16-11-2014 - Entrevista concedida pela Presidenta da República, Dilma Rousseff, após Sessão Plenária da Cúpula do G20 - Brisbane-Austrália
Brisbane-Austrália, 16 de novembro de 2014
Presidenta: Por quê? Você achou o coala eficiente? Bonitinho, eficiente, não. Bonitinho ele é.
Jornalista: Podemos perguntar?
Presidenta: Não, agora eu vou só falar um pouquinho, né? Deixa eu falar um pouquinho. Eu acredito que essa reunião do G20 foi uma reunião importante no sentido de definir os próximos passos. Principalmente porque todos nós consideramos, dentro da reunião, que havia... que teria havido uma frustração do crescimento. Se esperava, no início do ano, um crescimento mais robusto, e esse crescimento não se verificou da forma como a gente esperava. E, tanto no que se refere à Europa, como ao resto do mundo, uma série de problemas decorrentes do baixo crescimento apareceram e, basicamente, o que se verifica é que o emprego continua sendo um dos principais problemas, tanto econômicos como sociais, em todas as economias desenvolvidas da Europa e, também, em outros países do mundo, principalmente, já na Ásia e também na própria América Latina. O Brasil ainda mantém uma taxa elevada de emprego e esperamos que os próximos anos, para todos os países do mundo, seja mais propício ao crescimento do que tem sido até então.
Nós também avaliamos bastante alguns dos aspectos do comércio internacional. É uma preocupação clara do G20 a discussão sobre o que o comércio bilateral e também o plurilateral, ele não substitui a necessidade de uma rodada mais compreensiva que a Rodada de Doha. A Rodada de Doha, ela deve voltar à mesa com um plano de trabalho mais sistemático, uma vez que um dos seus obstáculos, que foi o acordo entre os Estados Unidos e a Índia, foi superado. Pelo menos é o que tudo indica. Então nós esperamos que isso seja também um elemento de estímulo e de garantia de um nível mais elevado da atividade econômica decorrente da possibilidade de você destravar o comércio internacional.
Uma outra questão que foi também muito discutida é a questão do Fundo Monetário, da reforma do Fundo Monetário Internacional que, como todos vocês aqui sabem, havia sido decidida e que teria de ser cumprida até 2010, que seria reconsiderar a correlação de forças internacional e dar mais peso aos países em desenvolvimento - os países até aqui estão representados no G20 - dentro do Fundo Monetário. Seria a reforma das cotas, basicamente. O que ficou claro é que, se não houver saída, ou seja, se não for aprovada essa reforma no âmbito de todos os membros, aí no caso dos Estados Unidos, nós procuraremos, os ministros da Fazenda do G20 vão procurar solução alternativas para que tanto a 14ª como a 15ª rodada sejam efetivadas de forma a garantir que essa nova correlação de forças que emerge do mundo atual se reflita na relação com o fundo monetário.
Além disso, nós definimos a necessidade de acesso universal à energia - isso, inclusive, está nas declarações - a custos acessíveis. No caso do Brasil, nós estamos, em termos de energia elétrica, em uma situação bastante razoável porque hoje nós temos mais que 99% da nossa população atendida por energia elétrica e, portanto, em termos de universalização, nós universalizamos. Isso não significa que o 0,6 que faltam não têm de ser atendidos, pelo contrário. Mas são populações que vivem em situações mais distantes de todo o Sistema Interligado Nacional e, portanto, terão de ser atendidas, por exemplo, no nosso caso, com energias alternativas. No caso do resto do mundo e dos países do G20, você tem casos mais extremos no caso, por exemplo, da Índia, da própria China, você tem ainda grandes espaços não universalizados. Mas essa é uma questão fundamental.
Um outro fato é que nós definimos a importância também do G20 tratar da educação como sendo não apenas uma questão social, mas uma questão econômica fundamental, a educação principalmente como forma de inclusão social, mas também como forma de difusão do progresso em toda a sociedade.
