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17-06-2011 - Entrevista coletiva concedida pela Presidenta da República, Dilma Rousseff, após cerimônia de lançamento do Plano Agrícola e Pecuário 2011-2012

Presidenta Dilma responde perguntas sobre as obras da Copa e sobre o Plano Agrícola e Pecuário 2011-2012, dentre outros assuntos

Ribeirão Preto-SP, 17 de junho de 2011


Presidenta: ...vou começar então das obras da Copa, o regime de contratação especial para as obras da Copa que está em votação no Congresso. Esse regime e a lei foram discutidos amplamente pelo governo e com o TCU. O que é que foi chamado de sigilo de orçamento? Trata-se do seguinte: é, inclusive, integrante das melhores práticas do CDE e da União Europeia. Para evitar que a pessoa que está, o licitante, quem está fazendo a oferta, utilize a prática de elevação dos preços e de formação de cartel, qual é a técnica que se usa? Você não mostra para ele qual é o seu orçamento, mas quem te fiscaliza sabe direitinho qual é o valor. Aí, você faz a licitação. Aí, o que acontece? Ele não vai saber qual é o preço que você acha que pode pagar, isso significa que ele vai dar um preço menor e, se der fora do orçamento, o órgão de controle sabe que deu fora do orçamento. E, além disso, você explicita o orçamento na sequência, eu lamento a má interpretação que deram a esse ponto. Sugiro que as pessoas, os jornalistas que fizeram a matéria, investiguem direitinho junto ao TCU, que leiam a legislação e vejam do que se trata. Em momento algum, se esconde o valor do órgão de controle, tanto interno quanto externo. O que eu quero dizer com isso? Nem do TCU, nem da CGU, nem dos órgãos de controle que cada ministério tem. Segundo: quem não sabe o valor, é quem está dando o lance. Por que ele não sabe? Porque se ele souber que eu dou, vamos supor, vamos fazer uma hipótese, vamos supor que ele ache que é 100, um número, 100. Vamos supor que no orçamento do governo esteja 120, a hora que ele vir que é 120 o valor mínimo, ele vai para 120. Este foi um recurso que nós usamos para diminuir os preços das obras da Copa. Não há, da parte do governo, nenhum interesse em ocultar, pelo contrário, de quem que não se oculta? Não se oculta da sociedade, depois que ocorreu o lance, e não se oculta, antes do lance, dos órgãos de controle. Então, eu sinto muito essa má interpretação daquele artigo, e acredito que pode ser corrigido porque as pessoas conversando, elas esclarecem e cada uma vai explicar o que entendeu, onde que está o problema, onde que está, porque também tem limite. Não é possível chamar o governo de que está garantindo roubalheira ou qualquer coisa assim. Isso foi negociado com o TCU.

 

Jornalista: Presidenta, em relação aos documentos que a senhora defende que (incompreensível)?

 

Presidenta: Também, também eu vou explicar. Esse processo é um processo que vem há bastante tempo. No processo de discussão é público e notório que eu era a favor de abrir todos os documentos. No entanto... podia me dar o papel que eu vou citar, literalmente, a lei? No entanto, nesse processo houve uma posição do Ministério da Defesa e do Ministério das Relações Exteriores. Nós quebramos, nós fizemos uma lei quebrando inteiramente a possibilidade do ultrassecreto ser indefinido. É bom também ler a lei. Nós extinguimos a prorrogação indefinida do ultrassecreto, diminuímos o prazo do ultrassecreto para... era 30 para 25, e, fizemos mais, dissemos que, no que se refere a direitos humanos, não existe nenhum caso em que possa ser ultrassecreto. Se eu não me engano, isso está... eu não tenho aqui os artigos, mas é, simplesmente, você procurar na lei do sigilo, que vocês chamam lei do sigilo, e olhar que ela não é lei do sigilo. Ela é o que? É uma lei que tenta disciplinar, o que antes era sigilo absoluto, para em que condições que se abre e como se abre. Aí, teve um problema, estava nesse pé, teve um problema que foi uma ponderação da Defesa e do Itamaraty. Qual foi a ponderação? Que a gente toleraria classificação de ultrassecreto para documentos, cujo acesso possa ocasionar: 1) ameaça externa à soberania nacional ou; 2) a integridade do território nacional ou; 3) grave risco às relações internacionais do país. Em três casos. E vou repetir: não poderão ser classificados, em hipótese alguma, documentos relacionados à violação de direitos humanos. Está isso explícito no que foi chamado, está sendo chamado isso, uma coisa incorreta porque, na época... porque isso é de 2009, se eu não me engano, eu ainda era Ministra-Chefe da Casa Civil quando mandamos isso para o Congresso, mandamos assim. Por quê? Porque essas três propostas de classificar como ultrassecreto ameaça externa à soberania, à integridade do território e grave risco às relações internacionais do país eram pleitos de duas instituições do Estado brasileiro, a Defesa e o Itamaraty. Agora, estão fazendo uma confusão porque eu vi, recentemente, que estava em sigilo violação de direitos humanos. Primeiro: não tem sigilo nenhum nos demais porque, para alguém não abrir depois de 25 anos, há que fazer uma justificativa a uma comissão, tem de fundamentar o porquê e ainda tem de ser aceito. No que se refere a direitos humanos, eu vou repetir: nem com fundamentação.

