Você está aqui: Página Inicial > Presidência > Ex-Presidentes > Dilma Rousseff > Entrevistas Presidenta > 10-08-2011 - Entrevista exclusiva concedida pela Presidenta da República, Dilma Rousseff, à revista Carta Capital - Brasília/DF

10-08-2011 - Entrevista exclusiva concedida pela Presidenta da República, Dilma Rousseff, à revista Carta Capital - Brasília/DF

Em entrevista exclusiva aos jornalistas Mino Carta, Sérgio Lírio e Luiz Gonzaga Belluzzo, da revista Carta Capital, publicada na edição do dia 28 de agosto de 2011, presidenta Dilma esclarece que as obras da Copa do Mundo são um legado para o país, e responde a diversas perguntas sobre o governo

Palácio do Planalto, 10 de agosto de 2011

 

Mino Carta: Não, mas olha, eu queria até começar por aí, porque quando você tomou posse houve um certo movimento a favor, da mídia em geral, não é? Que a gente notou, com muita visibilidade, todo mundo observou isso. Era também... parecia, a nós, pelo menos, parecia muito claro o motivo desse apreço súbito. Era a mesma mídia que tinha espezinhado o Lula e que, de repente, teria adorado que você se afastasse desse antecessor importante.

Hoje a gente nota que a mídia está querendo criar problemas, que ela se esforça, implacavelmente, para criar problemas, diários, se possível. Quem sabe, duas vezes por dia. Essa impressão que a gente tem corresponde à realidade?

Presidenta: Sabe o que é? Eu acho que a relação do governo com a imprensa é uma relação muito complicada, no Brasil. Tem hora que me parece... eu vou te falar em que nível que eu acho que é complicado. Essa crise, por exemplo, essa manifestação mais aguda da crise que já se avizinhava. Ela tem mais de meses, ela não é recente. Você começa a sentir um processo... que tem um processo de deterioração nas condições de recuperação mais... que a Europa entrou numa trajetória crítica há mais tempo. Então, o que eu acho que é complicado no Brasil? É que os problemas reais, eles perdem espaço para problemas que não são os mais reais. Isso é muito ruim. Por quê? Há uma tendência de as pessoas se importarem mais pelo espetáculo do que pela realidade cotidiana das coisas, o que é normal. Talvez seja por isso, inclusive, que a gente... todos nós gostamos de folhetim, não é? Também não posso ficar reclamando. De fato, o acessório, tem hora que é mais interessante. Agora, essa relação, eu acho que ela não pode... eu não sei se ela não é assim em todos os governos. Eu desconfio que...

Mino Carta: Em todos os governos do Brasil ou do mundo?

Presidenta: Não, do mundo. Você tem uma relação contraditória com a mídia. Você veja que isso ocorre, por exemplo, nos Estados Unidos entre a Fox e o Obama. Ocorre... Você tem uma coisa horrorosa que é o News of the World, na Inglaterra. Não acho que é só aqui no Brasil que tem essa relação mais complicada. Agora, eu não acho que hoje eu tenha o mesmo tom em todos os jornais. Tem um jornal que, às vezes... tem grupos de mídia que às vezes estão mais suscetíveis a encarar as transformações por que o Brasil está passando e tem outros que estão menos suscetíveis. Ou porque seus interesses não estão representados, ou porque... sei lá porquê.

Mino Carta: Não, sem dúvida.

Presidenta: Agora, isso eu não vejo... sabe... Eu não acho que a gente pode ficar sendo pautado por isso.

Mino Carta: Não, é hipócrita.

Presidenta: Se eu tivesse chegado no governo...

Mino Carta: Então insiste nesse ponto: ser pautada por isso...

Presidenta: Se eu tivesse chegado no governo em janeiro... eu cheguei no governo em janeiro como Presidente, você sabe. É diferente? É. Mas a experiência que eu tive no governo antes... eu convivi com isso durante os oito anos que eu estive no governo, uma parte menor, como ministra de Energia; e outra parte maior, como Casa Civil. Então, eu consigo perfeitamente tocar aquilo que é prioritário para o governo, e não aquilo que parece ser prioritário para outros segmentos. Então, não ser pautada pela mídia, é isso. Não é não dar importância ao que falam. Eu dou importância e tenho obrigação de responder, e levar em consideração, perfeitamente. Agora, não fazer com que o meu tempo, que é um tempo político, seja investido nisso, porque a administração do tempo no governo é uma questão estratégica. “Não ser pautado” significa que o meu tempo político não pode ser gasto com isso. Eu tenho que gastar meu tempo político tratando dos assuntos que envolvem problemas do país.

Sérgio Lirio: Mas Presidenta - desculpe interromper - mas o fato de a senhora ter feito demissões no Ministério dos Transportes a partir de denúncias que saíram na imprensa, e isso ter acontecido agora... (incompreensível) demitir mais um. O Secretário Executivo do Ministério da Agricultura também sai, depois de denúncias na imprensa. A sensação que se tem é que no último mês, pelo menos, o governo passou a reagir a uma pauta da imprensa, ou não?

Presidenta: Olha, eu acho que nós, principalmente, afastamos as pessoas para podermos investigar quando achamos que o caso era grave. Obviamente, aquelas pessoas que não se afastaram... falam de muitas pessoas, e elas não se afastam, elas permanecem porque elas estão convictas da sua inocência. Essa é a primeira hipótese. E também, a hipótese também de as pessoas se afastarem porque tem um nível de devassa na sua vida pessoal, que muitos não aguentam e nem suportam, porque cada um tem uma reação diante de uma exposição, de uma superexposição. Na verdade, eu não acho que nós fomos pautados pela mídia em nenhum desses casos. Acho que nem no caso dos Transportes, nem no caso da Agricultura, nem em qualquer outro caso que porventura ocorra, nós temos o princípio de ficar julgando as pessoas, fazendo com que elas provem que não são culpadas. Nós somos a favor daquele princípio – eu acho que é da Revolução Francesa –, que é muito civilizado: agora você tem de provar que a pessoa é culpada.

Mino Carta: É do (incompreensível).

Presidenta: Eu acho que é da Revolução Francesa.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Não, isso está na Declaração dos Direitos do Homem, da Revolução Francesa.

Presidenta: Sim, é... Sabe por quê?

Luiz Gonzaga Belluzzo: (incompreensível) “nullun crimen, nulla poena sine lege”, quer dizer, você não pode incorrer numa pena nem acusar de crime sem...

Presidenta: Sem ter uma...

Luiz Gonzaga Belluzzo:... sem ter uma (incompreensível)

Presidenta: ... especificando que é crime.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Isso foi avançando, não é?

Presidenta: Agora, na verdade, eu acho que é mais uma reação contra a Idade Média, não é, quando você tinha de provar a inocência, suportando torturas.

Jornalista: Ou provar que era (incompreensível).

Presidenta: É, eu acho que é uma reação contra isso.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Certo.

Presidenta: Então, eu sou a favor, fundamentalmente, disso. Agora, não, também não acho que o governo tem de abraçar processo de corrupção. E sabe por quê? Por razões éticas, mas, sobretudo, pelo seguinte fato: não é... é altamente ineficiente um governo que se deixa apreender por isso.

Jornalista: Presidente, eu...

Presidenta: É inadmissível, com o pouco dinheiro que nós temos, que a gente tenha vazamentos dessa ordem. Então, por uma questão não só de ética e de moral, mas também de eficiência.

Jornalista: Claro, sem dúvida.

Presidenta: Você é obrigado a tomar providência.

Mino Carta: Agora, eu estava pensando em algo que você falou há pouco. Eu acho que a mídia nativa é peculiar.

Presidenta: Você acha?

Mino Carta: Acho. Eu acho que existe o caso da Fox com o Obama, por exemplo...

Luiz Gonzaga Belluzzo: E o do News of the World

Presidenta: Sim, do News of the World eu acho mais estarrecedor.

Mino Carta: Não. Mais, mais.

Presidenta: Acho estarrecedor.

