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27-01-2011 - Discurso da Presidenta da República, Dilma Rousseff, durante cerimônia alusiva ao Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto

A homenagem, instituída há seis anos pela Assembléia Geral das Nações Unidas, marca o dia em que tropas soviéticas libertaram o campo de extermínio de Auschwitz, na Polônia, em 1945

 

Porto Alegre-RS, 27 de janeiro de 2011

 

Senhor Tarso Genro, meu querido companheiro, governador do estado do Rio Grande do Sul,

Meu querido amigo Cláudio Lottemberg, presidente da Confederação Israelita do Brasil,

Senhor Giora Becher, embaixador de Israel no Brasil,

Meus queridos ministros aqui presentes: Maria do Rosário, ministra dos Direitos Humanos; Fernando Bezerra, da Integração Nacional; Afonso Florence, do Desenvolvimento Agrário; Helena Chagas, da Comunicação Social.

Um cumprimento ao meu companheiro Beto Grill, vice-governador do estado do Rio Grande do Sul; ao deputado Giovani Cherini, presidente da Assembleia Legislativa do estado do Rio Grande do Sul; a todos os parlamentares aqui presentes.

Queria também cumprimentar o meu querido companheiro Jaques Wagner, governador da Bahia e companheiro, comigo, do governo do presidente Lula.

Cumprimentar também o prefeito de Porto Alegre, José Fortunati, prefeito da minha cidade, que eu tenho certeza de que fará um grande mandato à frente da Prefeitura.

Queria cumprimentar também o prefeito Kassab, aqui presente, que veio lá de São Paulo para honrar este ato.

Cumprimentar o presidente do STJ, do Superior Tribunal de Justiça, ministro Ari Pargendler; a doutora Simone Mariano da Rocha, procuradora-geral de Justiça do estado.

Queria cumprimentar um amigo, presidente da Federação Israelita do Rio Grande do Sul, o Jarbas Milititsky,

Queria cumprimentar cada um dos presentes, senhoras e senhores sobreviventes do Holocausto, senhoras e senhores representantes de lideranças das associações israelitas do Brasil.

Queria cumprimentar os senhores e as senhoras da imprensa aqui presentes,

E dirigir a todos os gaúchos e às gaúchas minha saudação especial, porque eu estou aqui na primeira, na minha primeira viagem oficial ao estado. Eu venho aqui ao estado em caráter não oficial, já vim várias vezes, mas esta é a primeira viagem oficial que eu faço.

E nada mais importante de ter vindo nesta circunstância, porque neste 27 de janeiro nós estamos homenageando, e é uma homenagem toda especial às vítimas do Holocausto, vítimas que vêm tanto da origem étnica, da origem judaica, decorrente só desta origem, ou porque eram ciganos ou porque eram eslavos. Mas, sobretudo, porque eram considerados inferiores ou porque eram considerados inimigos políticos como os socialistas, os comunistas, os social-democratas que foram mortos também, ou porque tinham uma opção sexual que não era do gosto daqueles governantes de então.

Essa sombra chamada Holocausto, ela inaugurou uma das mais lamentáveis violências do homem contra o homem na história da Humanidade. E uma violência especial, porque era uma violência que pela primeira vez combinava o uso da força, o emprego da dor e, ao mesmo tempo, a desumanização do considerado adversário ou daquele que era objeto de extermínio.

O Holocausto não é, nem nunca será, só um momento histórico dos anos da Segunda Guerra Mundial. O Holocausto abre no mundo uma determinada prática de trato do opositor político, que consiste em calá-lo, mas não apenas silenciá-lo ou derrotá-lo em uma guerra aberta. Trata-se de silenciá-lo através da sua redução à subumanidade através da tortura, da dor e da morte lenta que se praticava nos campos de concentração, que inauguram as prisões modernas das sociedades humanas do final do século XX e ainda neste início de século XXI. Porque nós temos de entender que, a partir dali, inaugurou uma época de violência industrializada, a tortura científica. As experiências que saíram daquele momento foram empregadas como técnicas em todas as guerras de extermínio de populações ou em todas as lutas decorrentes das ditaduras.

Por isso, no caso do Holocausto, o dever da memória não pode se confundir com a simples passividade da lembrança. A memória, nesse caso, ela expressa a firme determinação de impedir que a intolerância e a injustiça se banalizem no caminho da Humanidade, aquilo que uma grande judia, grande filósofa, Hannah Arendt chamou de “banalidade do mal”.

A memória é uma arma humana para impedir a repetição da barbárie, é isso que é a memória. Por isso, hoje e sempre, aqui e em todos os lugares, é nosso dever lembrar que o Holocausto é holocausto, é crime contra os direitos humanos e crime contra a Humanidade. Inaugura um momento deplorável da história humana e faz com que nós todos tenhamos de, sistematicamente neste dia, fazer esse exercício, que é o exercício da memória. Lembrar Auschwitz-Birkenau, que era um aglomerado de campos de concentração localizado no sul da Polônia, é lembrar todas as vítimas de todas as guerras injustas, de todas as ditaduras, que pelo mundo afora exterminaram, torturaram e tentaram calar milhões de seres humanos. Mas também é lembrar que foi naquele campo que muitas famílias judias foram destroçadas, homens e mulheres e crianças foram humilhados, foram seviciados, e seis milhões de vidas humanas foram ceifadas, porque também não se pode esquecer o que aconteceu ali, especificamente, com a vida de milhões de judeus. Lá não ocorreu de repente. Naquela época, não ocorreu de repente. Como em nenhuma época histórica, ou em nenhum momento posterior ocorreu. Porque a violência, ela começa a se transformar em rotina lentamente, ela não se torna rotina de um dia para outro. Naquela época, sinais claros forma sendo emitidos. E, de fato, silenciou-se diante dessa barbaridade.