 

Jornalista: (inaudível)

 

Presidenta: Nem com fundamentação. Então, onde está o sigilo nisso?

 

Jornalista: Presidente, mudando para o Plano Safra [Plano Agrícola e Pecuário 2011-2012]... essa política, ela permite a gente pensar o agronegócio brasileiro a médio e longo prazo?

 

Presidenta: Permite sim. Essa política permite pelo seguinte: porque, veja primeiro que é um volume muito grande de recursos e são 107,2 bilhões, e nós introduzimos algumas questões que eu considero estratégicas. Primeiro: nós demos uma grande ênfase para os médios produtores, para o financiamento dos médios produtores do Brasil. Nós demos uma grande ênfase para a simplificação dos procedimentos para o acesso a financiamento, desburocratizando, por exemplo: o agricultor era obrigado, mesmo que estivesse renovando, a fazer todos os seus papéis outra vez. Nós tivemos uma preocupação com o caráter estratégico da agricultura de baixo carbono, e, portanto, fizemos uma linha especial para a agricultura de baixo carbono. Terceiro: olhando as disparidades entre a agricultura e a pecuária, principalmente, aquelas decorrentes do uso de tecnologias mais avançadas, estamos incentivando a pecuária a adotar práticas: 1) de retenção de matrizes; 2) de rotação lavoura-pecuária; 3) de recomposição de pastagens com tratamento especial do solo; 4) de fixação do nitrogênio no solo, enfim, e ao mesmo tempo, uma coisa importantíssima é manter as matrizes, não matar as matrizes, porque quando você mata a matriz você compromete o seu plantel, sua... por exemplo - falando assim mais simples, não é? - você não pode ficar matando as fêmeas, porque se você matar as fêmeas você perde consistência no seu rebanho. E também a garantia de que o Brasil vai financiar isto, a retenção dessas matrizes e, ao mesmo tempo, a melhoria da própria... do nosso plantel de animais. Como? Incentivando a compra de reprodutores, melhorando. Quem não quer ficar com a matriz, nós criamos um mercado e um financiamento para quem quer ficar com matriz. Enfim, a gente fez uma política muito importante para a pecuária. Terceiro, no que se refere à questão de algum setores específicos, o que nós estamos olhando é o setor por inteiro e não um ponto do setor, e tentando fazer com que... por exemplo, no caso da laranja, o produtor e o ... vamos dizer, o fabricante, ele tenha uma forma de que não só o fabricante ganhe, mas que também o produtor de laranja ganhe. A mesma coisa na cafeicultura. No caso da cana é a renovação das plantações de cana, porque elas envelheceram. Quando envelhece a plantação de cana, a produtividade diminui. Então, estamos fazendo um incentivo direto a essa renovação. E eu acho que a característica fundamental deste Plano é a concepção que está dentro dele, de que não há contradição, nem pode haver. Num país que quer ser potência agrícola, ele tem de ser também potência ambiental. Nós não somos a favor de desmatamento, não vamos compactuar com o desmatamento, e achamos que a agricultura brasileira e nem a pecuária precisam disso. Ela é produtiva o suficiente. Eu tenho certeza de que a maioria, que a grande maioria, para não dizer assim... tem uma minoria muito pequena que é de desmatador ilegal. O resto do Brasil fez as suas plantações quando a legislação permitia, não são ilegais, não são criminosos. Então, é possível ter, sim, um compromisso com o meio ambiente, não deixar desmatar este país, não deixar acabar com as florestas deste país e, ao mesmo tempo, ter um compromisso absolutamente inarredável com a agricultura e a pecuária, porque são base da nossa riqueza.

 

Jornalista: Presidenta, eu queria saber (incompreensível) sobre o etanol. Agora só depende do Obama?