Mino Carta: Mas, veja, a mídia brasileira, o comportamento dela em relação aos dois mandatos do Lula foi algo inenarrável. Ele nunca acertou nada aos olhos da mídia brasileira, não é? Veja agora, por exemplo, no momento em que você nomeia Celso Amorim – que foi um grande chanceler, que implementou uma política ousada e, de certa forma, inédita na história do país –, e você o chama para o posto que era do Jobim, e O Estado, pelo menos, solta um editorial para dizer que eles consultaram altas patentes, que preferem, no entanto, manter no anonimato, que estão muito irritadas com essa sua nomeação. Isso porque o Jobim, realmente, é um sujeito... levou o Lula a Bagdá, e coisas desse tipo.

Presidenta: Sabe o que eu acho?

Mino Carta: Não são histórias estranhas, que mostram uma prevenção inicial?

Presidenta: Olha, pode até mostrar, mas é relevante?

Mino Carta: Não, eu não acho...

Presidenta: O meu problema é o seguinte: é relevante? A gente tem, rigorosamente, esse tipo de comentário, eu não me preocupo com ele porque eu acho irrelevante. Primeiro, porque nós não estamos na época... como é que se chamava? Chamava de... aquele pessoal que ia para os quartéis fazer a...

Luiz Gonzaga Belluzzo: Vivandeiras.

Presidenta: As vivandeiras. Nós não estamos mais na época das vivandeiras, não é? Então, o que é a realidade é o seguinte: as Forças Armadas são disciplinadas, hierárquicas e cumprem seus preceitos constitucionais, ou elas são subordinadas ao poder civil e isso será uma conquista da mídia... do governo, não. Uma conquista da sociedade brasileira. Isso é assim porque a sociedade brasileira evoluiu para isso. E mais, o ministro Celso Amorim – o ministro da Defesa, Celso Amorim...

Mino Carta: Colunista da Carta Capital...

Presidenta: ... é da confiança da Presidência da República que, enquanto for presidente da República, é comandante-em-chefe das Forças Armadas. Se há segmentos – ou da imprensa ou dos setores militares – absolutamente minoritários... não é, eu tenho certeza que não é essa a concepção de ninguém nas Forças Armadas, pelo menos...

Mino Carta: Nós também temos certeza.

Presidenta: ...na sua grande maioria...

Mino Carta: Nós também.

Presidenta: ...é absolutamente irrelevante, porque faz parte do passado, de uma visão atrasada da história. E também tem outra coisa que é muito grave no Brasil, que também está muito aquém da realidade, que é achar que alguém é insubstituível. As pessoas, elas têm de ter a humildade de perceber que elas não são insubstituíveis. A gente descobre isso quando criança, principalmente se você perde algum parente importante, como o pai ou a mãe, cedo, e você descobre como é que, apesar do amor imenso que você tinha, você consegue e vai ter de viver sem. Se isso é possível na relação humana, tudo é possível. E, além disso, nem na época da monarquia o rei era insubstituível. Por quê? Aquela história dos dois corpos do rei, não é? O corpo divino e o humano, daí o “morreu o rei, viva o rei”. Então, começar achando que eu acho que perpassa alguma dessas decisões é que alguém é insubstituível, ou que as Forças Armadas de hoje são aquelas de 30 anos atrás. Não são, porque o Brasil mudou e mudou para muito melhor. Então, eu não dou muita importância e acho irrelevante esse tipo de avaliação.

Mino Carta: Olha...

Presidenta: Não me...

Mino Carta: Achamos ótimo que você diga isso. Eu quero apenas dizer: a imprensa se esforça para apresentar uma versão e isso tem repercussão junto a uma classe média. Os moradores do meu prédio, por exemplo, que recebem...

Presidenta: Até quando, você acha?

Mino Carta: É por algum tempo ainda, não se sabe quando. Eu espero que pouquíssimo, mas eu gostaria que eles (incompreensível).

Presidenta: Você sabe que o tempo é senhor desses processos.

Mino Carta: Sim, sem dúvida, sempre...

Presidenta: Eu tenho certeza...

Mino Carta: (incompreensível)

Presidenta: Eu tenho certeza de que o ministro Celso Amorim vai demonstrar uma grande capacidade de gestão, vai levar à frente toda a nossa Política Nacional de Defesa e vai fortalecer as Forças Armadas, vai modernizar. Então, vamos discutir daqui a um ano, essa é a proposta que eu faço. Discutimos daqui a um ano. É que nem o governo. O que o governo... Eu aposto no tempo. Eu aposto que tudo o que nós estamos fazendo, e em que pesem todas as pautas e as discussões, que não são essas, eu aposto que vai amadurecer e, com o tempo, vai se mostrar extremamente benéfico para o Brasil e para a população. E aí eu jogo no tempo. Tem gente que joga no passado ou só no hoje. Eu jogo no hoje, mas eu jogo no futuro. É o que vai ser este país daqui para a frente. Eu jogo nisso.

Sérgio Lirio: Agora, a senhora falou em... quer dizer, citou aqui o fato de ninguém ser insubstituível. A senhora acha que...

Presidenta: Nem o rei, olha a fala: “morreu o rei, viva o rei”. Essa era uma ponte entre o corpo divino e o humano.

Sérgio Lirio: Que interpretação...

Presidenta: Ninguém, ninguém é insubstituível. Eu estou falando politicamente.

Sérgio Lirio: Mas qual a interpretação que a senhora faz desse comportamento do ministro Nelson Jobim nesses...

Presidenta: Ah, eu não faço uma interpretação. Isso também não é... é uma página virada, a gente não tem que ficar discutindo isso. Eu acho que isso é interessante para a mídia, mas para o governo isso não é.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Claro. Eu, aproveitando essa questão do tempo, o mundo está atravessando – não preciso nem dizer – tempos bicudos, digamos.

Presidenta: Bicudíssimos.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Bicudíssimos. E eu ouvi as suas declarações ontem, achei que, na verdade, há uma disposição... seja qual for o efeito da crise, porque a gente não é capaz de antecipar, e acho que a Presidente colocou muito bem que nós não podemos, na verdade, ter uma configuração clara dessa crise. Mas eu gostaria que a Presidente nos falasse da visão dela desse momento, como presidente de uma das economias mais importantes do mundo – nós somos hoje a sétima –, e a Presidente disse ontem que nós estávamos melhor preparados do que em 2008. Eu gostaria...

Presidenta: Eu também te leio, viu? Você me lê e eu te leio, então... Eu te ouço e você me ouve. Você me ouve e eu te leio, é, está certo. Eu concordo também com algumas coisas que você fala e acho muito pertinentes, mas de uma forma assim mais... menos sofisticada, afinal de contas, ele é o nosso eterno professor.

Mino Carta: É o nosso mestre.

Presidenta: Com certeza, professor. Sabe, eu acredito que nós vivemos num momento que ninguém da nossa geração imaginou viver. Essa, primeiro, eu acho que é a constatação mais, eu diria, sincera que eu posso fazer. Eu jamais pensei, na minha vida, que eu veria uma agência de risco rebaixar...

Jornalista: Os Estados Unidos.

Presidenta: ...os Estados Unidos. Fiquei perplexa. Primeiro, fiquei perplexa, olhando e achando que, de uma certa forma, tirante esse aspecto um tanto quanto irônico... e não acho que essa agência seja isenta de interesses, nem acho que o que ela fez seja muito responsável, nem muito fundamentado, porque não houve nenhuma grande alteração, a não ser uma alteração política, que permitisse que ela fizesse esse rebaixamento. Mas eu comecei por isso porque eu acho que isso é muito... indica muito o momento que o mundo vive, em que duas coisas são incontestáveis. Nós temos uma crise profunda, uma crise que todo mundo sabe que não se deve aos governos, que se deve a uma crise no mercado financeiro, à sua desregulamentação, ao fato de que eles tiveram... fizeram um processo de especulação e de desregulamentação que, isso, sim, é culpa dos governos, absolutamente... não só incontrolável, mas... mais do que incontrolável, com a aquiescência, com o incentivo dos governos. E eu estou falando isso porque ontem, por acaso, eu estava com dificuldade de dormir, e tornei a assistir aquele filme Inside [Inside Job], que eu adoro, que eu acho que todo mundo tinha de assistir...

Mino Carta: Eu falei isso esta semana.

Presidenta: ...porque (incompreensível), gente...

