09-07-2015 - Discurso da presidenta da República, Dilma Rousseff, durante Sessão plenária dos chefes de Estado e de Governo dos Brics - Ufa/Rússia
Ufa- Rússia, 09 de julho de 2015
O Brics, ao articular países com inegável peso político, econômico e cultural, atua como força positiva na consolidação de uma ordem internacional multipolar, que deve ser mais justa, equilibrada e eficaz. Cientes de suas responsabilidade para favorecer o desenvolvimento sustentável e a estabilidade econômica internacional, os Brics deram em Fortaleza, no ano passado, o grande passo de criar o Novo Banco de Desenvolvimento e o Arranjo Contingente de Reservas.
Nessa Cúpula, muito bem organizada pela Rússia, e aí cumprimento o presidente Putin pela qualidade da cúpula, temos a satisfação de constatar que os Acordos Constitutivos foram ratificados e as novas instituições estão prontas para funcionar.
Congratulo-me com o presidente do Novo Banco de Desenvolvimento, o senhor Kamath, e seus quatro vice-presidentes, entre eles o do Brasil, Paulo Nogueira Batista, por suas nomeações. Podem contar com nosso firme suporte e apoio.
Estou certa de que a alta qualidade dessa equipe assegurará o pleno êxito do banco. Sob a orientação estratégica do Conselho de Governadores e a supervisão do Conselho de Diretores, o presidente Kamath e seus vice-presidentes terão importantes desafios pela frente, afinal, as necessidades de nossos países e de outras economias emergentes e países em desenvolvimento, na área da infraestrutura e do desenvolvimento em geral, são objetivos do banco e se apresentam como bastante desafiadores.
Os números compilados por organismos internacionais são gigantescos: o mais comumente citado, o da necessidade de investimentos em infraestrutura, montam a mais de US$ 1 trilhão por ano até 2020. O Novo Banco de Desenvolvimento precisará ser ágil e eficaz para alcançar o objetivo de realizar suas primeiras operações no início de 2016 e manter-se, a partir daí, como elemento crucial da arquitetura financeira internacional. É algo extremamente importante porque trata-se de uma realização concreta que é a primeira no âmbito regional e no âmbito intra-países que ganhou corpo e realidade.
Assinalo também a importância de avançar rapidamente na instalação do primeiro centro regional na África do Sul. Considero, finalmente, que é importante que o banco saiba conciliar as urgências do desenvolvimento com a sustentabilidade de seus projetos. Queremos um novo banco para um novo e melhor desenvolvimento. Ao mesmo tempo, o Arranjo Contingente de Reservas é um dos primeiros instrumentos desse tipo com alcance extraregional e representa, também, mais um passo na crescente integração entre as nossas economias e uma concreta contribuição à estabilidade do sistema financeiro global que nós sabemos e conhecemos os efeitos da sua volatilidade.
Constato, com satisfação, de que os trabalhos preparatórios, inclusive a assinatura, dois dias atrás, do acordo operacional entre os bancos centrais, permitirão ao arranjo estar plenamente operacional quando de sua entrada em vigor no próximo dia 30 de julho.
A estratégia para a parceria econômica do Brics que hoje lançamos constitui um mapa do caminho para ampliar entre nós o comércio, os investimentos e a cooperação em setores como energia, mineração, agricultura, finanças, infraestrutura, educação, ciência, tecnologia e inovação, turismo e mobilidade laboral. Essas iniciativas coincidem com uma conjuntura econômica internacional que não tem apresentado significativas melhoras e, portanto, não autoriza um grande otimismo. A recuperação dos países desenvolvidos ainda é lenta e frágil; o crescimento dos países em desenvolvimento também foi agora afetado. A persistência da crise passou a exigir de nossas políticas econômicas novas respostas visando a retomar o crescimento, proteger e aprofundar conquistas sociais.
Sabemos que chegamos ao fim do superciclo das commodities. Sabemos que ainda remanesce muita volatilidade no setor financeiro. Os países emergentes, especialmente os Brics, estou certa, continuarão a ser a força motriz do crescimento global. Seu peso deve se refletir nas instituições de governança internacional, o que reforma a necessidade da implementação da reforma do Fundo Monetário, decidida em 2010. Essa deve permanecer como sendo uma das prioridades no G20, que no próximo ano terá a presidência chinesa. Estou certa que muitos dos desafios serão enfrentados naquela oportunidade.
Sem dúvida, são muitos os desafios e muitas as ameaças no cenário internacional. Vários deles nos remetem a situações inquietantes: dizem respeito a guerras, a conflitos, enfim, a situações que não deveriam ter lugar no século 21. Sabemos que conflitos armados causam morte e sofrimento a um inaceitável número de seres humanos; que milhões de homens e mulheres, o maior contingente desde a segunda guerra mundial, estão na situação de refugiados e outros tantos buscam abrigo em outros países, fortalecendo as correntes migratórias. Testemunhamos sucessivas tragédias sofridas por esses migrantes em busca da sobrevivência.
Nós, no Brasil, estamos comprometidos com dar apoio e resguardo para milhões de seres humanos que buscam uma nova pátria. No Oriente Médio e no Norte da África, são motivos de especial preocupação os conflitos na Síria, no Iraque, no Iêmen e na Líbia. A não resolução da questão israelo-palestina, segue também sendo fonte de instabilidade. Sabemos que intervenções militares, bloqueios, não foram e não serão capazes de resolver os problemas de segurança nessas regiões e nas outras regiões conflagradas. Pelo contrário, tendem a incentivar sectarismos de diferentes matizes, fragilizar as instituições estatais, alimentar a proliferação de armas nas mãos de atores não estatais. O Brasil condena veementemente as graves violações aos direitos da humanidade em curso nessas regiões, em especial a perseguição a minorias étnicas e religiosas, as execuções sumárias, a violência sexual, o recrutamento de crianças e a destruição do patrimônio cultural. Reitero repúdio inequívoco do governo e do povo brasileiro ao terrorismo, seja de que forma se revista, onde quer que ocorra, quaisquer que sejam seus atores e motivações. Esse mal deve ser combatido no marco do direito internacional, deve ser reprimido. Precisamos também atuar, simultaneamente, preventivamente em suas causas estruturais. Nesta cúpula reiteramos o compromisso do Brics com o multilateralismo abrangente, transparente e representativo, que reflita as mudanças nas realidades de poder.
O Brasil acredita que um Conselho de Segurança da ONU reformado e ampliado será mais legítimo e eficaz no exercício da importante função de preservar a paz internacional e a segurança coletiva.
Finalmente, o Brasil está aberto a dialogar no Brics sobre outros temas estratégicos do século 21: governança da internet, crimes cibernéticos, migrações e o problema mundial das drogas. Além disso, neste ano, terá lugar a COP21, a Conferência do Clima 21, em Paris. Nós defendemos um acordo equilibrado e ambicioso que contemple as fontes alternativas e as fontes renováveis de energia, mas que garanta também o princípio tirado na Conferência do Rio, Rio+20, que diz: é possível crescer, incluir, conservar e proteger.
Meus amigos,
Está em negociação na ONU uma nova agenda do desenvolvimento pós-2015, que dá início a um novo ciclo de cooperação internacional voltada para o desenvolvimento sustentável. As iniciativas lançadas pelo Brics - eu estou certa - terão papel decisivo e muito contribuirão de modo construtivo para esse novo momento das relações internacionais. Estou certa que o fortalecimento dos Brics equivale a fortalecer a economia internacional e a paz entre os povos.
Muito obrigada.
Ouça a íntegra do discurso (12min12s) da Presidenta.