16-12-2011 - Entrevista coletiva concedida pela Presidenta da República, Dilma Rousseff, durante café da manhã com jornalistas-setoristas do Palácio do Planalto - Brasília/DF
Palácio do Planalto, 16 de dezembro de 2011
Ministra Helena Chagas: Ô gente, só para dar boas-vindas a vocês, agradecer o trabalho, este ano todo aqui que nós trabalhamos todos juntos aqui, agradecer a presença de vocês todos os dias. A gente sabe que não é fácil. Enfim, quero desejar também Feliz Natal para todo mundo. Isto aqui é um café absolutamente informal, uma confraternização. Acho que... vocês podem conversar com a Presidenta, todo mundo pode falar, mas eu queria pedir para ninguém gravar, não trazer gravador, não transformar isto numa entrevista formal, porque eu acho até que estragaria o momento que a gente tem de conversar.
Presidenta: Muito obrigada.
Ministra Helena Chagas: Gente... Está bom? Então, obrigada pela presença de todos aqui. Presidenta, quer...
Presidenta: Obviamente vocês podem usar o que for dito aqui. O que eu acho que é desagradável é porque nós vamos comer. Eu não tomei café da manhã, então eu vou tomar café da manhã e... vou tomar um cafezinho, vou comer um pãozinho porque ninguém é de ferro.
Ministra Helena Chagas: Não tirar foto de boca cheia.
Presidenta: Então, por favor. É só isso. Senão vai ser... eu vou ter de parar. Vamos fazer uma coisa mais descontraída nesse sentido. Agora, podem usar o que for dito aqui à vontade, do jeito que vocês quiserem.
Eu, inicialmente, vou fazer uma breve exposição, dizendo para vocês que eu não sou otimista a respeito do Brasil por conta do meu ofício. Não é por razões de ofício que eu sou otimista em relação ao Brasil, porque eu sou Presidenta. Eu sou otimista em relação ao Brasil porque eu acho que este ano nós tivemos o cuidado de tomar medidas de precaução diante de uma conjuntura que não estava muito clara qual seria, até porque no início do ano se esperava que os Estados Unidos tivessem uma pequena recuperação. Não se tinha noção, ainda no início do ano, do tamanho, nem da envergadura, nem da duração da crise europeia.
Mas, mesmo diante desse quadro, nós, porque detectamos pressões inflacionárias, fizemos um processo de consolidação fiscal que resultou, eu acredito, em contas públicas bem mais robustas do que seria de se esperar se a gente não tivesse feito isso. Por exemplo, nós estabelecemos, em termos fiscais, que faríamos um superávit cheio e fizemos esse superávit. Nós acreditamos que a estimativa para fechar este ano, que é a parte da administração centralizada, de 91,7 bilhões, nós vamos atingir sem nenhum problema.
Isso foi muito importante porque mostrou e sinalizou que o Brasil, de fato, a partir do século passado, no final do século passado – a partir dos anos 90 –, entrou numa trajetória de estabilidade, vamos dizer assim, com a inflação sob controle e, ao mesmo tempo, com a capacidade – agora, no final já, a partir do governo do presidente Lula –, com capacidade de estabelecer metas e cumpri-las. Então, do ponto de vista fiscal, nós achamos que a situação nossa permite hoje que a gente tenha um bom fôlego, uma grande capacidade de manobra.
De outro lado, o Brasil enfrenta este momento porque... também de forma adequada, porque nós também nos antecipamos na avaliação do que vinha. A partir de um determinado momento, o governo – a área econômica do governo, em especial – fez uma avaliação de que a crise econômica europeia não era o que nós, no início do ano, todos supúnhamos: os analistas econômicos, internacionais e nacionais.
A partir... um pouco antes da metade do ano, nós começamos a acender o sinal vermelho e percebemos, com uma certa acuidade – que eu acredito, a área econômica fez isso – de que essa seria uma crise de longo prazo e que poderia ter momentos de... picos críticos como a gente tem visto nos últimos tempos, que há uma oscilação extremamente acentuada. Um dia... segunda e terça todo mundo acha que agora vão resolver, quarta e quinta... é só ler os jornais internacionais, da própria União Europeia, vocês percebem isso, como por exemplo, o Financial Times ou The Guardian ou o El Pais, qualquer um deles, o Le Monde.
Isso permitiu também que nós tivéssemos uma antecipação em relação... obviamente, uma antecipação cautelosa, por quê? Porque também tínhamos de olhar a situação da inflação, a situação da estabilidade orçamentária e começássemos, inclusive, a reduzir impostos, a tomar providências no que se refere a um quadro que nós achamos que ia se desenhar, e eu acredito que ele ainda não está muito claro, mas já começou a aparecer em vários jornais – pelo menos europeus – que é uma proteção das características, vamos dizer assim, de cada uma das economias.
Cada país faz de um jeito. A França chama de relocalização. Parece que a relocalização vai ser o grande tema da campanha presidencial. O que é a relocalização? É a garantia de que vão... uma variante do Buy American [Act]: produção local com empregos locais, agregação de valor, agregação de inovação, ciência e tecnologia.
Nós também percebemos isso, por quê? Porque havia um... visivelmente, e haverá ainda, uma busca por mercados, desenfreada, num quadro em que você tem países desenvolvidos numa situação muito difícil. As indústrias desses países vão procurar vender seus produtos.
Então, esse é um processo que se dará em todos os países, em todos, está ocorrendo em todos. Se tem um país que está fazendo isso de forma muito explícita, é só vocês olharem os programas de investimento estimulados pelo governo nos Estados Unidos.
Então, há uma situação generalizada. Agora, nós teremos, portanto, uma situação não favorável do ponto de vista do que foi no passado, no que se refere ao ambiente internacional. A China também, tudo indica que reduzirá a sua projeção do crescimento. Ninguém sabe com exatidão qual é essa redução, mas é o que se verifica em todas as informações.
E a questão que me permite dizer que eu estou otimista e tenho certeza que o Brasil está numa situação melhor é porque nós temos recursos próprios. Nós temos recursos próprios para enfrentar este momento. Temos mais do que tínhamos antes porque esse é um processo cumulativo, e aprendemos muito também com a gestão da crise de 2009.
Então, eu vejo, muitas vezes, dizer que nós vamos ter problemas de crédito. De fato, o Brasil deu um salto de crédito. Se você olhar, nós passamos, em 2002 – final de 2002 – de algo como 380 – vamos botar 400 bilhões – para o que estamos hoje, quase 2 trilhões – R$ 1 trilhão, 940 bilhões.