Por último, eu queria dizer para vocês que essa reunião do G20, ela teve uma característica que foi, eu acredito, diferenciada, que foi o fato de uma preocupação grande com os processos de universalização. De levar as questões principais dentro de uma ótica de universalizar. No caso energia, no caso também - eu acho fundamental - educação. E isso, do ponto de vista, eu acredito, da economia, também é uma grande vantagem. Nós não podemos achar que economia não tem esse componente social, pelo contrário. Acho que uma das coisas que o Brasil aprendeu é que economia, também, ela precisa de uma certa difusão não só, por exemplo, da universalização da luz, da água e de vários outros serviços, mas também da universalização da educação e da educação de qualidade. Isso eu acho que é um aprendizado que nós tivemos no nosso próprio país.
Agora, algumas perguntas, jovens.
Jornalista: Presidente, a minha memória, que é de bastante longo alcance, não registra um escândalo tão incrível como esse que está acontecendo no Brasil envolvendo a Petrobras, principalmente pelo fato de que estão sendo presos não apenas supostos corruptos, mas também supostos corruptores do setor privado, dos quais notórios financiadores de campanhas eleitorais, de vários partidos, inclusive do seu partido. Gostaria que a senhora avaliasse um pouquinho qual é o impacto que isso pode ter sobre o seu governo e sobre a sua própria pessoa, já que foi presidente do Conselho de Administração da Petrobras.
Presidenta: Olha, eu quero te dizer que eu acredito que a grande diferença dessa questão é o fato dela estar sendo colocada à luz do sol. Por quê? Porque esse não é, de fato, eu tenho certeza disso, o primeiro escândalo. Agora, ele é o primeiro escândalo investigado, o que é diferente. Isso eu acho que mudará para sempre as relações entre a sociedade brasileira, o Estado brasileiro e as empresas privadas. O fato de nós, neste momento, estarmos com isso de forma absolutamente aberta, sendo investigado, é um diferencial imenso. Você não vai acreditar, não é, que nós tivemos o primeiro escândalo da nossa história. Nós tivemos o primeiro escândalo da nossa história investigado. Há aí uma diferença substantiva e eu acho que isso pode de fato mudar o país para sempre. Em que sentido? No sentido que vai se acabar com a impunidade. Essa é, para mim, a característica principal dessa investigação. É mostrar que ela não é algo engavetável. Agora, a gente tem de ter cuidado porque nem todas as investigações a gente pode dar como concluídas. Então, não pode se sair por aí já condenando A, B, C ou D. Agora, que ela é uma investigação que vai, necessariamente, colocar à luz do sol todos os processos de alteração, e mais que alteração, todos os processos de corrupção ou, inclusive, de uso internacional de algumas atividades, ela vai. Isso ela vai. Agora, ela não é a primeira não, viu, Clóvis? Ela é uma das muitas que ocorreram no Brasil e que nunca foram investigadas. Essa, talvez, seja a grande diferença dela. Ela está sendo investigada.
Jornalista: Considerando justamente esse problema que existe em empresa privada, a senhora pensa em fazer, mandar fazer alguma revisão de contratos do governo federal? Essa é apenas a primeira de um conjunto de questões. E também se a senhora assume alguma responsabilidade política nesse caso na Petrobras, visto que a senhora foi uma pessoa importante no comando dela durante um bom tempo. E também, eu gostaria de perguntar para completar a questão, se a senhora considera necessário algum plano de blindagem da Petrobras em um momento, visto que, inclusive, fundos de pensão americanos, que têm problemas de restrição de governança, estão examinando se, legalmente, podem continuar a ter papéis da Petrobras em suas carteiras.
Presidenta: Veja bem: não é, eu te diria, monopólio da Petrobras ter processos de corrupção. Eu quero te lembrar que um dos grandes escândalos de corrupção investigados - porque os não investigados, eu já não posso falar - mas investigados no mundo, foi o da Enron, e a Enron era uma empresa privada. Então, não é monopólio da Petrobras estar sendo investigada por processos internos de corrupção. Nem todos… aliás, a maioria absoluta, quase, dos membros da Petrobras, dos funcionários, não é corrupta. Agora, tem, foi integrada, tem pessoas que praticaram atos de corrupção dentro da Petrobras. Então, não se pode pegar a Petrobras e condenar a empresa. O que nós temos de condenar são pessoas. Pessoas dos dois lados: os corruptos e os corruptores. Eu acredito que a questão da Petrobras é uma questão simbólica para o Brasil. Acho que é a primeira investigação efetiva sobre corrupção no Brasil que envolve segmentos privados e públicos. A primeira. E que vai a fundo. Agora, nós podemos listar uma quantidade imensa de escândalos no Brasil que não foram levados a efeito. E, talvez, sejam esses escândalos que não foram investigados, que são responsáveis pelo que aconteceu na Petrobras.
