazistas levaram os comunistas, eu calei-me porque, afinal, eu não era comunista. Quando eles prenderam os sociais-democratas, eu calei-me porque, afinal, eu não era social-democrata. Quando eles levaram os sindicalistas, eu não protestei porque, afinal, eu não era sindicalista. Quando levaram os judeus, eu não protestei porque, afinal, eu não era judeu. Quando eles me levaram, não havia mais quem protestasse”. Esse poema, eu acho que ele retrata o fato de cada um de nós sermos responsáveis por todas as violências contra os direitos humanos praticadas contra o nosso próximo, seja ele quem for.

Gostaríamos de pensar que superamos todos os equívocos, preconceitos, superstições, mas a tragédia pode se repetir sempre que o poder absoluto exercido por homens que desprezam homens, por mulheres que desprezam mulheres, transformar seres humanos em meros objetos de rancor, de preconceito, de vingança, de tirania.

Nós, brasileiros, sabemos disso. Nós temos essa terrível mancha em nossa história, que foi a escravidão. Sabemos que humanismo, solidariedade, tolerância, liberdade e democracia são valores essenciais, valores que nós precisamos reafirmar e fortalecer todos os dias. Nós também sabemos que a verdade e a memória são uma arma, uma arma contra a repetição da barbárie e, por isso, eu muito me orgulho de ter sido, no meu governo, que nós criamos a Comissão da Verdade para apurar o ocorrido durante um período terrível da nossa história.

Por isso nós devemos sempre lembrar que o Holocausto também se repete quando é negado ele mesmo, quando ele é relativizado ou quando se tenta suavizar sua narrativa. Negar o Holocausto é repeti-lo, como agressão à memória não apenas dos judeus, mas de toda a Humanidade. Por isso deve-se sempre não só lembrar, mas ter muita responsabilidade quanto à verdade dos fatos.

Homenagear os que pereceram e aprender com os que sobreviveram para contar a história nos permite oferecer sempre um alerta às novas gerações. É necessário e é possível estar atento e impedir que ele se instale e cresça e se imponha. Afinal de contas, o mal é banal porque é praticado por seres humanos como todos nós, banais, e aí...

E aí, qual é a saída? A democracia continua sendo o melhor instrumento de que a Humanidade dispõe para impedir a tirania e a repetição de tragédias como o Holocausto, porque dela resultam – da democracia resultam –, sem dúvida, outros princípios igualmente fundamentais: o respeito aos direitos da pessoa humana, a tolerância às diferenças, o amor pela diversidade, a consideração pelas minorias, o esforço para a redução das desigualdades, o respeito à soberania de todos os países e de todas as nações, o primado da diplomacia e da negociação sobre a guerra e sobre os conflitos armados, as invasões, as ocupações, enfim, as soluções armadas e enfim, e por fim, o amor à paz e à justiça entre os povos.            Devemos celebrar sempre a existência de mulheres e homens que se mantêm inteiros, íntegros, confiantes, dignos e corajosos diante da tragédia. A coragem humana também é uma prova de que os seres humanos, que as pessoas as mais normais são capazes de gestos grandiosos. E que são capazes de se lançar para além das suas limitações cotidianas. Por isso faço questão de homenagear aqui dois brasileiros e de, junto com vocês, chamá-los de dois heróis brasileiros: Araci Guimarães Rosa e Luiz de Souza Dantas. Eles tiveram a coragem de enfrentar grandes riscos pessoais. Fizeram isso dentro da legalidade humana. Aquela que justifica que, diante da guerra, diante da perseguição, diante da ameaça de morte e de extermínio as pessoas se levantem e proclamem a ordem e a legalidade da condição humana.

São pessoas que enfrentaram riscos, inclusive por emitir vistos diplomáticos e passaportes que salvaram a vida de judeus, que salvaram a vida dos perseguidos pelo nazi-fascismo na Alemanha e na França, nas décadas de 30 e de 40. Eles mostraram que há sempre esperança, e essa esperança está fundada nesta capacidade de coragem diante de tanta barbárie. A história lhes faz justiça. Eles honraram o Brasil e dignificaram a humanidade.

Muito obrigada e Shalom.

 

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