Além disso, temos também, ao contrário dos outros países que quando a coisa aperta têm de recorrer ao orçamento deles e isso provoca problemas de... obviamente, de ampliação do déficit, nós não recorremos ao orçamento. Nós temos os depósitos compulsórios.
Portanto, o combate à crise do ponto de vista de crédito, ele não leva a uma perda de robustez fiscal do país, o que é uma vantagem para nós. Temos margem de manobra na política monetária. Eles estão praticando juros de 0,5% a 0, ou até 1%. Nós ainda temos margem de manobra na política monetária. Nós temos uma capacidade de investimento e nós temos de explorar às últimas consequências, tanto do ponto de vista do governo quanto do ponto de vista da iniciativa privada.
Eu vou começar pela iniciativa privada. Não é à toa que as entradas de investimento direto externo no Brasil aumentaram. Mesmo se a gente considerar que teve algum nível de – vamos dizer assim, não é, gente – de tentar maquiar como um investimento direto externo que, muitas vezes, era aplicação financeira – mesmo se a gente considerar que às vezes há isso –, os volumes que aportaram no Brasil em termos de investimento direto externo são extremamente significativos e evidenciam uma coisa que qualquer um de vocês, como eu, viajando para o exterior, percebe. Há uma confiança no Brasil não em termos especificamente desse momento, mas em termos do papel que a economia brasileira ocupará no cenário internacional nos próximos anos. Então, é algo que a gente fica, assim, orgulhoso, mas sem... tirando o fator orgulho, fazendo uma análise objetiva, significa o seguinte: aqui há oportunidades de investimento porque temos uma economia em expansão. A tendência da economia brasileira, mesmo quando você tem altos e baixos, é expansiva. Por que ela é expansiva?
Eu acho que um dos componentes principais dessa característica é o fato de este país, primeiro, ser um país de dimensões continentais – os Brics são isso, países de dimensão continental –, com grandes recursos naturais. O Brasil, além disso – além de ter essas duas características –, tem uma população significativa, que está em processo de transformação em classe média. Eu acho que este elemento é um dos elementos essenciais da força do país em relação ao futuro. O fato de nós termos um... porque pode ser que, do meu ponto de vista, além do componente econômico, eu tenho um componente ético e moral em relação aos pobres deste país. Mas, sem... tirando o meu componente... vou tirar o meu componente ético e moral e quero dizer para vocês: a demanda reprimida do povo brasileiro é uma das coisas mais fortes. Por quê? Porque durante tempo o povo brasileiro quis consumir, o povo brasileiro foi até, pelos meios de comunicação, instigado e viu todos os benefícios que a sociedade trazia.
Então, essa demanda reprimida, ela é muito alta e também tem um fator muito importante: quanto mais a nossa população fica de classe média, tanto mais ela vai exigir qualidade no serviço público. Este desafio é um desafio que cabe ao governo enfrentar, cabe aos nossos funcionários, aos médicos, aos professores.
Antes o Brasil era assim. Nós, da classe média... a classe média consumia serviços específicos. Eu sou de uma época em que a gente estudava em colégio público, mas, mesmo quando se estudava em colégio público era uma minoria que passava no colégio público. Mas, a partir de um determinado momento – eu acho que no final dos [anos] 80 –, o serviço público efetivo na saúde e na educação se transformou em serviço privado. Quem tinha uma certa renda, recorria a esse tipo de serviço. Hoje, crescentemente, esse pessoal que subiu para a classe média vai exigir serviço público de qualidade e eles vão ser os grandes portadores da discussão e da crítica ao serviço público.
Por isso, o meu governo tem absoluta consciência da importância do imenso esforço de qualificar – como o presidente Lula também teve –, de qualificar a educação, interiorizar a educação, garantir escola técnica, e agora também garantir um acesso mais democrático ao estudo no exterior. Por isso que nós vamos colocar à disposição de todos os alunos que têm 600 pontos no Enem o curso de línguas. O país tem... os nossos jovens, o pessoal que vem do ProUni, o pessoal que passa no Enem, de renda mais baixa, que não teve acesso a um curso privado de inglês, vai ter acesso a um curso público e vai ter imersão. Eu digo o seguinte: são processos que nós vamos ter de desencadear, tanto na área da Saúde quanto na área da Educação, para incorporar essas milhões de pessoas que subiram para a classe média.
Mas, voltando... Isso aí foi um desvio que eu fiz, estou voltando para a minha fala. Então, eu acredito que o Brasil, do ponto de vista econômico, ele tem uma das agriculturas de maior competitividade, e não é uma agricultura que não aposta na inovação, na ciência e na tecnologia, e a grande novidade é que vai ter uma agricultura comercial, aliás, uma agricultura familiar, com poder de acessar os canais de distribuição comercial, que é uma... vai ser uma revolução.
Quando a gente cria a Rede Brasil Rural e assegura, para o agricultor, lá no fim do Rio Grande do Sul, lá no meio de Pernambuco ou de qualquer outro estado, vai ser uma progressão crescente, o que é que nós queremos? Nós queremos que ele receba renda a partir do exercício da atividade da agricultura familiar, que até um tempo atrás foi uma agricultura de subsistência. Ainda tem na agricultura familiar vários tipos de agricultura. Você encontra agricultura de subsistência, você encontra uma agricultura em transição para comercial, e você tem já um pequeno agricultor familiar que está no mercado.
Nós queremos que os agricultores tenham acesso a essas redes, tanto de fornecimento como de distribuição. Por quê? Porque uma parte da classe média está ali, da nova classe média, vai estar ali bem enraizada. A outra parte da nova classe média é o empreendedorismo, daí a importância que nós demos ao SuperSimples e ao MEI – o microempreendedor individual –, a capacidade dele de resistir e sobreviver, porque o grande problema deles é que eles não são longevos. Então, o que nós queremos é que eles fiquem longevos, que eles durem, que um empreendedor... porque no Brasil tem muito empreendedor e um empreendedor, nesse caso, é uma figura central.
Agora, é um país que tem uma indústria... nós não fomos sucateados. A indústria nossa não foi sucateada naquele processo em que muitas indústrias foram em outros países. Nós mantivemos algumas quase intactas, outras faltam elos, outras têm um nível de integração – que é normal que assim seja – internacional, outras vão ter de, progressivamente, agregar valor no Brasil.