O fato de que você tenha dentro da Petrobras uma quantidade “x” de pessoas que cometeram atos de corrupção não significa que todos os atos da Petrobras sejam praticados por corruptos. Essa é uma conclusão incorreta. Investigar significa… o que significa investigar? Investigar significa atribuir responsabilidades por quem praticou atos ilícitos. Quem praticou atos ilícitos vai ter de ser punido. Agora, não se pode responsabilizar todos, inclusive, os que não praticaram. Isso não seria correto e, pelo contrário, levaria a algo que beneficiaria os corruptos qual seja a impunidade deles, na medida que você não tipifica culpa. A culpa tem de ser tipificada e identificada para ela poder ser, de fato, considerada culpa pela lei brasileira ou pela lei de qualquer país. Não há culpa genérica, há culpa concreta. A prática de determinado ato implica em determinado crime. A pratica de determinado crime implica na punição de determinado crime.
Jornalista: Presidente, desculpa, mas só para (incompreensível) responder a minha pergunta, se a senhora vai ou não fazer um raio-x desses contratos...
Presidenta: Já estão sendo feitos.
Jornalista: Já estão sendo feitos?
Presidenta: Sim, dentro da Petrobras…
Jornalista: Não, fora da Petrobras. Eu imagino que tenham também casos fora da Petrobras
Presidenta: Você quer saber se eu vou fazer para trás também?
Jornalista: Para trás, acho que são os contratos que foram feitos...
Presidenta:: Os da Petrobras? Não isso é um absurdo, eu fazer uma raio x de todas as companhias para trás, não tem como fazer isso. Nós temos de apurar, não se pode achar que todo mundo cometeu delito, isso não ocorre, não é assim que a Justiça age. Você para achar que alguém cometeu delito, você tem de ter indícios de delito. Os indícios de delito são na Petrobras, não vou sair por aí procurando em todas as empresas. Agora, acredito que terá que ser visto o que aconteceu antes também na Petrobras.
Jornalista: Presidente, nas questões aí do G20, mudando de assunto para economia, falou-se sobre a possibilidade de medidas de curto prazo para tentar acabar com essa frustração com o crescimento. Diante disso, eu que queria saber da senhora quais medidas o governo brasileiro pode tomar para a retomada do crescimento no país? E se… há um debate em Brasília, inclusive, o ministro Mercadante citou a possibilidade de cortes. Então eu gostaria de saber: quais áreas terão cortes? Fala-se também na volta da Cide, se isso pode acontecer de fato e se não poderia frustrar, no Brasil, o processo de crescimento.
Presidenta:: Não, eu acredito que são duas coisas distintas. Eu não acho que é porque você consegue recuperar uma economia sem ter uma política que foque na demanda, você não pode achar que com restrição a economia se recupera. Agora, você tem de selecionar aquilo que pode ser capaz de te dar maior nível de investimento e, portanto, maior capacidade de recuperação. O que o Mercadante deve ter dito é o seguinte: nós vamos fazer ajustes. Nem todos os ajustes são pelo lado de cortar demanda. Os nossos ajustes, alguns deles são, inclusive, reduzindo despesas que nós não achamos que sejam, eu te diria assim, legítimas. Legítimas no seguinte sentido, por exemplo, dando um exemplo: você tem no Brasil um conjunto de gastos e de despesas que não levam, necessariamente, à ampliação do investimento, nem à ampliação do consumo. Essas despesas que não levam à ampliação do investimento e do consumo são aquelas que nós consideramos que podem ser cortadas.