Nós temos de lembrar sempre, para impedir que aqueles que não são objetos da barbárie se silenciem e pratiquem a grande arma humana diante desses momentos, que é a solidariedade e a coragem de se manifestar contra essas práticas e contra essas experiências com a vida humana.

Nós rendemos hoje a nossa homenagem às vítimas do Holocausto. Nós rendemos hoje homenagem a todos aqueles que foram perseguidos, torturados e mortos ao longo da história da Humanidade. Rendemos também homenagem ao povo judeu, especificamente, porque soube manter viva sua integridade através de uma resistência cultural e religiosa. Rendemos homenagem a esse povo que durante séculos teve sua pátria constituída por seus livros, seus intelectuais, sua história, sua religião, sua culinária e sua vida familiar. Rendemos homenagem à resistência cultural judaica, que pavimentou o caminho para uma pátria física, direito que não pode ser negado a nenhum povo.

O Brasil, de fato, presidiu a sessão da Assembleia das Nações Unidas, quando da decisão histórica da criação do Estado israelense. Nós fomos um dos primeiros países a reconhecer Israel. Estivemos também entre os principais defensores da resolução da ONU que instituiu esse dia em memória das vítimas do Holocausto.

Nós, aqui presentes, sabemos que o nosso país, ele se destaca pela diversidade de tradições culturais, religiosas, étnicas, que convivem em harmonia, que se relacionam de uma forma fraterna em seu território. A nossa própria Constituição Federal e a nossa legislação são claras e inflexíveis nessa questão. Nós rejeitamos por convicção, por cultura, por opção política, todo tipo de discriminação ou preconceito.

O meu governo, o governo da República Federativa do Brasil, ele será incansável defensor dos valores da igualdade, da dignidade humana, do respeito aos direitos humanos. E, sobretudo, nós temos clareza de que a nação brasileira, ela é integrada por valores que respeitam dois princípios: a paz e a conciliação.

Nós não somos um povo que odeia, nós não somos um povo que respeita o ódio. Por isso, o Brasil tem uma posição histórica que muito nos orgulha. Eu tenho a honra de dar continuidade a um governo que durante oito anos buscou, em conjunto com a comunidade das nações, a afirmação da paz em todos os recantos, em especial no Oriente Médio. Nós defendemos que a construção da paz, a busca da paz é essencial para melhorar a vida da Humanidade, para melhorar a vida daquelas nações que vivem momentos terríveis de guerras fratricidas, de guerras étnicas, de guerras religiosas. E acreditamos que o melhor caminho para diminuir esse sofrimento da humanidade é o convívio, sobretudo, é o diálogo e é um tratamento respeitoso da diferença cultural, social, étnica, moral. E, ao mesmo tempo, nós acreditamos que é nosso dever não compactuar com nenhuma forma, qualquer que seja, de violação dos direitos humanos em qualquer país, aí incluído o nosso.

Eu fico muito feliz de estar aqui, hoje, em Porto Alegre. Eu estive e assisti a uma cerimônia emocionante no ano passado, em Recife, quando nesse mesmo dia acompanhei o presidente Lula nessa homenagem às vítimas do Holocausto.

Agora, estou muito feliz de estar aqui em Porto Alegre. Primeiro, porque é a minha cidade. Segundo, porque muitos amigos meus estão aqui presentes, neste momento. E terceiro, e sobretudo, porque eu sei que o início da presença do povo judeu na construção da nação brasileira teve um momento especial aqui em Porto Alegre, como teve um momento especial, também, lá em Pernambuco. E o que nós temos absoluta clareza é que a tradição do povo judeu, a sua dignidade, a sua resistência integram, de forma muito especial, a nossa nacionalidade.

Por isso, eu quero dizer para vocês que aqui eu reitero, mais uma vez, que o meu governo prefere, sempre, as múltiplas vozes da democracia – mesmo que eventualmente discordem do que nós pensamos, num determinado momento – ao silêncio das ditaduras, dos campos de concentração e do Holocausto.

Eu queria dizer que no Brasil o dever da memória é algo indissociável do dever de festejar a vida, porque nós somos, eminentemente, um povo que encara como sendo um momento muito especial da vida entender, compreender e sobretudo saber que é importante, para evitar que se repita, lembrar sempre, afirmar sempre que nós rejeitamos a barbárie.

Queria agradecer a todos aqui presentes e dizer, para encerrar: Shalom. Muito obrigada.

 

Ouça a íntegra do discurso (16min49s) da Presidenta Dilma. 

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Assunto(s): Governo federal