Ministra Helena Chagas: Não tem (incompreensível).

Presidenta: ...os depoimentos a respeito do descontrole, do absoluto descontrole ficam muito patentes. Bom, e diante disso, em vez de tomar as medidas cabíveis, no sentido de retomar as condições de crescimento, encheram os bancos de dinheiro outra vez, mantiveram a desregulamentação, continuaram com o processo do descontrole. Agora ele aparece de forma muito forte na União Europeia. Então, duas coisas eu acho que estão acontecendo, e é que tem duas utopias que estão sendo apresentadas como possíveis. A primeira utopia é a americana, são os republicanos que acham que é possível sair de uma das maiores crises, que não tem raiz nos gastos descontrolados do Obama, como querem fazer crer. Tem raiz no descontrole financeiro do segmento privado lá nos Estados Unidos e em todas as políticas de subprime, de desregulamentação, que foram feitas sistematicamente...

Jornalista: Redução de impostos...

Presidenta: ... e uma tese, que é a principal: é possível sair da crise cortando gastos e não aumentando impostos, é possível sair da crise diminuindo o papel do Estado. Na questão fiscal, eu acho que está escondido um sujeito oculto, que é o Estado, a possibilidade de o Estado ser reduzido a nada. Então, tem essa utopia, é a utopia republicana do Tea Party. Essa é a utopia principal do Tea Party: vender uma história impossível, impossível. Não só a conta não fecha – não é uma questão de conta –, mas você não recupera uma economia daquele jeito. E tem uma segunda utopia sendo vendida também lá na Europa, que é a seguinte: é possível a gente ter uma união monetária, em que a economia central ou as economias centrais se beneficiam de uma única moeda, estruturam o mercado, vendem seus produtos para esse mercado e não têm a menor responsabilidade fiscal com nenhum dos seus membros, quando eles entram em crise, também provocada pelo nível de empréstimo dos bancos privados. Também tem um sujeito oculto, que aí é o seguinte... Aí, é engraçado, é um Estado supranacional com uma política fiscal comum para socorrer os membros e não deixar, por exemplo, que a Grécia...

Mino Carta: Agora é a Itália.

Presidenta: ...não tenha...

Mino Carta: Agora é a Itália, não é?

Presidenta: Não, eu sei, mas no início era a Grécia.

Mino Carta: Ah, sim, claro.

Presidenta: Que a Grécia, por exemplo, não tem outra saída a não ser... ou matar seus velhinhos, que é ...

Mino Carta: Atirar do penhasco.

Presidenta: É, atirar do penhasco, que era o que acontecia antes; ou acaba na redução brutal dos salários e das pensões. Agora está lá a Itália... e na Espanha já é mais complexo o problema, porque está em questão aí... fica em questão a União Europeia. Aí tem uma discussão, que é a discussão que nós estamos vendo, que me dá a impressão, lendo os jornais europeus, que é muito pouco e muito tarde, que tanto no Fundo de Estabilização quanto na política do Banco Central europeu, é muito pouco dinheiro para resgatar o que tem que ser resgatado. E aí não é o governo grego só, não é o governo italiano, nem o governo espanhol, até porque alguns... o espanhol, por exemplo, tem uma situação de dívida muito tranquila. Aí o problema torna-se novamente a questão financeira, que não é encarada. Eu acredito que essas duas utopias são muito graves porque como disse o professor, é mais do mesmo e responder à crise com aquilo que a causou. Em vez de você mudar o roteiro ou a pauta, você responde com o que causou. Eu fico, nesse momento, interessada em entender isso, não por uma curiosidade acadêmica ou de qualquer aspecto, até porque eu não sou isso mais. Eu não sou acadêmica, nunca fui. Fui quando era aluna do Belluzzo (incompreensível) nessa época. Agora, eu acho que o Brasil tem de ter uma reação a essa situação.

Luiz Gonzaga Belluzzo: E qual? Qual seria?

Presidenta: Nós temos de, agora... todas as situações, elas são inusitadas, elas não são aquilo que ocorreu no passado. Esse momento agora não envolve 2008, 2009. Nós temos um problema sério, porque eles podem ir pro Quantitative Easing 3, e aí eles vão inundar este país de... não vai ter para onde ir, vai vir para os mercados existentes, que somos nós. Como disse a Ministra da Indústria argentina, um mercado apetecible. Nós somos apetecibles. Eu acho que o espanhol tem essa capacidade sonora, às vezes, de mostrar como apetecibles somos. Nós começamos, eu acho, a tentar uma política bastante clara, no sentido de conter esses avanços, quando o governo colocou aquela tributação sobre o valor nocional dos derivativos, não é? Porque sabemos que o efeito disso é a entrada, que ela se dá por essa arbitragem dos juros. Então, eu não vou te dizer aqui qual é a receita nossa, porque se eu fizer essa antecipação, eu estou cometendo um equívoco político e econômico. Então nós vamos... o governo olhará, a partir de agora, de uma forma diferente a situação que vem, porque é uma situação diferente. Nós não estamos mais na mesma situação de antes. Então, nem nós sabemos direito o que vem, porque não aconteceu, mas estamos com abertura suficiente para perceber que pode ser exigido de nós um grande esforço para conter isso.

E de outro lado, nós também percebemos que, além de tudo que já havia antes, tem o fato de que a indústria manufatureira no mundo está com um processo muito... de grande capacidade ociosa procurando, de forma urgente, mercados; e que nós somos esse mercado; e nós não vamos também deixar inundar o Brasil com produtos importados, numa concorrência desleal e muitas vezes perversa.

Para isso nós temos, claramente, políticas. Nós vamos fazer uma política de conteúdo nacional com inovação. A mesma que nós aplicamos em relação à Petrobras e que deu origem à quantidade de estaleiros novos que ocorreu. Mas também vamos fazer... vamos olhar para o setor. Nós vamos olhar o efeito dessa crise para o setor, porque ele é assimétrico no Brasil. Tem alguns que não se prejudicam tanto e tem outros que se prejudicam. Nós vamos pegar os que se prejudicam, os que são mais afetados, e a eles nós vamos dar um estímulo específico, uma proteção específica. Vamos fazer uma política de defesa comercial contra essas práticas e vamos continuar a nossa política social e de estímulo ao investimento e ao consumo.

No caso de hoje, por exemplo, nós lançamos o SuperSimples. No SuperSimples nós fizemos uma grande isenção tributária, quando passamos para a faixa dos 36... ou, [R$] 3,6 milhões. E também do MEI, que nós passamos para 60 mil. Você beneficia um universo muito grande de empresas. E, ao mesmo tempo, eu acho que nós vamos ter que fazer também essa política de proteção, de proteção não, de incentivo às exportações, no caso do Reintegra, que é uma novidade. Nós nunca tínhamos feito nessa escala. E sabemos que isso é o início. Estamos abertos a todas as outras hipóteses de trabalho, vamos acompanhar de forma pontual a coisa. Acompanhamento... Sabe aquele negócio que no futebol falam... como é que se chama, que vocês falam?

Luiz Gonzaga Belluzzo: Marcação homem a homem.

Presidenta: Marcação homem a homem. Vai ser marcação mulher a mulher, de todos os jeitos.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Presidente, voltando...

Mino Carta: Presidenta!

Luiz Gonzaga Belluzzo: Presidente.

Mino Carta: [Presiden] ta!

Presidenta: Eu estou com ele.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Eu tenho minhas dúvidas, mas não vamos discutir.

Presidenta: Ele e o Franklin Martins é que tinham dúvida a respeito, se “ta” podia. Aí, nós fizemos a nossa pesquisa e descobrimos que é possível, na língua portuguesa, dizer “presidenta”.

Ministra Helena Chagas: O professor Pasquale disse que é possível.

Presidenta: Há controvérsias, há controvérsias.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Eu estou atrasado. Mas, voltando um pouquinho à questão da crise global e da Europa, a senhora diria que a Europa e os Estados Unidos estão às vésperas de uma transição de construção de instituições, e que eles não conseguem, por conta do bloqueio... menos a Europa e mais nos Estados Unidos... bloqueio político do Tea Party, essas coisas.