Podem ter certeza que nós temos política industrial, sim. Este governo tem política industrial, como o governo do presidente Lula teve política industrial. Nós não somos mais daquela época em que era vergonhoso ter política industrial. Não existe razão para que as sondas produzidas no Brasil, aliás, as sondas requeridas por demanda no Brasil não sejam, uma parte expressiva, produzidas no Brasil. Nós fazemos toda uma política industrial, mas não somos daquela fase que fecha o mercado brasileiro, não. Nós achamos que uma parte do mercado brasileiro tem de estar aberto para maior competitividade, para acesso a melhor tecnologia e também para que você não crie feudos, feudos que são... sempre são ineficazes, ineficientes e de preço alto.
Eu acredito que o Brasil, além disso, nesta crise tem, ao mesmo tempo, um grande ônus – porque todos os países têm –, porque quando a economia mundial toda cresce, todo mundo se beneficia, mas nós temos de olhar, também, a crise olhando essa questão da oportunidade. Nós temos uma oportunidade de acelerar o nosso crescimento.
Então, eu confio muito que a iniciativa privada brasileira também – todas aquelas áreas que nós temos com força de expansão – vai produzir uma taxa de investimento importante no próximo ano, taxa de investimento essa que, aliás, o IBGE andou revisando. Nós estávamos trabalhando com uma taxa menor, (incompreensível) uma taxa menor e estamos vendo hoje que foi em torno de 20% a taxa. Nós teremos de chegar – para o Brasil ficar muito bem –, nós temos de chegar a uma formação bruta de capital fixo, ali em torno dos 24, 25%. Esse vai ser um esforço crescente que, ao longo do meu período de governo, eu, pelo menos,vou perseguir.
Uma outra questão que eu queria enfatizar é a questão também do financiamento do governo. Nossos programas, nós fizemos em todos eles uma grande revisão, em todos, os grandes programas de investimento, e, primeiro, uma das coisas que é visível é que certos tipos de programa, eles nunca podem acabar, eles têm de ter uma continuidade sistemática. Não tem como a gente achar que tem um dia que você resolve todos os problemas, mas tem pontos fundamentais, por exemplo, o Minha Casa, Minha Vida. Nós fizemos uma revisão, mudamos o preço para cima, dos imóveis, porque estávamos reconhecendo uma realidade. Sabemos que em muitos lugares o preço da terra está muito caro, principalmente nas grandes zonas urbanas do país. Por isso, estamos fazendo uma parceria com vários governos, cada vez mais, e vamos, de fato, ter um nível de investimento muito expressivo no Minha Casa, Minha Vida.
O Minha Casa, Minha Vida não dá bolha, por um motivo muito simples: a equação é completamente diferente da equação que deu bolha nos Estados Unidos ou na Espanha, por exemplo. No Minha Casa, Minha Vida o governo assume, na faixa de até R$ 1,3 mil, assume praticamente quase todo o valor do imóvel. Fica uma parte importante porque é adequada à renda para a pessoa valorizar também, óbvio, mas a grande maioria do valor do imóvel que sendo... ninguém que ganha até R$ 1,3 mil consegue comprar uma casa de 50 mil. A equação financeira não fecha, daí porque o governo subsidia, sim.
Eu acho que também uma mudança na política social e na política... nós subsidiamos porque nós sabemos o déficit social que o país tem. E na faixa de 1,6 mil... desculpa, eu falei 1,2 mil? 1,3 mil? não é. É 1,6 mil. De 1,6 mil até 3,2 mil, nós garantimos uma parte, nós damos um subsídio para uma parte e as pessoas pagam a outra. Na faixa de 5 mil, de R$ 5 mil de renda – de 3,2 mil a 5 mil –, nós damos um suporte de garantia. Nós melhoramos a garantia para diminuir o custo. Nós damos garantia, nós diminuímos o seguro, a gente assume uma parte substantiva.
Então, esse programa, ele tem um poder de... para vocês terem uma ideia, ele monta a R$ 125 bilhões, R$ 125 bilhões não é pouca coisa, distribuída por três anos, aliás, quatro... três anos e meio, porque até o Congresso aprovar. Nós só conseguimos aprovar o resto do programa recentemente, porque tivemos de aprovar o aumento do subsídio. É obrigatório passar pelo Congresso. E também fizemos inúmeras melhorias no programa: aumentamos as janelas, toda cozinha tem de ter azulejo, tem de ter azulejo no banheiro. Fizemos uma série de modificações.
Bom, além disso, no PAC... o PAC nós dividimos em várias grandes áreas. Acho que estamos conseguindo, por exemplo, colocar em operação, de uma forma consistente, os aeroportos, através de um processo de concessão em que participa a Infraero, com 49%, e participa a iniciativa privada com 51%, sendo que desses 51% tem de ter alguém especializado – até 10% –, especializado em operação de aeroportos, o que é bastante razoável. Nós podemos... nós não precisamos inventar a roda. Nós podemos, para que a roda exista, dar uma boa...
Ministra Helena Chagas: Rodada.
Presidenta: Não é bem rodada. Uma boa transferência da roda para o nosso aeroporto, ou seja, nós podemos operar através do que há de melhor prática no mundo.
No caso das rodovias, também nós fizemos toda uma revisão. Nós estamos buscando um processo, absolutamente sob controle, de projeto executivo e projeto básico: o estudo de viabilidade. Tudo será informatizado. Nós pretendemos que isso ocorra até março, e ao contrário do que vocês possam pensar, nós mantivemos o nível de investimento em rodovias no mesmo patamar, que foi o maior nível até então atingido, que foi o de 2010. Este ano, vai dar um pouco mais do que em 2010, quando se fechar o ano inteiramente em termos de gasto financeiro. Em termos de empenho, um pouco maior.
Além disso, ferrovias, nós estamos fazendo todo um rearranjo e criando um novo modelo de ferrovias, que esperamos que seja muito bem-sucedido. As outras demais ferrovias continuam.
Além disso, no que se refere à área de energia, as nossas principais... os nossos principais investimentos continuam no mesmo ritmo. Algumas áreas novas, nós criamos, e elas vão ter importância, não tanto pelo volume de investimento, mas pelo bem que elas podem trazer, por exemplo, estradas vicinais para municípios pequenos, sem poder de fazer estrada vicinal. Nós nunca entramos nisso, agora estamos entrando. Como é que nós fazemos estrada vicinal? Nós não vamos lá e fazemos. Nós damos as máquinas para o prefeito. O que o governo federal faz é dar máquina, que é a parte mais cara do processo de garantir que haja fluxo livre de produtos nessas pequenas comunidades. Vamos fazer isso em todo o Brasil.
