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Entrevista exclusiva concedida pela Presidenta da República, Dilma Rousseff, ao canal de TV RussiaToday (RT) - Ufa/Rússia

Ufa-Rússia, 10 de julho de 2015

 

 

Jornalista: Olá, bem-vindos a nosso espaço de entrevistas! Estamos em Ufa, na Cúpula dos Brics, e hoje temos o imenso prazer de entrevistar a Presidenta do Brasil, Dilma Rousseff. Bem vinda a Ufa, Presidenta. É um prazer conhecê-la. Obrigada por receber este convite do canal RT. Como dissemos, a senhora está na cúpula dos Brics 2015, onde foram tomadas algumas decisões importantes, sobretudo com relação à colocação em funcionamento do banco, não?

 

Presidenta: Olha, eu acredito que esta reunião, a 7ª Cúpula dos Brics, que foi sediada pela Rússia, ela teve um resultado excepcional. Ela é um marco nas nossas relações. Nós conseguimos concretizar a formação do Banco dos Brics, nomear toda a sua estrutura de governança, inclusive já indicamos o presidente do Banco e os vice-presidentes.

Além disso, fizemos um Acordo Contingente de Reservas, que é um acordo que dá uma espécie de amortecedor para as crises financeiras, para o fato dos mercados oscilarem muito. E esse Acordo Contingente de Reservas foi assinado pelos nossos bancos centrais.

Então, eu acredito e olho, de uma forma, assim, como tendo sido um grande sucesso a Cúpula dos Brics, além de estar muito bem organizada, como eu estava te falando antes.

 

Jornalista: A senhora fazia referência, agora, justamente a tentar que os países membros dos Brics possam estar preparados diante de situações econômicas difíceis. Por isso falou-se também de novos membros – todos sabemos o que está acontecendo com a Grécia agora, sobre esse referendo e como a população grega respondeu a essa situação. Uma das razões pelas quais o Brics nasceu é justamente tentar esquivar-se do FMI e também do Banco Mundial, por considerar que não contribuem muito. O que se sabe da Grécia? Vocês consideram a possibilidade de integrar a Grécia ao Brics?

 

Presidenta: Olha, eu espero que a União Europeia resolva o problema da Grécia, e acredito que esse processo de negociação está em aberto. No que se refere aos Brics, tanto o Banco quanto o Acordo Contingente de Reservas, nós não funcionamos contra nenhum órgão internacional multilateral. Mas o que nós fazemos é dar suporte para as nossas economias enfrentarem conjunturas adversas, como alta volatilidade financeira, no caso do Acordo Contingente de Reservas.

Mas, no caso do Banco dos Brics, há uma carência imensa de fundos para investimento de longo prazo. O Banco vai ocupar este lugar e, com isso, ele vai aumentar os recursos disponíveis para investimento, num primeiro momento para os membros do Brics, e num segundo momento para os países que vierem, porventura, a demandar.

Então, eu acredito que, tirando essa questão que nós estávamos falando, que é a questão da Grécia, eu acho que a Grécia, primeiro, tem de resolver o problema dela dentro da União Europeia.Não cabe agora essa discussão.

 

Jornalista: Também falou-se, em algum momento, que Argentina, México, Coreia do Sul e até mesmo a Venezuela estariam muito interessados em participar deste banco. Vocês chegaram a falar, não de torná-los membros, mas de que talvez o banco foi uma grande ideia e que animou muita gente? Vemos muita esperança?

 

Presidenta: Os integrantes do Banco dos Brics, os cinco países - China, Índia, Rússia, África do Sul e Brasil - são todos a favor de ampliar a participação de outros países no Banco dos Brics. Agora, essa questão não foi discutida, e ela só pode ser discutida pelas regras do Banco e de forma consensual. Mas não foi discutido, acredito que no futuro será.

 

Jornalista: Dentro desse banco, cada país tem seus próprios projetos também. Por exemplo, se está falando dessa ferrovia que iria do Brasil ao Chile. É o seu projeto principal?

 

Presidenta: Esse projeto, que é a Ferrovia Bioceânica, que liga o Atlântico ao Pacífico, na verdade, o que se está concebendo é que ela saia do Brasil e vá pelo Peru para o Pacífico. Está em estudo, ainda. Esse seria um dos grandes projetos que nós pretendemos que seja viabilizado, pode ser com esse financiamento ou com outros financiamentos. Mas projetos que serão viabilizados terão mais ou menos esse perfil: serão grandes projetos estruturantes onde os países e as regiões se encontrarão. No caso da Ferrovia Bioceânica, ela beneficia tanto a China quanto o Brasil e, obviamente, o Peru.

 

Jornalista: Dentro desses países membros dos Brics está a Rússia. Sabemos que a Rússia está recebendo sanções por conflitos como o da Ucrânia. O Brasil tem recebido algum tipo de pressão por essa relação de amizade com a Rússia?

 

Presidenta: Não, nunca recebemos nenhuma pressão. E nós, no Brasil, somos contra qualquer política baseada em sanção. Nós temos uma experiência muito negativa na América Latina, que foi a sanção com Cuba, em que agora se restabeleceram as relações.

Nós não acreditamos que a sanção seja uma solução, em qualquer hipótese. Pelo contrário, a sanção geralmente, ao invés de punir só os governos, pune a população, e isso é inconcebível. Nós, portanto, temos um claro posicionamento em todos os fóruns internacionais contra esse tipo de sanção.

 

Jornalista: Vocês falaram desse assunto durante o Brics?