Presidenta: Olha, Belluzzo, eu acho a situação dos Estados Unidos um exemplo a não ser seguido. Acho que o conflito republicano-democrata atingiu um estágio... Eu estava, outro dia, lendo uma observação, não lembro de quem, que dizia o seguinte: “No passado, você tinha democratas conservadores que, no espectro político, estavam mais à direita dos republicanos mais liberais”. Com isso você tinha pontes entre os dois partidos, e você tinha uma conversação entre os dois partidos e a possibilidade de uma visão comum a respeito do futuro dos Estados Unidos. Quando você rompe isso, e o republicano mais liberal torna-se mais conservador que o democrata mais conservador, a situação é de falta absoluta de uma base comum para você dialogar. Eu acho grave porque você vê, nesse episódio que aconteceu nos Estados Unidos agora, com a elevação do teto da dívida, um processo paroquial, de uma disputa paroquial que compromete o papel que os Estados Unidos têm no mundo. Como que uma economia que tem a moeda reserva de valor, que tem responsabilidades perante o mundo, não pode fazer política fiscal de recuperação da sua economia – o que afeta todo mundo - e a ele sobram só os Quantitative Easing que transferem para os países emergentes uma parte do seu ajuste. Eu não acredito que isso leve a boa coisa. Lamento, porque eu achava que era necessário...

Durante a crise no G-20, eu acho que se criou uma expectativa muito grande, que é ter um outro tipo de acerto, um outro tipo de cooperação, que os papéis iam ficar adequados para as necessidades. Hoje o papel não está adequado para as necessidades. As instituições... Por exemplo, existe o G-20, existe o Fórum dos Ministros, enfim, existe todo um aparato institucional - fundo de estabilização, todo mundo aprendeu como fazer. Nós aprendemos como fazer. O Banco Central está cheio de instrumentos, é só aparecer, que nós temos instrumentos. Todo mundo aprendeu. Acontece que, de que adianta tudo isso, esse saber e essa experiência, se numa questão absolutamente paroquial, que é o teto da dívida americana, eles fazem o que fizeram? Quando uma agência, que é uma agência americana, vamos botar os pingos nos is... A Standard & Poor’s tem a mesma inconsequência do Tea Party, do que se refere ao mundo, não estou dizendo... eles têm todo o direito de ter o posicionamento deles dentro do país deles. O problema é que afeta. Afeta aqueles que não foram consultados, isto é, nós. Afeta todo mundo.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Presidenta, isso... a senhora está dizendo o seguinte... uma coisa muito importante que a gente tinha que sublinhar. Porque desde Bretton Woods, digamos, desde que... do pós-guerra, no início, que muita gente advertiu que era um risco muito grande, num país, a moeda reserva ser administrada por um país só. Nós estamos vendo isso no limite, não é isso? Chegar ao limite. Porque isso está perturbando toda a capacidade de gestão das políticas econômicas nacionais, sobretudo, nos países emergentes, nesse momento.

Presidenta: E nós – não é Belluzzo? – temos todo o direito de nos preocupar, porque chegamos aos US$ 349,6 bilhões de reservas. Portanto, eu acredito que hoje nós somos o terceiro ou quarto credor. Quarto, não é? Quarto credor. E como quarto credor, obviamente, quando você vê uma política absolutamente inconsequente como essa, você fica muito preocupado. Eu lembro perfeitamente das suas aulas, Belluzzo, sobre a necessidade de uma moeda... como é que se chamava?

Luiz Gonzaga Belluzzo: Bancor.

Presidenta: Bancor. A questão é que não tem isso desenhado no momento. Não há. Porque você não pode, no cenário internacional, seja o que seja, ninguém pode prescindir dos Estados Unidos e da Europa. Eles são elementos fundamentais no cenário. A Europa é um elemento fundamental e os Estados Unidos, também, são as maiores economias do mundo desenvolvido. E nós não podemos... nós passamos por tempos, como você falou, bicudos. Por quê? É por isso. Porque precisamos da saída deles para o mundo sair. Agora, uma coisa é certa: também, em momentos como esse, os emergentes correm por fora no que podem, porque nós não somos uma ilha nem somos imunes a tudo isso. Mas nós temos de perceber que vamos ter de tocar a vida e correr por fora. O que é correr por fora? Nós vamos ter de continuar crescendo, fazendo o nosso mercado interno cada vez mais sólido, continuar buscando exportação, parcerias... Exemplo: uma das coisas importantes que está acontecendo na América Latina é a ampliação da consciência na Unasul. Recentemente, nós tivemos uma reunião especial da Unasul, lá em Lima, durante a posse do Ollanta Humala. Naquela oportunidade reuniram-se os principais... os principais não, eu acho que estavam quase todos os países da Unasul. Estavam países, tanto os tradicionais do Mercosul, como Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, Bolívia, como o Chile...

Ministra Helena Chagas: Equador.

Presidenta: ... Equador, Colômbia, e Venezuela com a representação, porque o Chávez estava tratando o seu problema. Eu acho que estava, sim, uma representação muito importante. Por sugestão do Juan Manuel Santos, presidente da Colômbia, a respeito do fato de que essa região tinha de ter uma posição comum de proteção diante da situação do fluxo absurdo de liquidez que nos afeta. Tínhamos que ter posição comum, uma estratégia latino-americana ou sul-americana de posicionamento em relação a isso, tanto no que se refere ao aspecto financeiro, como comercial. Porque eu acho... por que eu estou contando isso para vocês? Porque eu acho isso extremamente relevante. É relevante, vai ser repetido agora, na sexta-feira, lá em Buenos Aires, vai ter uma nova reunião dos ministros da Fazenda com os Bancos Centrais, e mostra um aumento imenso da consciência dentro da nossa área daqui. Porque, antes, qual era a alternativa nos anos 90 e numa parte dos 2000? Era a seguinte: faça um acordo de livre comércio com os Estados Unidos e viva feliz para sempre. Hoje, a questão do Tea Party e a questão dos republicanos e a questão que se coloca é que eles não aprovam o TLC [Tratado de Livre Comércio]. Então, esses países, progressivamente, perceberam que as suas oportunidades, a sua... vamos dizer assim, a sua integração, a sua concepção de relação comercial tinha de alterar-se e olhar para a América Latina, América do Sul, aliás, porque aqui as grandes oportunidades ocorriam. E nós somos países que temos taxas de crescimento muito expressivas, que temos um potencial de integração muito grande e que podemos, durante esse período, aproveitar essas características que até então nós nunca pudemos aproveitar, em nosso benefício. E o interessante é que isso não parte - e falariam antes assim: “ah, isso está partindo daquele pessoal, que é muito radical”. Não, isso está partindo de um governo conservador, mas um governo conservador comprometido com o seu próprio país, que é o governo do Juan Manuel Santos. E também não sei se é conservador, não. Estou falando que no espectro da visão tradicional seria isso. Acho até um governo muito avançado, com um presidente que pensa nesses termos.

Isso eu estou chamando de correr a nossa corrida. E nós temos ainda de ver, e vamos olhar isso... bom, vamos manter sistematicamente a relação dos Brics. Ninguém é ingênuo de supor... que eles também já olharam para nós com olhares muito tortos. Dizendo que essa relação que a gente privilegia do Brasil com a China, a Índia, a Rússia e a África do Sul é uma relação secundária. Não é não. É uma relação muito importante porque o posicionamento dos Brics, hoje, se mostra um posicionamento estratégico para o mundo. Porque quem segura muito da taxa de crescimento mundial e não deixa a peteca cair são os Brics.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Presidente, a propósito disso, nossas relações com a China são relações ao mesmo tempo virtuosas e às vezes um pouco...

Presidenta: Eu diria complexas, Belluzzo...

Luiz Gonzaga Belluzzo: Complexas...

Presidenta: Complexas, como todas as relações.

Luiz Gonzaga Belluzzo: No caso da China, nós estamos diante de uma possibilidade de ter uma relação mais intensa comercial, financeira e até a utilização das duas moedas como moeda de denominação das nossas transações comerciais. Então, como a senhora está dizendo, é uma relação complexa. Eu gostaria que a senhora falasse um pouquinho disso...