Uma das coisas mais importantes, que eu acredito que fizemos, foi tanto na área da saúde, naquilo que eu disse para vocês que têm de melhorar a qualidade da saúde, foi o Melhor em Casa, que é o tratamento em casa, do doente, e o programa SOS Emergências, que é uma parceria com os hospitais de excelência deste país, a gente fazer com que os nossos hospitais tenham um padrão similar ao padrão desses hospitais de excelência, que eles nos ajudem, que eles nos deem suporte para isso.
Além disso, eu acredito que vários outros programas são importantes – Rede Cegonha...
Ministra Helena Chagas: Remédio.
Presidenta: ...e esse do remédio, que a Helena me lembrou, que foi talvez o programa de maior impacto nas pessoas porque permite que elas ganhem dois tipos de remédio, basicamente, para diabetes e hipertensão. Por quê? Porque, inclusive, é bom saber disso, uma das partes de pressão na Rede SUS era porque a pessoa que queria receber o medicamento gratuito, ela tinha de ir na Rede SUS marcar uma consulta, porque tem uma consulta do médico, e depois pegar a consulta e ir ao médico. O que nós fizemos tem dois aspectos. Tem o aspecto social, que é reconhecer que este é um programa de saúde pública, porque são as duas doenças de maior incidência, e, além disso... porque diminui a pressão sobre a Rede SUS, diminui o custo da Rede SUS.
Eu queria também falar dos dois, aqueles que eu acho que são muito importantes. O Programa Estratégico de Fronteiras combinado com o Combate e o Enfrentamento às Drogas e o programa para as pessoas com deficiência. Acho que aí nós completamos uma parte do processo.
Amanhã, aliás, me desculpem, é hoje. Hoje nós vamos fazer um balanço do Brasil sem Miséria na reunião com os governadores aqui do Centro-Oeste. Então, eu não vou falar para vocês do Brasil sem Miséria, não, porque aí nós perdemos tempo.
E eu queria finalizar dizendo o seguinte: do ponto de vista internacional, nós estamos cada vez mais reforçando as relações com toda a América do Sul. Acho muito importante aquela reunião... aqui nós não demos, assim, muita importância. Pelo menos eu não vi, assim, grande destaque. Acho... é a primeira vez que reúne todo o Caribe, toda a América Central, do México para baixo até a Patagônia – todos os presidentes, primeiros-ministros ou altos representantes. Tinha, dominantemente, presidente e primeiro-ministro. Em muitos poucos casos foram altos representantes. Essa é uma reunião muito importante porque significa uma consciência elevada da importância da região, importância que não é só geopolítica; importância econômica desta região, grande importância econômica desta região.
A outra questão que eu acho que nós continuamos e devemos continuar cada vez mais é em relação à África. Eu, infelizmente, só pude ir à África Subsaariana, a África... Angola, Moçambique e África do Sul, mas acho importantíssima também a África do Norte. No próximo ano eu vou dar uma dedicação especial a isso, porque o Brasil tem de ter uma visão multipolar de política externa. Isso não significa que nós não mantenhamos bem próximas as nossas relações com os Brics.
Em todas as diferenciações que têm entre as nossas economias, nós temos tido posições comuns em quase todos os assuntos. Tivemos essa posição comum no G-20, todos nós nos dispomos, dentro da medida de cada um dos países, a emprestar para o Fundo Monetário Internacional, como uma forma de ajudar, ser mais um elemento no chamado muro corta-fogo da crise europeia: o Banco Central europeu, o fundo de estabilização e o Fundo Monetário. Nós dispomos, todos os Brics, a fazê-lo.
Nós tivemos várias posições comuns em vários episódios. É importante essa relação do Brasil com os Brics, ela é estratégica, são economias extremamente poderosas que serão, de fato, um dos grandes elementos do futuro do mundo.
Ademais, eu considero importantes as nossas relações com a União Europeia. Tivemos sempre uma posição de ajuda, de solidariedade, não tivemos, em nenhum momento, a soberba, até porque sabemos perfeitamente o que é um ajuste fiscal sem luz no fim do túnel. Ficamos 20 anos num ajuste fiscal sem luz no fim do túnel e sabemos aonde ele vai dar. Fomos, assim, bastante enfáticos ao dizer que devia procurar combinar as duas coisas como forma de sair da crise com maior rapidez. Quanto mais a economia está crescendo – é que nem andar de bicicleta, não é? Parou, caiu. Parecido.
Então, e finalizando eu queria dizer o seguinte: nós tivemos todas as ações possíveis, no sentido de assegurar que o Protocolo de Kioto fosse prorrogado. O Brasil tem tido, desde Copenhague, que eu acompanhei de perto, uma luta insana para preservar o Protocolo de Kioto. Significa metas e redução das emissões. Infelizmente, por várias razões, não foi possível que isso acontecesse agora, em Durban, mas nós iremos trabalhar incansavelmente para que em 2020 isso se concretize. Mas, para ser concretizado em 2020, eu começo agora, ou não vão ter metas, ninguém vai assumir metas claras.
Nós assumimos aquela redução em relação a 1990, de 36 a 39%. Em várias questões, nós já até ultrapassamos. Eu, inclusive, estive falando com a ministra Izabella sobre essas metas, para a gente fazer um monitoramento mais estreito, ou seja, mais fino, dessa questão. O Brasil vai ter a Rio+20. Nós vamos aproveitar essa Rio+20 para tentar, de fato, como foi a Rio 92, construir um novo paradigma, construir um novo paradigma.
E eu queria dizer a vocês uma outra coisa: eu vou até, incansavelmente, vou colocar toda a força do governo brasileiro para, junto com todos os aliados que nós temos, nessa questão do clima, não deixar que essa seja uma discussão que desapareça do cenário internacional, das nossas relações bilaterais e multilaterais.
Nós não abandonamos e acho que esse é um compromisso do Brasil com o mundo, até porque nós temos condições muito especiais e podemos, sem sombra de dúvida, ser um país onde se prove que é possível crescer e ter um compromisso forte com a questão da preservação do meio ambiente, da biodiversidade das florestas, dos cursos d’água, mas, sobretudo, também provar que isto é... existe uma ficção de que o meio ambiente é um obstáculo ao crescimento. O Brasil pode provar que isso não é real.