 

Presidenta: Sim.

 

Jornalista: A Rússia sabe que está respaldada por vocês?

 

Presidenta: Sim. Contra a sanção. Nós não só falamos no Brics como falamos na ONU. Nós não somos a favor das sanções. Não só não somos a favor,como não praticamos. Para citar nosso caso mais próximo: Cuba estava sob sanção há mais de 50 anos, não sei quantos anos, mas por aí. Nós nunca respeitamos esse tipo de sanção. Nós investimos em Cuba, e financiamos o grande Porto de Mariel, em Cuba, um porto de águas profundas. Quero te dizer que não é que somos contra a sanção só verbalmente. Nós tomamos atitudes que mostram que temos consequência no que achamos.

 

Jornalista: Uma pergunta sobre algo que vocês têm em comum com a Rússia: economias que não estão passando por seu melhor momento, por isso essas críticas aos Brics de que talvez quando o grupo foi fundado a situação era muito diferente. Causa preocupação a vocês que a situação atual em seu país possa talvez prejudicar os aportes que tenham que fazer ao Brics?

 

Presidenta: Não, porque a situação do Brasil e, acredito, a da Rússia também, e mesmo a da China, são situações passageiras. Nós agora estamos experimentando os efeitos da crise internacional. Nós conseguimos passar o pior momento. Nós estamos, há seis anos, impedindo que a crise afete o desemprego e afete a renda do povo brasileiro. Mas tem um limite para essa situação. Mas a economia brasileira, ela tem fundamentos sólidos, nós nos recuperaremos rápido. Então, eu acredito que os nossos aportes aos Brics não são afetados por isso.

 

Jornalista: Os aportes estão contemplados, certo?

 

Presidenta: Estão, sem problema.

 

Jornalista: No ano que vem celebrarão as Olimpíadas; a Copa do Mundo já passou. Há [obras de] infraestrutura que possam ser afetadas por essa crise ou não?

 

Presidenta: Não, porque, inclusive, todas estão completamente em dia. Não há a menor hipótese de serem afetadas por isso.

 

Jornalista: O povo brasileiro tem saído às ruas. Sabemos da situação econômica no Brasil. Temos que destacar alguns dados: desemprego de 6%, inflação de 5%, déficit de 10,5 bilhões de dólares. Qual é a mensagem da presidenta para os brasileiros?

 

Presidenta: Olha, o Brasil tem uma das menores dívidas, se comparar com qualquer país. Qualquer país da Europa tem uma dívida, em relação ao PIB, maior que a do Brasil. O Brasil tem dívida na faixa dos 60%. As dívidas dos países europeus, em relação ao Produto Interno Bruto, estão na faixa dos 100%. O Brasil tem uma taxa de inflação que, pelos padrões europeus, é alta, mas ela é alta momentaneamente. Tomamos agora uma medida de proteção ao emprego parecida com aquela tomada pela Alemanha, durante o período de crise, que nós acreditamos que vai ser bastante eficaz, no sentido de segurar o desemprego no Brasil.Então, eu te diria o seguinte: nós queremos sair rápido da crise, e vamos conseguir.

 

Jornalista: Uma última pergunta, presidenta. Seus índices de popularidade têm caído bastante. As últimas eleições também não foram fáceis de ganhar. Dilma Rousseff terminará esta legislatura?

 

Presidenta: Dilma Rousseff vai acabar essa legislatura. Em qualquer país do mundo você tem quedas de popularidade. A minha decorre de uma situação econômica bastante adversa. Eu tenho certeza que isso vai melhorar. E o que importa é, sem sombra de dúvida, que nós estamos trabalhando duro para tirar o Brasil dessa situação de crise. E isso é o que nós vamos ter como nosso foco principal.

 

Jornalista: E com relação a esses golpes “golpes brancos” que... Em muitos países latino-americanos os presidentes dizem que estão orquestrados pela direita, com o apoio dos Estados Unidos. A senhora acha que no Brasil acontece isso?

 

Presidenta: Não, não acho. Acho essa uma teoria conspiratória. Não é preciso nenhum país para que alguns segmentos de alguns países sejam golpistas.Eles são golpistas por si mesmos Não tem nenhum país no mundo interferindo na situação interna do Brasil, hoje.

 

Jornalista:Dilma Rousseff é, sobretudo, uma presidenta ídolo, super-heroína, poderíamos dizer assim, com todo o seu passado. A senhora pôde ser presidenta e colocar o Brasil como sétima economia do mundo. O que lhe falta fazer?

 

Presidenta: Muito. Nunca, num país, você consegue cumprir tudo o que você tem de fazer. Todo dia você tem de lutar para fazer mais. E nós, agora, que estamos nesse momento adverso, temos de trabalhar ainda mais para conseguir que o país saia mais rápido e que nós tenhamos condições de garantir tudo o que o que queremos alcançar. Tiramos 50 milhões de brasileiros da pobreza e os elevamos para a classe média, conseguimos. Somos a 7ª economia do mundo. Nós temos, hoje, US$ 378 bilhões de reservas. Nós somos um país sólido, do ponto de vista macroeconômico. Nós não temos bolha, o nosso sistema bancário é absolutamente robusto. Não há razão para que o Brasil não volte a crescer.

 

Jornalista: Obrigada. É um prazer conhecê-la, e muito sucesso no seu país e também aqui no Brics.

 

Presidenta: Muito obrigada.

 

 Ouça a íntegra (13min34s) da entrevista da Presidenta Dilma