Presidenta: Olha, eu acredito que nós temos de construir cada vez e passo a passo a nossa relação com a China. Eu acho que tem situações em que nós temos de dizer para a China: “não é assim que nós queremos”. Nós já dissemos isso: “não é assim que nós queremos. Vocês são muito bem-vindos ao Brasil para fazer o investimento que vocês acharem oportuno. Exemplo: indústria automobilística – muito bem-vindos. Só tem um pequeno problema: nós não queremos CKD. Esse pequeno problema vocês entendem porque vocês também nunca quiseram CKD. Então, nós estamos falando uma linguagem que vocês entendem, e queremos inovação e queremos parcerias”.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Queremos cadeias.

Presidenta: Queremos cadeias, cadeias não no sentido de cadeias, mas no sentido de redes, de arranjos produtivos, queremos isso. Essa é uma fala. A outra fala é a seguinte: “nós achamos muito importante o que temos. Temos a quantidade de alimentos que possuímos, temos a quantidade de minério que temos, temos a quantidade de petróleo que temos. Nós não somos aquele país agromineiro, energético, exportador; nós somos um país um pouco, ou melhor dizendo, bem mais complexo”. Então, a nossa parceria, não só ela está baseada na agregação de valor aqui, como em uma outra questão: nós queremos parceria; se quer uma parceria bilateral conosco, tem de ter ciência, tecnologia e inovação. Isso significa satélites, nós queremos uma parceria comum em satélites, queremos em várias áreas estratégicas. Acho que é importante que a China tenha acesso aos nossos produtos, nós achamos fundamental que ela tenha acesso aos nossos produtos, gostamos muito que isso aconteça, mas queremos diversificar a nossa pauta para manufaturados. Que isso é uma obrigação nossa e não uma dádiva dos chineses, nós também sabemos, ou seja, somos nós que temos de ser responsáveis por isso, e não os chineses que têm de nos conceder isso. Somos nós que temos de ser responsáveis por verificar se não estão entrando aqui só CKDs, e não os chineses. Somos nós que temos que impedir que quando há casos de dumping não se faça triangulação, e não os chineses. Então, ter essa noção é ser capaz de colocar a nossa relação com os chineses em termos bem adequados. E aí, eu quero dizer uma coisa para vocês: nunca, nunca... eu estive em todas as viagens anteriores e acho que elas construíram um espaço de relacionamento diferenciado. Então, não estou dizendo que se deve ao meu governo. Deve-se a todas as... eu participei de três, talvez o presidente Lula tenha ido a mais uma, mas deve-se a todas essas relações que nós construímos ao longo desses anos com os chineses, que é uma relação de respeito. Obviamente, nós é que temos de nos fazer respeitar. Não podemos ter aquela visão paternalista que eu já vi muitas vezes por aí: “Ah, mas os chineses fazem isso”. Fazem porque nós deixamos. Então, o que nós temos de fazer é não deixar. Eles estão na deles. Nós temos de ficar na nossa.

Mino Carta: Celso Amorim fala em “complexo de vira-lata”.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Isso é uma coisa do Nelson Rodrigues.

Presidenta: É, do companheiro Nelson Rodrigues.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Do companheiro Nelson Rodrigues. É isso mesmo.

Presidenta: Eu vou dizer uma coisa para vocês: nunca eu... Tem uma avaliação do papel do Brasil, a China tem uma avaliação do papel do Brasil. E essa avaliação do papel do Brasil, ela, para nós, é muito importante. Não que ela vá garantir qualquer coisa. Quem garante qualquer coisa somos nós mesmos. Mas é muito importante, porque é o reconhecimento do Brasil como um player, de igual para igual.

Sérgio Lírio: Presidenta, ao falar em reconhecimento, vamos mudar um pouco, tirar um pouco do assunto da economia (incompreensível)...

Presidenta: Isso é política pura, viu?

Sérgio Lirio: Tá... Copa de 2014. Vamos falar em projeção do Brasil, a sensação que a gente tem hoje é de que a coisa vai bem...

Presidenta: Você sabe que eu não acho? Eu gostaria de entender por que isso aí.

Sérgio Lirio: Por que nós achamos?

Presidenta: Baseado em quê?

Sérgio Lirio: Porque o número das obras, as obras, algumas paradas, não vão, temos...

Presidenta: Quais?

Sérgio Lirio: Os estádios não andam, não é? Volta e meia, a Justiça quer parar uma obra, consegue parar uma obra...

Presidenta: É isso aí.

Sérgio Lirio: Conseguiu em Belo Horizonte, conseguiu no Rio [de Janeiro]. Conseguiu no...

Presidenta: Nós vivemos em uma democracia. Tem Judiciário, Legislativo e Executivo.

Mino Carta: Eu tenho um outro motivo.

Presidenta: Por quê?

Mino Carta: Porque a Fifa é uma organização mafiosa...

Ministra Helena Chagas: Você está falando uma coisa...

Mino Carta: E o nosso líder futebolístico, o nosso chefe do futebol está muito bem dentro desse panorama.

Presidenta: Quem é o nosso chefe?

Mino Carta: É o Ricardo Teixeira.

Presidenta: Ah não, do governo ele não é.

Ministra Helena Chagas: Ele é da Fifa.

Mino Carta: Não, eu sei. Não, é o chefe do futebol, eu falei do futebol.

Ministra Helena Chagas: Da CBF.

Mino Carta: Há quem diga, inclusive, que a Presidenta não o recebe? Se é verdade ou não, eu não estou...

Presidenta: Não, recebo sim.

Mino Carta: Recebe?

Presidenta: Óbvio.

Mino Carta: Então, não é verdade?

Presidenta: São relações institucionais.

Mino Carta: Certo.

Presidenta: Recebo, sem problema.

Sérgio Lirio: Então, vamos voltar... o ritmo das obras, a senhora estava ...

Presidenta: O ritmo das obras... então, vamos fazer uma diferença? É o seguinte, olha: você tem obras essenciais e obras que são legado. As essenciais: sem estádio você não tem... você não tem...

Sérgio Lirio: Lógico.

Presidenta: Se não tiver, ou bem tem estádio, ou bem não tem... não tem Copa.

Sérgio Lirio: Sem dúvida.

Presidenta: Nos estádios nós tomamos uma providência muito clara. Não sei se vocês lembram, o Petrus deve lembrar que eles disseram o seguinte: as obras serão privadas nos estádios.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Eu fiz um estádio privado.

Presidenta: Você fez?

Luiz Gonzaga Belluzzo: Fiz. O estádio do Palmeiras é privado.

Presidenta: O estádio totalmente é privado.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Totalmente. Mas não está escalado para a Copa, em princípio.

Presidenta: Em princípio, não está escalado para a Copa, em princípio. Nós, dentro dessa visão de que os estádios seriam privados ou pelo menos da União não seriam, não estavam na matriz de responsabilidade da União, mas a União sabendo o poder que ela tem em relação a financiamentos, principalmente a financiamentos de longo prazo que não existem disponíveis no setor privado, colocamos, através do nosso companheiro Luciano Coutinho, do BNDES, colocamos [R$] 400 milhões à disposição para o financiamento da Copa, considerando um valor que era o valor internacional, para o estádio definido pela Fifa. Desses estádios que estão em andamento, nós temos certeza de que dez estavam com zero problema. Todos os problemas que tinha eram aqueles tradicionais em obra, que atrasa isso, arruma aquilo, tem que ter licença aqui, acolá e tal... Dois, naquela época... desculpe, eram três...dois não tinham se iniciado ainda e eram problemáticos. Esses dois... um, porque a licitação tinha dado vazia, eles refizeram a licitação, e agora eles começaram a fazer a obra; e um outro, porque tinha uma discussão, entre o Ministério Público Federal e o TCU e a CGU, a respeito... se dá o dinheiro, 20% antes ou não dá, resolveram que dava, e ele também está em andamento. Tem um único, que era aquele de São Paulo – eu estou falando em São Paulo, não falei esse dado dos outros porque é público e notório – que não tinha começado. Então, nós fizemos muita pressão, no sentido de resolver a situação de uma vez por todas. O que ficou claro? Ficou claro que, agora, o governo do estado vai entrar e participar, que além dos nossos [R$] 400 milhões para ele poder abrir a Copa, eles vão botar mais sei lá quanto, uma parte bota a prefeitura, outra parte bota o governo do estado. E nós acreditamos que ele vai ser o que vai ficar pronto mais em cima da hora, mas que fica pronto. Até agora, não há nenhum indicador de que ele não fique. Mas vamos supor que haja algum estádio que não fique pronto. Tem 12 estádios, 12. Em qualquer hipótese, o país, com muito menos que 12, tinha condição de fazer a Copa, e vocês sabem disso. Eu, portanto, não vejo risco nenhum de o país não ter estrutura de estádio.