 

Presidenta: Olha, eu não tenho certeza. Mas eu tenho a impressão de que ela não é aplicável imediatamente. Agora, mesmo não sendo imediatamente aplicável, dependendo, podendo depender... eu não sei de quem vai depender direito... mas eu quero te dizer que é um avanço porque, pela primeira vez, aparece claramente uma posição que reconhece que tem incentivos, que tem subsídios, que tem um protecionismo excessivo, pela primeira vez. Então, eu não sei como é que vai ser. Não sei, não posso te dizer, inclusive, qual a eficácia disso. Agora, em qualquer hipótese, seja o que seja que aconteça, tem um fator simbólico muito importante para nós, que é o reconhecimento de que não é o mercado perfeito aquele do etanol brasileiro nos Estados Unidos. Então, para nós, acho que para todos os brasileiros interessados nesse assunto, se constitui numa vitória, mesmo que o resultado prático não seja imediato.

 

Jornalista: Não pode trazer dor de cabeça para a senhora, Presidente, já que o pessoal do etanol aqui pode querer exportar mais etanol, em vez de...

 

Presidenta: Não, não pode não. Sabe por quê? Por conta do seguinte: porque eu acredito – e o governo vai fazer isso –, eu acredito tanto na consciência dos produtores de etanol, quanto na eficácia das políticas do governo. Sabe em quê? Nós estamos fazendo um esforço enorme, no sentido de garantir um aumento da produção de etanol, que não seja contraditória com a situação da cana-de-açúcar.

 

Jornalista: Presidenta, esses investimentos que o Brasil está fazendo, em função da Copa, fica uma outra pergunta: qual é o investimento que está se fazendo para a proteção das nossas crianças, porque não tem prática esportiva no Brasil para a criançada que está na escola. Quer dizer, parte desse dinheiro não poderia...

 

Presidenta: Tem sim. Não! Tem sim, me desculpa. Este país é um país, hoje, suficientemente estável, para poder fazer todas as coisas necessárias. No caso específico das nossas crianças, nós temos um programa que eu reputo muito importante, que é a cobertura dos ginásios esportivos do Brasil, das escolas médias... de ensino médio e fundamental. O que é isso? Aqui faz 50 graus à sombra, ou 40 graus à sombra, não faz?

 

Jornalista: Sim.

 

Presidenta: Você pode ter uma criança treinando numa quadra descoberta? Não. Então, nós fizemos uma política de cobrir dez mil quadras no Brasil, como uma forma de assegurar que as crianças tenham acesso, chova ou faça sol, à prática esportiva. Eu estou te dando uma delas. Isso aí deve estar em torno de R$ 6 bilhões, ou um pouquinho mais.

 

Jornalista: Presidente (incompreensível)

 

Presidenta: Só a última.

 

Jornalista: Presidente, a senhora sofreu a primeira derrota da senhora no Congresso (incompreensível) a classe ruralista. Hoje, a política da senhora é uma política de fazer as pazes? Fumar o cachimbo da paz com os ruralistas?

 

Presidenta: Olha, eu não acredito, eu não acredito, e vi manifestações nesse sentido, que os ruralistas aqui sejam a favor de desmatamento sem restrição e de anistia para desmatador ilegal, não acredito. Então, não vejo nos ruralistas pessoas que sejam contra isso.

Tenho absoluta certeza de que o Brasil, tanto o setor... tanto a classe ruralista quanto a maioria da população, tem consciência ambiental de que desmatar floresta no Brasil é fazer uma coisa contra o Brasil e contra os ruralistas. Porque, você não tenha dúvida, na hora que começarem a desmatar florestas no Brasil, impunemente, os primeiros a apontar o dedo para nós serão os nossos competidores, que vão falar: “Olha, esse produto aqui vem de floresta desmatada”.

Porque a minha experiência nessa área é uma experiência muito interessante. Vocês sabem o que diziam que Ribeirão Preto era? Era um local pertinho da floresta amazônica, e que nós tínhamos desmatado a floresta amazônica porque aqui, em Ribeirão Preto, plantavam cana. E eu, junto com uma porção dos líderes da área de cana, tivemos o cuidado de sistematicamente brigar e explicar que Ribeirão Preto distava da floresta amazônica como Lisboa distava de Moscou. Porque, vocês vejam, eu não acho que seja por ignorância que fizeram isso. Faziam isso por conta da competitividade do etanol brasileiro.

Então, tenham muito cuidado. Eu não acho que o meio ambiente prejudica o agricultor brasileiro. Não acho. Acho que, pelo contrário, respeito ao meio ambiente dá ao agricultor brasileiro uma grande força competitiva de dizer: este país é um país que respeita todos os critérios ambientais e, assim mesmo, produz uma agricultura... tem produtos de qualidade, como soja, a carne etc.

Agradeço a vocês. Meu muito obrigada.

 

Ouça a íntegra da entrevista (17min21s) da presidenta Dilma.