Finalizando, para dar a palavra a vocês, eu queria dizer o seguinte: foi um ano de grandes desafios. Nós vamos fazer um governo que não tem nenhum compromisso... eu não tenho nenhum compromisso, o meu governo não tem nenhum compromisso com qualquer prática inadequada de malfeitos, de corrupção dentro do governo. Nenhum. É zero. Tolerância zero também. E também eu vou, cada vez mais, exigir que os critérios de governança internos do governo sejam critérios internos do governo, que nenhum partido político interfira nas relações internas do governo. Isso vale para todos os partidos políticos. Uma coisa é a governabilidade e é importante que os partidos participem, possam indicar nomes. Mas, a partir do momento em que o nome foi indicado, ele presta contas ao governo. Não presta contas a mais ninguém, senão seria muito estranho.
Quero deixar isso claro porque nós estamos... vocês vivem falando que vai haver uma reforma, vocês vivem! Ninguém nunca me perguntou. Não, não, ninguém nunca me perguntou: “Vai ter uma reforma?”. Vocês vão...
Jornalista: Vai ser em janeiro a reforma?
Presidenta: Vocês vão ficar surpresos. Não é, não. Não, não venham com essa conversa.
Jornalista: (incompreensível) ministério?
Presidenta: Não, não é isso que faz a diferença no governo. Tem ministérios completamente... cada ministério tem um determinado tipo de responsabilidade. Tem um Ministério com responsabilidade imensa, como a Fazenda. Outro Ministério com responsabilidade imensa, como a Educação. Tem ministérios com responsabilidades políticas imensas, como das mulheres. Ter ministérios com responsabilidades políticas imensas, como o combate à desigualdade racial. São diferentes. Quem não enxerga isso é porque não está no dia a dia do governo, eu entendo que não enxergue, é normal. Agora, são diferentes. Ninguém pode falar, porque falam isso no jornal e eu acho engraçadíssimo: “A Presidente só fala com o Ministro da Fazenda, o ministro de não sei o quê, ou da Educação, ou da Saúde”. Ora, são diferentes também as demandas, completamente diferentes. A eficácia de um governo vai se dar quando nós conseguirmos mudar muitas práticas de governança. Eu, atualmente, estou preocupada com duas.
Uma vez eu disse, numa reunião lá da nossa Câmara de Gestão, que nenhum país do mundo, nenhum, nem a China, conseguiu dar saltos substantivos na questão do seu desenvolvimento, da sua incorporação como nação sem que o Estado sofresse uma reforma e tivesse uma base de grande eficiência. E aí me perguntaram: “A China também?” A China também. Vocês não esqueçam que teve um momento na China, com um senhor que era primeiro-ministro, que se eu não me engano chamava Zhu Huan Jin, que eles reformaram os bancos. Os bancos chineses são o que são porque eles fizeram uma reforma brutal no seu sistema financeiro, modificaram imensamente o seu sistema de política fiscal e monetária. Agora, não é nos nossos padrões, é nos padrões deles. O que eles completaram ou deixaram de completar é outro problema, é deles.
Nós... Os Estados Unidos fez isso, a Alemanha fez isso, todos os países fizeram isso. Nós temos de fazer um processo de fazer a profissionalização do Estado brasileiro. Nós temos de fazer isso. Temos áreas de alta profissionalização e competência: o Itamaraty, a própria Receita tem isso, o Exército, a Marinha e a Aeronáutica. Vocês tem vários, já. Na área econômica você tem corporações que se aperfeiçoaram. Mas não é isso que eu estou falando, eu estou falando numa modificação no cerne, no funcionário do governo, numa valorização de um lado, mas numa exigência de eficiência.
Agora, o governo vai ter de dar condições de formação também. Estou falando em profissionalismo aqui, meritocracia também. Mas primeiro eu falei foi de profissionalismo, nós temos de profissionalizar o setor público brasileiro. Nós temos de dar ênfase para a formação dos funcionários. Eu preciso, como governo federal, como representante do governo federal, de um Estado que seja ágil. Então esse é o grande desafio.
Jornalista: E o reajuste?
Presidenta: De quem?
Jornalista: (incompreensível)
Presidenta: Olha, meu querido, essa é uma questão que está no Congresso. O Congresso fale sobre isso. Este ano, eu quero deixar claro, que o governo foi muito explícito. Nós nunca deixamos dúvida quanto a qual era a nossa posição. Nós achávamos que o país estava fragilizado, porque se ele... Ele tinha de se reincorporar... Estava fragilizado porque vinha uma crise violenta. Se ele... Aliás, ele estava fragilizado. Ele seria fragilizado se ele tivesse uma política de gasto sem controle, que não era hora de dar aumento salarial para categoria nenhuma. Isso vale para todo mundo. Eu não acho ninguém melhor do que ninguém. Aliás, não me acho melhor do que ninguém. Então, o que vale para uns, vale para outros. Nós achamos isso para todos. Agora, nós não controlamos isso. Isso, a partir de um determinado momento, tem variáveis, que são as variáveis que estão legitimamente colocadas no Congresso Nacional, e eu tenho de respeitar. Agora...
Jornalista: Isso é corporativismo, né?
Presidenta: Meu querido, eu não faço análise sobre Poderes, como eu não faço sobre países. Não me peça que eu faça uma análise, nem sobre o Congresso, nem sobre o Judiciário. São Poderes que têm as suas dinâmicas.
Jornalista: A conta não vai ser do governo?
Presidenta: Meu querido, vou repetir isso: eu não faço e ninguém me fará fazer análise sobre o poder e a competência dos outros Poderes, como não posso fazê-lo em relação a outros países. Não compete a um Presidente da República fazer isso. Vocês vão me desculpar, mas se eu fizesse, eu daria uma demonstração grande de leviandade. Não cabe a um Presidente se pronunciar a respeito dos outros Poderes. Eu não posso fazer isso.