Mino Carta: E a infraestrutura?

Presidenta: De infraestrutura de estádio.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Não, e a infraestrutura geral?

Presidenta: Infraestrutura geral é legado, não é essencial para a Copa. Não é. No dia da Copa, no dia do jogo você vai ter feriado. Você não vai concorrer com a estrutura logística...

Sérgio Lirio: O sentido de fazer um evento desse é ter também um...

Presidenta: Não, legado. Por isso que eu falei legado. Deixa eu, antes de legado, chegar em um outro que é essencial - aeroporto é essencial. Em um país continental, aeroporto está na categoria essencial.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Claro.

Presidenta: Dos aeroportos com grandes problemas, nós temos São Paulo e temos Brasília. Os outros têm muito menos problemas. O de São Paulo e o de Brasília, nós resolvemos fazer concessão. Inclusive, depois que eu sair daqui, eu vou fazer a discussão final, nós vamos bater o martelo em uma... na formatação do leilão, como é que vai ser o leilão. É... sai a publicação do edital em dezembro. A contratação sai em março, ou fevereiro ou março. O que está sendo feito? Nós estamos fazendo a concessão de... 49% ficam com a Infraero e a gente faz uma concessão de 51[%]. O que a gente concede? A gente... Bom, primeiro, o que não concede: todo o sistema de navegação, todo o sistema de aproximação e, portanto, nenhuma das torres, e nem o sistema público, que é o que faz a gestão do aeroporto no sentido de como é que o avião para, estaciona, como é que ele se aproxima e como é que ele sai e navega. Isso, continua sendo o Decea [Departamento de Controle do Espaço Aéreo], na sua grande maioria, e uma parte menor da Infraero.

Bom, fica então a exploração comercial do aeroporto, a gestão do aeroporto, toda a gestão, e a ampliação, o que nós queremos é contratar a ampliação dos aeroportos. Nessa visão, nós vamos reforçar Guarulhos, mas o futuro está em Viracopos. Não está em Guarulhos porque Guarulhos caminha a passos acelerados para o esgotamento da sua capacidade. Ele não tem retroárea suficiente para expandir, ele não tem. A cidade ocupou, o custo de você desapropriar é elevado, tanto no que se refere a pequenos imóveis unifamiliares, quanto a empresas. É absurdo. Nós já tentamos, inclusive, fizemos várias, várias hipóteses, mudando a configuração da pista. É inviável. Mas, nós temos de expandir o quê? Os terminais de passageiros, pátio e pista ainda tem o que fazer e temos também de... Porque nós fizemos uma contratação agora, por emergência, de um MOP [Módulo Operacional Provisório] e um terminal, o MOP é aquele módulo, e um terminal. Já concluiu, já começou, ele tem de entregá-lo até dezembro porque a gente não só cuida de Copa, não é? Tem 20% de crescimento de taxa de uso de avião no Brasil, que é um escândalo.

Sérgio Lirio: São os puxadinhos, não é?

Presidenta: Não, esse puxadinho, meu filho, segurou a Copa da África do Sul.

Sérgio Lirio: É um puxadão.

Presidenta: Nós não vamos fazer isso, não. Nós vamos segurar até a Copa, mas na hora que chegar a Copa, vai ter estrutura. O que é o problema? É que o aeroporto que sustenta o sistema é o aeroporto de Guarulhos, então nós vamos ter de fazer uma licitação que leve em conta esse fato e que transfira. Nós vamos ter que ter um fundo que integre essa renda, que aproprie. A renda não pode ficar só com explorar o aeroporto, ela tem que ser dividida nacionalmente. Então, por isso que não é uma licitação trivial. Se nós...

Jornalista: Complicadíssimo.

Presidenta: Eu asseguro para vocês que isso está saindo. Isso não tem... Está todo mundo em cima, não é? Não é uma coisa que a gente deixou a Secretaria de Aviação Civil sozinha lá, com o Wagner [Bittencourt], e a Infraero, com o Gustavo [do Vale], mas está a Fazenda, está a Casa Civil, está o Planejamento, está o pessoal que fez modelagem, porque nós já fizemos modelagem, nessa altura, de muita coisa. Eu asseguro a vocês, no caso de aeroportos também, tanto o aeroporto...

Sérgio Lirio: De Brasília.

Presidenta: Não, o de Brasília está nisso, vai ter também. O aeroporto, num segundo momento, mas aí não é só visando a Copa, nós vamos olhar o Galeão e o aeroporto de Belo Horizonte, Confins, os dois. Apesar de você não ter um problema de casos de... do Galeão você não tem um problema de exiguidade de TPS [Terminal de Passageiros], de pátio e pista.

Bom, mas a gente vai modernizar a estrutura de aeroportos do país visando a Copa, mas tem que ser antes disso, porque senão os aeroportos não seguram a quantidade de gente. Então, o problema do aeroporto não é um problema da Copa, é um problema de depois de amanhã, o que você faz. Por isso é que eu estou te assegurando que na Copa ele estará prontinho.

Mino Carta: No momento é... No momento, isso é terrível.

Presidenta: Nós temos, de legado, 50 obras. O que nós falamos... fizemos uma reunião com os... é legado, não é essencial para a Copa, até porque tem algumas que não dizem respeito diretamente à Copa, mas beneficiam indiretamente, é um legado para as cidades.

Nós fizemos uma reunião, porque são 50 obras em que o governo federal bota dinheiro. Dessas 50 obras estavam poucas, em 50, estavam poucas já iniciadas. Então, dissemos para as pessoas o seguinte: se até dezembro... As pessoas, quem? Os governadores e os prefeitos. Se até dezembro de 2011 a obra não estiver em fase de licitação, ela sai do PAC da Copa, vai para o PAC normal, PAC Cidades, PAC Transportes, vai para o PAC normal. E é por quê? Porque ela não fica pronta até dezembro de 2013. Para ela ser legado, a condição é que ela fique pronta até dezembro de 2013. Por quê? Se a gente não colocar essa restrição, as pessoas não correm para fazer, não vão tomar as providências, porque tem de ter projeto executivo, tem de ter licenciamento e a obra tem de estar licitada, tem que tomar as providências.

O governo federal pode fazer várias coisas, mas não pode obrigar ninguém a manter um ritmo, se não tiver essas condições prévias. E ela só entra para o PAC Copa se, em 2013, em dezembro, ela estiver pronta.

Mino Carta: E aquilo que não é legado aos estados, por exemplo? Quais são as exigências da Fifa? São muitas, são pesadas, ou não são?

Presidenta: Eu não tenho condição de te dizer isso...

Mino Carta: Não?

Presidenta: Assim, não posso falar assim, eu não tenho...

Mino Carta: Isso é coisa do Ministro do Esporte.

Presidenta: O Ministro do Esporte tem condição. O que o Ministro do Esporte acha é que não está na nossa competência... não está na nossa competência dizer: “Vocês não podem fazer assim, vocês têm de fazer assado”. O que está na nossa competência? Está na nossa competência dizer o seguinte: “Para isso, nós só colocamos tanto de dinheiro”.

Mino Carta: (incompreensível)

Presidenta: Para emprestar para... geralmente a gente empresta para o estado, o governo do estado. Para emprestar para o governo do estado nós só emprestamos 400 milhões.

Mino Carta: Isso me parece perfeito. Agora, veja...

Presidenta: O controle nosso é a quantidade de dinheiro que nós pomos à disposição.

Mino Carta: Não, perfeito. Agora, na Alemanha eu sei que a Fifa fazia umas tantas exigências em relação aos seus estádios, especialmente o de Berlim. E a Alemanha simplesmente não aceitou essas exigências.