Então eu te dei, assim, um exemplo simples. E temos outra despesas que nós temos de olhar porque elas são excessivas. Então em todos os processos, não só nesses, mas em todos os processos, você tem de procurar fazer um ajuste, nós vamos fazer um ajuste. Mas nós não defendemos que a melhor política seja a restrição da demanda como forma de sair da crise. Não é. E isso está provado na própria União Europeia.
Jornalista: Os cortes não atingiriam a demanda, seriam…
Presidenta:: A demanda de investimento, ela não vai atingir a demanda de investimento.
Jornalista: Haverá… a senhora vai alterar a Cide, isso volta de fato a ser viável?
Presidenta:: A Cide? Mas da onde saiu essa questão?
Jornalista: Essa é a informação em Brasília, de que a Cide poderia voltar. Como uma forma de ajudar na arrecadação de impostos.
Presidenta:: A Cide? Não, não levantei essa… não conheço essa possibilidade. Brasília tem hora que passa ao largo.
Jornalista: Mas é onde a senhora vive atualmente…
Presidenta: Meu querido, mas acontece que eu acho que vocês são muito criativos. Eu não discuti criação da Cide com ninguém. Eu não discuti. Pode ter alguém interessado na criação da Cide, não é? E deve ter muita gente interessada na criação da Cide. Eu não estou dizendo que nunca se vai criar a Cide, mas isso não está na nossa pauta.
Jornalista: Presidente, Márcio Gomes, da TV Globo. Quando nós saímos do Brasil, a expectativa era a reforma ministerial. Veio esse escândalo da Petrobras. De alguma forma ele influenciou ou de alguma forma atrapalhou essa reforma? Seja por uma possível perda de apoio político no Congresso, ou seja porque alguém indicado pode estar envolvido, no futuro, nessa denúncia, nessa questão?
Presidenta: Não. Nas duas hipóteses, a resposta é não. Nas duas, tanto na pergunta se alguém que estava dentro da nossa cogitação está envolvido, não. Nós não…. não são pessoas que possam estar envolvidas que nós cogitamos. Nem tampouco a outra hipótese que você levantou.
Jornalista: Perder apoio no Congresso?
Presidenta: É. Nós não temos… você há de convir que essa questão da Petrobras, ela tem tido, ela já tem, assim, um certo tempo. Então, nós… nada disso é tão estranho para nós. Nós não sabíamos as pessoas concretas, mas a investigação, nós sabemos dela. Nós temos conhecimento da investigação.
Jornalista: Presidente, Sérgio (incompreensível), do SBT. Eu queria fazer uma pergunta sobre política internacional, o ministro das Relações Exteriores da Ucrânia cobrou mais apoio do Brasil em relação ao que acontece no Leste do país. Sabe da parceria estratégica do Brasil com a Rússia. Há também a questão…
Presidenta: Que apoio que ele pede?
Jornalista: Ele pede o apoio da senhora em relação à intervenção da Rússia no Leste da Ucrânia. Ele pede uma posição mais clara do Brasil, que, segundo ele, não é clara. Eu aproveito para perguntar para a senhora: qual é a posição do Brasil no que acontece na Ucrânia, nesse momento, levando-se em conta nossa parceria estratégica importante com a Rússia.
Presidenta:: Olha, o Brasil, no caso da Ucrânia, não tem, nunca definiu uma posição. Nós nunca nos manifestamos, nem... e evitamos sistematicamente nos envolver em assuntos internos. Lamento que eles tenham pedido isso, mas não é do interesse do governo brasileiro se manifestar a respeito de qualquer problema dentro da Ucrânia. Não é do nosso interesse. Nem de um lado, nem do outro.
Jornalista: A senhora considera...
Presidenta: Por exemplo: a queda do avião. a queda do Avião ninguém sabe direito o que aconteceu com aquele avião, ninguém sabe.
Jornalista: Todas as evidências apontam para os rebeldes que estão armados pelos russos, né? As evidências apontam isso.
Presidenta: Não é verdade. Não é verdade. Nem precisa de dizer, é só você dar uma perguntadinha por aí…
Jornalista: Eu estive lá, presidente. Eu estive lá.