Jornalista: (incompreensível)
Presidenta: Minha querida, tudo que eu tinha de fazer eu fiz, viu? Tudo. Não tem mais o que fazer. Eu fui a público, disse... porque tem um nível de desgaste político. Eu fui a público dizer: olha, não dá. Não dá isso, não dá aquilo. Então, meus queridos e minhas queridas, eu esgotei. O que eu pude fazer, eu fiz. Agora, eu deixo claro por que eu estou fazendo. É porque eu não gosto daquele segmento e prefiro o outro? Não! Porque tem um processo de crise e o Brasil se fragilizaria se nós começássemos a gastar sem... por conta, ou seja, se fosse uma outra conjuntura... ou seja, se não tivesse isso acontecendo, poderia ser que coubesse, porque não é crime pedir aumento salarial, não. Nós vivemos num país em que isso é possível. Não é crime! É algo que as categorias têm todo o direito de pedir. O problema não é esse. O problema é que não se coaduna com o momento, que nós não escolhemos.
Jornalista: (incompreensível)
Presidenta: Ô gente, vou dizer para vocês: 2012 vai continuar do jeito que a lei manda. A lei manda de um jeito que, se não apresentar até agosto, não pode compor o orçamento. Mudando isso, tem 2012; não mudando, é 2013.
Jornalista: (incompreensível)
Presidenta: Eles estão... Agora vocês... Vamos tentar organizar as perguntas. Alguém pergunta... Não, minha querida, você pega este. Você pode me dizer quem. Então é ele que vai perguntar.
Ministra Helena Chagas: Gente, olha...
Presidenta: Levanta, por favor, e pergunta para todo mundo escutar.
Ministra Helena Chagas: Isso. A minha sugestão é passar o microfone para quem quiser falar, para a Presidenta ouvir. Enquanto passa o microfone, a Presidenta toma um cafezinho.
Presidenta: Enquanto passa o microfone, o senhor grita.
Ministra Helena Chagas: Para ela ter tempo de tomar um cafezinho, para ela poder comer um pouquinho.
Presidenta: Ela está sugerindo isso. Enquanto passa o microfone, você imposta a voz e fala. Aqui ó, dá para falar. Dá uma impostadinha e fala.
Ministra Helena Chagas: Para ela comer, gente. Olha, ela nem tocou no café dela.
Presidenta: Não, eu não vou... Eu vou (incompreensível)
Ministra Helena Chagas: Tem outro microfone ali, ó. Tem outro ali.
Presidenta: Está ótimo. Dá para ele ali.
Ministra Helena Chagas: Passa, que aí fica mais organizado também, senão fica tudo...
Jornalista: Menos mal, que assim eu não preciso ficar em pé. Olha só.
Presidenta: Levanta, levanta.
Jornalista: Ah não, Presidente. Fico com vergonha.
Presidenta: Ninguém te enxerga lá.
Jornalista: A Presidente está me sacaneando. Presidente, isso foi uma sacanagem com o meu tamanho, hein?
Presidente, a senhora falou sobre profissionalismo, sobre meritocracia e disse que quer elevar o nível da governança do governo a ponto de nenhum partido interferir nas indicações e nas escolhas. E mesmo depois que elas forem feitas, é uma obrigação do Estado. Só para compreender: numa vindoura possível reforma ministerial, troca de ministros – como a senhora preferir chamar –, vai ter critérios mais elevados para escolher ministros, até para evitar o que a gente viu ao longo deste ano, muitos ministros sendo acusados? A senhora pretende adotar alguma regra de ficha limpa, alguma coisa nesse sentido?
Presidenta: Eu vou dizer para vocês o seguinte: o que ocorrer dentro do governo – vou repetir para ti –, o que ocorrer dentro do governo, de irregularidade, não será tolerado. O que for prática de governo, não será tolerado. Se eu vou ter critérios para escolher ministros. Eu tenho critérios para escolher ministros. O que eu acho que ocorre é que houve problemas específicos em cada área. Não tenho como te dizer se em algum momento, no futuro, isso vai novamente ocorrer, não tenho como, nem vocês têm como me dizer isso. Agora, eu te asseguro que vou tomar todos os cuidados no sentido de que não aconteça. Agora, esse todo cuidado no sentido de que não aconteça nenhum problema é algo que eu tenho só um controle relativo. Aumenta o meu controle, porque também não acredito que alguém que tenha algum problema muito forte queira entrar no governo, sabendo que não tem tolerância, alguém que queria ter alguma atitude incorreta. Então, acho que tem um lado disso que é mais o efeito... um efeito até que vocês, de uma certa forma, contribuem.
Espero que... para mim é sempre melhor, porque nós trabalhamos muito no governo. E cada vez que há um processo desses, eu estou lançando um dos melhores programas e vocês estão pensando em outra coisa, até para mim é ruim. É mesmo. Eu estou lá lançando o Brasil sem Miséria e vocês estão falando de outro assunto; eu estou fazendo o Brasil Maior, vocês estão fazendo outro assunto. É como se houvesse dois Brasis. Obviamente, eu acho que escândalo vende mais jornal.
Jornalista: Presidenta, a senhora falou muito... só pegando o gancho do Jéferson, a senhora falou muito dessa ingerência dos partidos, talvez, no governo.
Presidenta: Falei muito, não, falei uma frase.
Jornalista: É? Só? Isso, mas foi uma frase forte. E a senhora acha que...
Presidenta: Não, é porque depois vão falar: ela passou a reunião inteira falando nisso, foi uma frase.
Jornalista: Não, não foi isso que eu quis dizer. Não foi isso que eu quis dizer, Presidenta, desculpa. É que a senhora foi enfática ao falar disso.
Presidenta: Eu, geralmente, sou enfática.
Jornalista: Isso é bom. A senhora analisa que no primeiro ano do seu mandato o mais difícil, o mais complicado, além de lidar com as questões do Brasil, do econômico, do social, foi lidar com essa ingerência dos partidos? Essa pressão, esse descontrole, talvez, dos ministérios?
Presidenta: Não. Eu não acho que os partidos, nesse período – é bom eu falar isso, eu te agradeço a pergunta – tiveram ingerência dentro do meu governo. Acho que em alguns momentos você vê algumas tentativas e muito menos por causa do partido, e muito mais pelas pessoas que estão indicadas.
O que eu acho mais difícil, que foi mais difícil no governo, não foi isso. O que foi mais difícil no governo foi a questão econômica. É sempre a questão econômica a mais difícil. Acho que a questão social, ela é difícil, mas é um desafio que nós temos, hoje, uma certa capacidade e um conhecimento para ultrapassar.