Luiz Gonzaga Belluzzo: ... Sessenta e cinco mil pessoas [capacidade dos estádios]. E também você precisa ter um lugar muito amplo para a imprensa porque, por exemplo, no primeiro jogo tem, ao mesmo tempo, uma conferência da Fifa etc, etc.

Presidenta: É, e aí eu queria só dizer – isso pode até gravar – nós também temos uma outra obrigação, que nós cumprimos, mais três obrigações importantes, e que nos interessa ter essa obrigação: uma é garantir ali, em volta de todos os estádios, uma estrutura de banda larga que dê suporte a todas as transmissões esportivas, à imprensa e a tudo. Isso nos interessa bastante, fazer isso, porque aí você já faz... Isso também é uma baita legado, não é?

E a outra questão é da segurança. Também nós (incompreensível) sem problema. Nós vamos fazer uma concentração: Polícia Federal, Força Nacional de Segurança Pública e Exército.

E tem uma terceira, que o que nós podemos fazer: nós não podemos garantir um nível de... a quantidade que vai... que eles supõem que vão ter, de hotéis. Nós colocamos financiamento na pauta, botamos financiamento. No Nordeste, tem uma... é bem mais fácil, não é? No Rio também é bem mais fácil. Nas cidades que têm porto nós fizemos uma reforma, a proposta é fazer uma reforma nos portos e deixar ancorar navio. O cara fica dentro do navio, sai e vai lá no estádio, vê o jogo, comemora, conversa, faz o que ele quiser e volta para dentro do navio.

Mino Carta: Chora, eventualmente.

Presidenta: Isso, chora, e sofre, arranca os cabelos, porque é um momento de arrancar cabelo terrível, não é?

E outra coisa também que o pessoal... Nós temos, agora, nós estamos concluindo uma Lei da Copa. Essa Lei da Copa, ela vai regulamentar o que nós vamos fazer. E, do ponto de vista do governo, a nossa cara no exterior – nós respeitamos a Fifa, a CBF – a nossa cara no exterior é o Pelé, é o nosso Embaixador, é nosso Embaixador Honorário.

Sérgio Lirio: Se for a última pergunta, eu queria, assim...

Presidenta: Eu fazia isso...

Sérgio Lirio: Não, não, que a senhora fizesse um pouco do... Que Brasil que a senhora acha que vai... que será o Brasil em 2014, quando acabar o mandato?

Presidenta: Posso te dizer o Brasil que eu vou fazer tudo para ser o de 2014. Eu vou fazer tudo para o Brasil de 2014 ter menos 16 milhões de miseráveis, para que a nossa classe média tenha, na Educação, um caminho para manter a sua condição de classe média. E que também os que estão um pouquinho acima desses 16 milhões passem para a classe média.

Na verdade, o que nós queremos é um Brasil de classe média. Por isso que hoje a gente fez esse esforço grande, no caso do microempreendedor individual, para botar para dentro da formalização o que nós achamos que está nessa faixa, e passamos para R$ 5 mil/mês brutos o direito de ele pagar uma coisa mais... muito pequena de imposto, ele paga uma coisa muito simbólica. E aí ele tem direito a quê? Nós queremos ter uma política de crédito, da mesma forma que a gente tem uma política de crédito para o Pronaf, nós queremos ter uma para o pequeno, uma política de crédito.

E, além disso, eu quero ter mexido na Saúde, ter transformado, na área da Saúde, pelo menos uma parte expressiva. Porque, o que acontece na área da Saúde? Por exemplo: na área da Saúde, por exemplo, você tem algumas coisas complicadas. Nós não podemos ter hospital em uma quantidade absurda, mas nós podemos ter uma política de regionalização de hospital, como tivemos uma política de regionalização de universidade.

E aí, tem uma outra solução: nós vamos criar, que é, agora, a minha próxima... que a gente tem de ter no governo, não sei se vocês sabem, obsessões. Minha próxima obsessão, que está sendo construída, porque ela é mais complexa porque é na área da Saúde, é o tratamento em casa. Um tratamento...

Sérgio Lirio: Homecare.

Presidenta: Homecare. Um tratamento de hospital na sua casa. Por que isso? Por que nós queremos inventar uma coisa sofisticada? Não, porque isso é mais barato, porque isso é melhor para as pessoas e porque isso pode ser feito numa escala maior, com um custo fixo muito pequeno e com um custo variável que nos interessa, sobre ele. Você, com isso, descongestiona não só... descongestiona o tratamento final num hospital, diminui a quantidade de tempo que a pessoa permanece ali, ocupando leito.

Mino Carta: Essa preocupação seria uma iniciativa inédita?

Presidenta: É, aqui no Brasil é.

Luiz Gonzaga Belluzzo: No National Health Service você tem a homecare.

Presidenta: É?

Mino Carta: Sim, mas na Inglaterra tem (incompreensível), é outra coisa.

Presidenta: Nós vamos fazer, mas é assim: nós estamos fazendo...

Mino Carta: Mas é outra coisa, é uma coisa... Essa é uma coisa muito, eu acho, muito...

Presidenta: Na pontinha do lápis, está na pontinha do lápis. Nós não vamos fazer uma coisa sem muita convicção, tá? A convicção, hoje, é de 90%, é viável. O que nós estamos dimensionando é o tamanho.

Sérgio Lirio: Então...

Presidenta: Por isso que eu te falo que a gente só faz certas coisas com obsessão, porque você vai, você vai chegando por aproximações sucessivas. Nós começamos a fazer o seguinte, exemplo, vou te dizer: UBS – Unidade Básica de Saúde –, a primeira coisa que nós estamos fazendo é reconstruir, no Brasil inteiro, todas as que têm, porque tem – se não me engano, posso estar falando errado, você olha depois com o [ministro da Saúde, Alexandre] Padilha – 44 mil [Segundo o Ministério da Saúde, são 42.174, sendo 36.892 UBS e 5.282 postos de apoio ao Saúde da Família]. Eu estou reequipando, remodelando e modernizando, para funcionar.

Unidade Básica de Saúde, onde não tem, nós vamos priorizar o quê? Nós temos o mapa da pobreza feito pelo Censo, certo? Nós temos o mapa da pobreza por microrregião. As três mil que nós temos para construir vão para esses locais. Então, eu preciso de UBS funcionando, bonitinha, com tudo em cima. O que é tudo em cima? Nós temos, por exemplo, câncer de mama, nós temos mamógrafos numericamente suficientes. O que acontece com ele? Ou ele está quebrado, ou ele está encaixotado, e alguns estão sendo usados. Foi isso que o ministro Padilha levantou e remontou o esquema, quando nós lançamos o tratamento de câncer de mama.

A mesma coisa foi com a nossa Rede Cegonha. Nós estamos fazendo a Rede Cegonha. Nós não conseguimos fazer a Rede Cegonha em todos os municípios do país, mas conseguimos fazer a Rede Cegonha naqueles... Estamos começando naqueles com mais baixo nível de tratamento. É assim que se pode chamar o seguinte: tratar em...

Jornalista: Em casa...

Presidenta: Como se...ou seja, dar tratamento de hospital na sua casa.

Sérgio Lírio: É... então, mas a senhora vai usar alguma estrutura? Porque, por exemplo, hoje existe a estrutura do...

Presidenta: Não, nós estamos aumentando, é uma reivindicação muito grande de todos os governadores, de todo o sistema SUS, do Ministro da Saúde, de todo mundo, nós estamos aumentando o número de médicos sendo formados no Brasil.

Mino Carta: Me diga uma coisa, nesse quadro...

Presidenta: Isso é muito importante...

Mino Carta: O saneamento básico...

Presidenta: O saneamento básico...

Mino Carta: Nesse quadro...

Presidenta: A gente continua na mesma batida, com mais dinheiro. Nós dependemos... se você olhar como é que foi, se você pegar o PAC e vir o balanço do PAC, olhar o que foi feito, você vai ver o seguinte: o governo federal não tem como fazer, ele diretamente, as obras de saneamento, ele tem como dar dinheiro para ser feito, e nós demos 40 bi. Para quem? Nós demos para, de preferência, para grandes concentrações populacionais, porque esse é o nosso papel, e, em alguns casos, até para pequenos também, principalmente via Funasa, que agora começa uma execução muito melhor. E o que acontece? Acontece que quem executa, executa... os estados. Os estados que têm companhia de saneamento executam com maior eficácia. Alguns não têm companhia de saneamento, nem os municípios têm companhia de saneamento, então são os municípios que executam, aí de forma mais difícil. Por quê? Porque os municípios, muitas vezes, não têm aqueles recursos técnicos necessários para executar, mas a lei atribui a eles o papel de executores.