Presidente: Pois é, você pode olhar… depende com quem que você conversa, mas no geral, a compreensão é que ninguém sabe. No geral. Por exemplo, dentro do G20, ninguém arrisca uma posição. Não há indícios tangíveis. A maioria do G20 não… o G20 não fala isso.
Jornalista: Estados Unidos, Reino Unido, França, Canadá…
Jornalista: Exatamente, presidente, ninguém… exatamente.
Presidenta: Pois é, mas veja bem. Ele está la em cima sentado. Não houve, dentro do G20, nenhuma cobrança de nada nesse sentido.
Jornalista:Presidente, a minha pergunta é sobre o Obama, lá da conversa que a senhora teve com ele, mas só para voltar um pouco sobre a reforma ministerial, foram 15 ministros que deixaram o cargo à disposição...
Presidenta: Não, são todos os ministros…
Jornalista: Não, mas foram 15…
Presidenta: Não, não são todos. É, eles combinaram.
Jornalista: Queria que a senhora, para terminar, falasse um pouco sobre isso. A senhora se sente mais à vontade...
Presidenta: Não, eu não me sinto mais a vontade, nem menos. Eu acho que é um gesto elegante dos ministros porque não é necessário o ministro colocar o cargo à minha disposição, ele está sempre à minha disposição. Essa é a regra do jogo em qualquer país presidencialista.
Jornalista:Alguns podem continuar?
Presidenta: Eu não vou entrar nisso agora, nesta questão. Eu não vou falar sobre a minha reforma ministerial.
Jornalista: Esse ano, até o final do ano não haverá novidades? ...
Presidenta: Não vou dizer isso para você.
Jornalista: Tá bom, presidente, então sobre o Barack Obama, a gente pode chamar de… foi uma reunião bilateral, foi um encontro, foi uma conversa rápida, de que forma foi e se isso ajudou a resolver aquele episódio…
Presidenta: Olha, foi uma conversa bastante informal, não houve, vamos dizer assim, uma discussão sistemática. Nós estamos fazendo tratativas aí, fora dessa reunião aqui, nós estamos fazendo tratativas entre o nosso ministro das Relações Exteriores, o Ministério das Relações Exteriores e o equivalente americano no sentido de estudar uma volta, uma ida minha aos Estados Unidos. Agora, nada ainda foi tratado definitivamente. Você há de convir que eles acabaram de sair de uma eleição. Agora, não é? Então, a discussão foi uma discussão bem mais… a discussão mais forte foi até pelo telefone.
Jornalista: E só para terminar, o ponto mais importante para o Brasil no G20, em resumo, qual foi? Foi a conversa que a senhora teve com o presidente chinês? Liberação da carne?
Presidenta: Olha, eu acho que o G20, como um todo, dessa vez foi muito interessante no seguinte sentido: acho que o G20 percebeu - nós todos - percebemos que há que fazer um esforço maior pela retomada. A retomada econômica. Que todos nós temos de fazer, cada um de nós, a nossa parte. Por quê? O que tem acontecido são tempos diferentes de recuperação. Então, por exemplo, todos os países emergentes tiveram uma situação melhor durante quatro anos, vamos dizer assim: oito, nove, dez, onze. E resistiram à crise, todos nós resistimos à crise nesse período. Até que ela atinge, de uma forma ou de outra, todos nós também. A China, por uma redução muito significativa do crescimento. O Brasil, idem. A Rússia também. A África do Sul também. A Índia, um ano pior, outro ano melhor. Então, o que é a realidade é a seguinte: nós temos de ter uma ação concertada no sentido de recuperar as condições de crescimento. É essa, eu te diria assim, a convicção maior. A ação tem de ser concertada entre todos nós. E aí é muito importante, é óbvio que é importante, que a economia americana e o próprio Reino Unido - mais a economia americana, que dá efeitos mais globais, não é? - tenha agora uma visão de… uma perspectiva de uma recuperação maior. Mas, tudo se passa como se fosse meio de lado, o crescimento. Então, o que nós precisamos é de um esforço concentrado. E, dessa vez, ficou mais claro dentro do G20 que você tem de atuar do lado da demanda. Tem de atuar do lado da demanda. Nós temos uma situação de baixo desequilíbrio porque nós não temos uma dívida bruta, sobre o PIB, elevada, nem uma dívida líquida, sobre o PIB, elevada. Nós, em relação à situação dos demais países, por exemplo, europeus, que têm uma dívida bruta e uma dívida líquida elevada, nós temos uma situação diferenciada. Mas nós precisamos dessa recuperação de todos para ser uma recuperação mais robusta, porque senão ela vira aquele voo de ganso, não é? É de galinha? Ganso voa maior. Um voo de galinha.