Essa é uma questão que incomoda, mas ela não é difícil. Eu não posso só fazer o seguinte, eu tenho de preservar duas coisas: eu tenho de preservar a integridade do governo, eu tenho de preservar um governo que não cometa nenhuma irregularidade; ao mesmo tempo, eu não posso sair por aí apedrejando pessoas, acabando com a honra da pessoa e fazendo julgamentos, eu te diria assim, sem direito de defesa. Por nenhuma, por nenhuma pressão eu farei isso. Eu acho que um país como o nosso tem de preservar as duas coisas. Tem de preservar a sua capacidade de não tolerar malfeitos, de um lado, mas também tem de preservar a sua capacidade de não criar caça às bruxas. Caça às bruxas nós já vivemos em vários momentos no passado – eu estou falando em outros países, já se viu isso em outros países –, nunca dá certo, nunca leva a boa coisa. E, mesmo que não tivesse ocorrido isso em outros países, eu não permitiria aqui. Não acho isso condizente com um país que deu tantos passos em relação à democracia.
Então, se vocês me disserem o que eu acho disso, eu acho essa questão. É sempre necessário ver os dois lados, porque a tentação de muitas pessoas, de saírem por aí condenando as outras, sem direito de resposta, e chega um momento em que a pessoa se sente tão cercada – e nós já vimos isso também no passado –, que muitas vezes ela sai sem ter responsabilidade. Tem o caso do ministro Alceni Guerra que é isso. Outras pessoas podem provar isso ao longo do tempo, porque isso você só prova com o tempo. Então, eu sempre cuido para não ter a dupla coisa.
Começando pelo fim, que é mais fácil, eu acho que nós provamos que no centro do poder, no Brasil, pode ter mulheres, que não é uma presidenta... Tem uma... Não, mas tem uma Presidenta, uma Ministra-Chefe da Casa Civil, uma Ministra das Relações Institucionais, uma Ministra da Comunicação Social. Acho que poucos governos no mundo, mesmo aqueles presididos por mulheres tiveram, no núcleo do poder, mulheres.
Jornalista: (inaudível)
Presidenta: Eu vou te falar uma coisa: eu não acho, assim, os homens tão ruins, viu? Também não acho eles tão ruins. Eu acho que a gente, nós, homens, aliás, as mulheres, e nós... O olhar feminino é o seguinte: nós cuidamos mais... Vou te dar dois programas que eu acho que tem muito o olhar feminino: o tamanho da janela das casas, a cozinha e o azulejo. Eu acho que... os homens participaram, mas eu acho que tem muito o olhar feminino no programa de estímulo, de suporte das pessoas com deficiência. Eu acho que tem uma forte olhada. Tem também na importância que nós demos para o enfrentamento das drogas, tem muito olhar feminino, a pressa feminina para tratar desse assunto, nesses dois casos, eu acho que tem o olhar feminino.
Tem o olhar feminino, eu acho, quando a ministra Tereza Campelo faz o programa de profissionalização das mulheres, aliás, de profissionalização, com mulheres mil, que chama Mulheres Mil. É um programa especial que tem dentro do MDS, que olha das características específicas da formação profissional da mulher; tem quando a gente insiste com o Padilha sobre o câncer de colo de mama e de útero.
Então, você vai, você tem. Agora, eu vou te afirmar, acho que tem grandes contribuições dos homens também, no meu governo. Não posso dizer que não tem. Eles vêm, eles vêm colaborando, a gente... não acho eles ruins assim, acho eles, assim, bastante competentes. Mas acho que esse olhar feminino, ele faz bem, porque é uma outra forma de abordagem.
Eu sempre achei que as mulheres têm uma capacidade de participação complementar. Não no sentido complementar de secundário, mas eu acho que têm uma visão mais analítica e os homens, em alguns momentos, mais sintética, e elas duas combinam bem.
Jornalista: (inaudível)
Presidenta: Olha, o meu é otimista, você queria que fosse o quê? Pessimista? O meu cenário é entre 4,5 e 5. A minha meta é cinco, a meta do Guido é cinco. Agora, nós deixamos...
Jornalista: (incompreensível)
Presidenta: Do Guido Mantega também é cinco. De toda a área econômica é cinco, é isso que eu quero dizer: a minha e a da área econômica.
Jornalista: (incompreensível)
Presidenta: Aumenta.
Jornalista: E a inflação?
Presidenta: Nós temos certeza que a inflação fica sob controle.
Jornalista: Mas no centro da meta?
Presidenta: Olha, fazendo aquela curva suave, porque se ela estiver em cinco e o centro da meta é 4,5, não faz diferença nenhuma.
Jornalista: Presidente...
Presidenta: Não faz diferença nenhuma no sentido de que não está descontrolada.
Jornalista: A senhora falou em (inaudível).
Presidenta: Não, eu falei em 20%, viu, na revisão do IBGE. Deste ano eu ainda não sei o que dá.
Jornalista: (incompreensível)
Presidenta: Não, o IBGE reviu, se eu não me engano, 2009, que ele tinha dito que era 16%.
Jornalista: (incompreensível)
Presidenta: Não, esse eu não tenho como fazer. Aí seria precipitado, sabe?
Jornalista: Presidente, bom dia. Cristina Lemos, TV Record.
Presidenta: Bom dia, Cristina.
Jornalista: Eu gostaria que a senhora comentasse uma expressão que a senhora mesma usou. A senhora está completando um ano de governo. Quando a senhora tomou posse, a senhora afirmou que estenderia a mão para a oposição. Efetivamente, a senhora escreveu uma carta muito importante para o ex-presidente Fernando Henrique. Eu gostaria de saber se a senhora continua com a intenção de estender a mão para a oposição. Quem na oposição seria a pessoa mais adequada para esse gesto seu? E, por último, gostaria de saber se a senhora teve a oportunidade de dar uma olhada no livro Privataria Tucana, se acha essa obra importante, se acha que é o caso de se fazer uma CPI no Congresso, a sua relação com a oposição para hoje e para o futuro.
Presidenta: Olha, eu estendi... eu não estendo a mão, eu estendo várias mãos. Acho que é muito importante, no Brasil, uma relação civilizada entre governo e oposição. O que nós temos visto também nos países do mundo, neste ano, foi uma relação oposição-situação extremamente, eu diria assim – uma palavra, assim, muito forte...
Ministra Helena Chagas: Civilizada.
Presidenta: Não, incivilizada. Deletéria, até. Você não pode supor que um país democrático tenha sustentabilidade quando há um episódio como aquele da votação do teto, do limite do teto, do ceiling lá, do limite do teto do endividamento nos Estados Unidos. Nós temos de evitar que os canais de discussão entre oposição e situação sejam canais diferentes, ou seja, um fala uma língua, o outro fala outra.