Então, nós também destinamos agora um recurso só para fazer os projetos. O governo vai ajudar os municípios a fazer projetos executivos, para poder sair projeto de melhor qualidade e as coisas sendo tocadas. Agora, os estados que têm companhia de saneamento têm executado isso muito bem. Nós conseguimos algumas obras muito importantes nesta área. Agora, eu queria só acrescentar: considerando água, saneamento, que geralmente o pessoal acha que é esgoto, na questão da água nós estamos fazendo uma política concentrada violentamente no semiárido nordestino, onde vivem 20 milhões de pessoas. Em que nível? Nós vamos fazer 750 mil cisternas lá, sendo que este ano nós fazemos 300 e poucas, e no ano que vem o resto. Cisterna para ele reservar água para beber e para lavar prato, essas coisas. E estamos criando barragens, barraginhas, aguadas, tem vários nomes, para água para produção e com cisternas muito maiores para produção. Para ele poder irrigar, para poder jogar água para poder plantar. E estamos fazendo alguns projetos mais complexos. Nós agora começamos a fazer os ramais, os que vão abastecer a transposição do [rio] São Francisco. Nós começamos a fazer... Porque é um canal e aqui você tem que levar a água. Nós começamos a fazer isso agora. Pretendemos, até 2012, ter uma parte concluída; até 2014, ter outra parte grande concluída e só conseguimos acabar em 2015. Antes disso, nós não conseguiremos acabar. Estou falando para ti o cronograma que hoje é real.

Sérgio Lírio: Presidenta, eu queria falar de uma obra que recebe muitas críticas, que é o trem-bala. Eu queria saber por que o governo acha tão importante.

Presidenta: Nos anos 80, essas mesmas pessoas, hoje, que falam mal do trem-bala, falavam de metrô. E falavam que a gente não tinha de fazer metrô, não, porque metrô é coisa de gente rica. Que a gente tinha de fazer esses corredores-ônibus. E deu no que deu. O que é o trem-bala? Você tem duas grandes capitais com necessidade de logística. O trem-bala não se justifica naquelas extensões chinesas, 1,5 mil Km. Nessa extensão nossa, entre São Paulo e Rio, ele é absolutamente justificável. Ele não é só transporte. Ele é reconfiguração urbana.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Isso é um ponto importantíssimo.

Presidenta: Ninguém discute isso. Você vai fazer esta ligação entre São Paulo e Rio. Neste percurso, você vai conseguir fazer uma desconcentração das cidades. Por que você vai conseguir? Porque o cara sai de casa, entra em um trem-bala e desce no centro da cidade e vai trabalhar. Se a gente não tiver uma solução para São Paulo e Rio, nós vamos ter uma banana na mão, gigantesca, mas gigantesca. Porque São Paulo vai ficar inviável, o Rio vai ficar inviável e nós vamos ficar inviáveis. Então, o trem-bala... Uma vez... Sabe como eu fui chegar no trem-bala? Uma vez, eu fui a Tóquio e eu achei estranhíssimo, porque eram umas ruas desse tamanhozinho assim; passava o carro, mas não congestionava, eu não via congestionamento. Porque tinha de ter um baita congestionamento naquela cidade. Aí, eu fui... Perguntei por que não tinha congestionamento. Aí, um me explicou que não tinha congestionamento porque eles tinham, logo depois da guerra, começado uma estrutura de trens e que eles tinham mudado a direção urbana das cidades. Primeiro, com Tóquio-Osaka. E quando eles mudaram isso, eles criaram, descentralizaram no trecho que... não era no trecho Osaka, não, que era longe. De Tóquio até Quioto, eles tinham criado várias paradas, e nessas paradas eles tinham construído moradias etc. Que era bastante agradável, porque saía da cidade, era menos poluído, isso assim, assim.  E depois eles fizeram isso em outras cidades, em outros lados e tal, e que tinha funcionado perfeitamente.

Olhando as cidades de São Paulo e Rio e olhando aquele trecho que beira o mar e a Serra do Mar, é um dos lugares mais bonitos deste país. Não existirá motivo para que você não more nesse caminho, entendeu? E que você não resolva um problema de transporte gravíssimo. Porque, com o trem-bala, o que eu consigo fazer? Eu boto alguém lá dentro, lá no centro da cidade de São Paulo, morando a 60 km, a 70 km, a 90km, a 100 km. Porque o trecho todo dá 490. Se você botar Campinas, são mais 90, mais 100, dá uns 500 e poucos.

Luiz Gonzaga Belluzzo: É a distância ideal, não é?

Presidenta: É a ideal. E, além disso, você pega Campinas aqui. Se eu começar de Campinas até São José dos Campos, eu resolvo um problemão. Eu crio uma conurbação, e aí se tiver uma disciplina de construir alternativas de moradia, você tem um lugar em que eu evito, sabe o que eu evito? Eu evito o congestionamento de aviação, porque eu vou jogar tudo para Campinas, meu querido. Viracopos.  Eu não tenho como colocar no centro da cidade... aquela outra alternativa de aeroporto. O pessoal do Decea diz que tem um negócio que se chama cone de aproximação, que compete... isso aí eu não sei direito, se você quiser se aprofundar, sugiro que você fale com o Wagner Bittencourt, da SAC. Mas tem várias vantagens.

O trem de alta velocidade não é porque nós resolvemos ser ricos e aí vamos ter um trem de alta velocidade, o trem de alta velocidade soluciona o problema urbano no Brasil. E te asseguro: nós todos somos pessoas que gostam muito de novidades. Nós todos. Todo mundo... você imaginou se você puder sair de manhã, lá de São Paulo e ir lá ao Rio tomar uma cerveja na praia! Você não vai? Essa última é brincadeira.

Mino Carta: E a Comissão da Verdade?

Presidenta: A Comissão da Verdade, nós vamos criar.

Mino Carta: Mas vai para frente? Por ora...

Presidenta: Não, não é por ora, não. Nós estamos querendo que seja algo que saia por unanimidade entre as bancadas, e não há porque não sair. Não tem motivo nenhum para o PSDB, para o DEM não aprovar a Comissão da Verdade. Eu acho que ela é... Ela não é uma questão que pode ser vista partidariamente, é uma dívida que nós temos.

Mino Carta: Magnífico. Agora, só uma última coisa. Você está satisfeita? Está feliz, está contente?

Ministra Helena Chagas: Esta é uma pergunta complexa...

Presidenta: Eu sou uma pessoa alegre.

Mino Carta: Eu não tenho dúvida...

Presidenta: Eu não sou uma pessoa deprimida...

Mino Carta: Você é uma pessoa alegre e corajosa.

Presidenta: Eu não sou deprimida. E me contento... Depois de uma certa idade, eu me contento com algumas coisas, viu? Se eu puder ler... Hoje, eu passei ali e descobri que eu tinha ganho um livro que se chama... é um livro sobre um grupo que se chama Grupo dos Sete, eu fiquei morrendo de vontade de parar e ler meu livro o Grupo dos Sete (incompreensível) que é um livro sobre um grupo de impressionistas. Você conhece os canadenses?

Mino Carta: Canadenses? Impressionistas?

Presidenta: É, foi... eu acho... pega o meu livro ali, só para mostrar para ele. É um grupo que havia no Canadá, foram sete pintores. Eu tenho impressão de que foi no final do século 18, início do ... final do século 19, início do século 20.

Jornalista: ... quase contemporâneo com os franceses.

Presidenta: Muito bonito. E eu falei, olha, ganhei isso do Primeiro-Ministro [do Canadá]. Me deu esse presente, olha que graça. O Grupo dos Sete. Agora, olha que beleza!

 

Ouça a íntegra da entrevista (01h22min37s) da Presidenta Dilma