Jornalista: Presidente, Débora Berlinck, do Globo
Presidenta: Você está boa?
Jornalista: Tudo bem! E a senhora?
Presidenta: Também.
Jornalista: Como é que a senhora responderia às pessoas que estão saindo na rua, no Rio, pedindo seu impeachment ou ainda uma intervenção militar? Essa é minha primeira pergunta. Segunda, a gente tem uma situação hoje com a cúpula das maiores empreiteiras do país na prisão. A dimensão desse escândalo chocou a senhora?
Presidenta: Posso te falar uma coisa? Eu acho que a gente tem de acostumar nem uma coisa, nem outra. Nosso país é um país, hoje, democrático. Nós não… o Brasil não se abala por um escândalo. Nós temos hoje uma opção democrática consolidada. Nós não somos um país que chegou ontem à democracia. Então, as manifestações - respondendo a sua primeira pergunta - eu não concordo com o teor das manifestações. Mas com a manifestação em si, eu não tenho nada contra, nem a favor. O Brasil tem espaço para ter manifestação que for, mesmo uma que signifique a volta do golpe. Mesmo uma assim. Por quê? Porque nós somos hoje, de fato, um país democrático. Então, reconhecer isso é entender que faz parte da nossa história, hoje, sermos capazes de tolerar, inclusive, as manifestações mais extremadas. Faz parte. O que acontece em países democráticos. Ele absorve. E eu acho que processa até propostas mais intolerantes. O Brasil, hoje, tem essa capacidade, ele processa. Absorve e processa. Então eu vejo isso dentro de um quadro democrático que nós atingimos. A segunda era?
Jornalista: Se a senhora se choca ou se chocou com a dimensão desse escândalo. Nós temos a cúpula das grandes empreiteiras do país na prisão hoje.
Presidenta: Olha, eu não acho que nem toda a Petrobras, nem todas as empreiteiras. Eu não acho que também dá para demonizar as empreiteiras desse país. São grandes empresas e, sim, A, B, C ou D praticaram mal feitos, atos de corrupção etc, ou de corromper. Eu acho que eles pagarão por isso. Agora, isso não significa que a gente vai pegar e colocar um carimbo na empresa. Não se faz isso. Tratar de forma, eu diria assim, dentro da normalidade democrática, um caso desses é o nosso teste também. É sabermos que nem todos são culpados e que não dá para pegar e estender a culpa de uns para todos, não dá para fazer isso. Agora, a culpa vai ter de ser individualizada em todos os casos. É essa uma das características da Justiça no nosso país. Nós vamos ter de julgar indivíduo, nós não vamos julgar a empresa x, y ou z. A não ser que ela seja 100% indiciada, o que não é o caso.
Jornalista: Então a senhora vai continuar trabalhando com cada uma dessas empresas?
Presidenta: Óbvio, óbvio. A não ser que se prove o contrário. Senão seria um caso de, eu diria, de tomar um culpado por todos. Não se trata disso, não? Nós não podemos fazer isso, porque isso leva ao oposto. Qual é o oposto? Parar de investigar, o que nós não queremos. Nós queremos ser um país que seja capaz de investigar e punir aqueles que são culpados. E que crie um ambiente que é fundamental para nós. Que ambiente? Um ambiente em que a coisa pública, e mesmo a privada, seja respeitada dentro das regras vigentes que nós adotamos. É isso que nós queremos. Nós queremos punir os culpados. Mas não podemos deixar que ao punir o culpados, se puna o inocente. Temos de punir o culpado e o inocente não.
Beijo para vocês.
Ouça a integra da entrevista (31min45s) da Presidenta Dilma Rousseff