Isso é, talvez, uma das piores doenças da democracia. E não foi só lá que se verificou isso, em vários outros países verificou a perda da noção do bem comum, do que é o bem para todo o país, num determinado momento, independentemente de você ser situação ou oposição, e o meu interesse partidário. Eu falei isso, inclusive, na ONU. E isso não se faz, isso não é possível, isso não é adequado, num processo democrático.
Daí porque eu acredito em estender a mão, civilizadamente, para a oposição, em quê? Em todas as circunstâncias em que está em jogo o interesse do país. Naquelas que pode ser de um jeito ou pode ser do outro, que são a grande maioria, a oposição externe o seu posicionamento, seja dura, seja... tenha a sua atitude de oposição. Agora, eu acredito muito nessa relação civilizada. E relação civilizada significa conversa, que é a característica mais intrínseca do ser humano, é conversar, sentar e conversar. Não precisa ter a mesma posição para você conversar com alguém, precisa de ter um pouco de capacidade de entender que pode ter outras posições.
Então, acho importante essa relação. Eu sempre me dispus a tê-la. Eu considero também muito boa a relação com os governadores dos partidos de oposição. A relação entre nós é uma relação republicana. Eles têm consciência de que não há preferência por um ou por outro. Nós tratamos todos os governadores com a mesma, eu diria assim, a mesma aproximação republicana. Tenho tido boas relações com o governador Alckmin, com o governador Anastasia, já tinha com o governador de Alagoas, com o Teotônio, enfim, com a governadora do DEM, a Rosalba Ciarlini.
Nós, na atividade de Presidenta e governadores, governadoras, temos de ter essa capacidade imensa de dialogar e de resolver o problema, o problema do estado dele é meu. Como é que o problema de São Paulo não é meu? Como é que o problema de Minas não é meu? É tão meu quanto é o problema de Pernambuco e do Rio Grande do Sul. Eu não posso olhar para os governos e achar que eles são uma coisa e eu sou outra.
O que eles estão fazendo?
Ministra Helena Chagas: Acho que já é a sua outra solenidade...
Jornalista: Posso fazer só uma última...
Presidenta: E eu tive também muito prazer em conversar com o presidente Fernando Henrique Cardoso, sem nenhum problema.
Jornalista: Presidente, só mais uma perguntinha. É sobre...
Jornalista: E o livro?
Presidenta: Ah o livro.
Ministra Helena Chagas: Ela não leu ainda.
Presidenta: Eu vou te dizer: eu não li porque ela sabe que eu não li.
Ministra Helena Chagas: Ela não leu ainda.
Presidenta: Eu não li o meu...
Jornalista: Não leu o livro e (incompreensível) ainda.
Presidenta: ...o sobre mim. E, aliás, aquele livro, eu não dei depoimento sobre ele, não. Eu já disse para o Ricardo: você esclarece porque eu não... nunca falei com ele sobre o livro.
Jornalista: Uma biografia autorizada.
Presidenta: Nunca li.
Jornalista: (incompreensível)
Ministra Helena Chagas: A gente sabe, mas ela não leu.
Presidenta: Eu sei, meu querido, eu não li.
Ministra Helena Chagas: Ela não leu.
Presidenta: Eu não li.
Ministra Helena Chagas: Ela não leu.
Presidenta: Eu não li o meu.
Jornalista: (incompreensível)
Ministra Helena Chagas: Sem ler não dá para saber.
Presidenta: Olha, eu não vou falar sobre uma coisa dessas. Eu acho... acho que essa questão de CPI se faz em caso extremo. Eu não tenho a menor ideia do que se trata.
Ministra Helena Chagas: Não tem elementos.
Presidenta: E não vou poder julgar isso. Não vejo como eu podia me manifestar aqui para ti. Eu estou te dizendo, eu não li. Ao que eu saiba, ao que eu saiba, alguém me disse que não encontra o tal do livro.
Jornalista: Presidente, como é que a senhora avalia essa troca...
Ministra Helena Chagas: Ela tem que ir lá para o Brasil sem Miséria agora, gente.
Jornalista: É só mais uma perguntinha.
Presidenta: Que caso extremo?
Jornalista: A senhora falou CPI só em caso extremo. (incompreensível)
Presidenta: Mas como é que eu vou saber?
Jornalista: (incompreensível)
Presidenta: Não, eu só vou dar os nomes da Comissão da Verdade no dia de dar os nomes da Comissão da Verdade. Dou todos para você.
Jornalista: Presidente, é só uma última perguntinha. Esse...
Jornalista: (incompreensível)
Jornalista: Presidente, só mais uma perguntinha.
Ministra Helena Chagas: Gente, não vamos tumultuar. Ela precisa ir para o Brasil sem Miséria. Então vamos fazer mais uma pergunta, ok?
Jornalista: Presidente, houve uma troca recorde de ministros este ano. Eu queria saber como a senhora avalia esse momento de desgaste. Se foi um momento de desgaste para a senhora, principalmente em ministérios tão importantes, onde houve uma certa paralisação durante algum tempo de crise, como o Ministério do Esporte, onde tem tanta obra importante para a Copa, enfim, tantos projetos urgentes.
Presidenta: Olha, eu vou te dizer o seguinte. Foi um momento, eu vou te dizer, assim, com sinceridade: de dificuldade. Não acho que foi momento de desgaste. Eu acho que é o do ofício da Presidência ter de tomar medidas duras. Lamento porque muitos dos ministros que saíram eram pessoas que eu considerava muito capazes. Então, eu lamento, em alguns casos, as perdas. Mas não tem como te dizer, de desgaste. Acho que o governo superou isso de uma forma... você não está perguntando pessoalmente, eu suponho. Você está perguntando... Para mim, o governo superou sem problema.
Jornalista: E o Pimentel, Presidenta?
Presidenta: O Pimentel...
Jornalista: Dois pesos e duas medidas?
Presidenta: Não, não são dois pesos e duas medidas. O Pimentel não tem nada a ver com o meu governo, nada a ver o que estão acusando ele com o meu governo. Nada.
Jornalista: O Palocci também era uma coisa (incompreensível)
Presidenta: Mas o Palocci quis sair...
Ministra Helena Chagas: Obrigada, gente.
Ouça a íntegra da entrevista (1h07min11s) da Presidenta Dilma