19-12-2017-Discurso do Presidente da República, Michel Temer, durante cerimônia de entrega da Ordem do Mérito Cultural – OMC 2017 - Palácio do Planalto
Palácio do Planalto, 19 de dezembro de 2017
Olha, eu quero cumprimentar, naturalmente, a Marcela, em primeiro lugar. Cumprimentar o Sérgio Sá Leitão, ministro da Cultura,
Cumprimentar os ministros, senadores, deputados e homens e mulheres da cultura que aqui se acham.
E eu vou confessar uma coisa a vocês. Eu estou com um discurso preparado, que é daqueles discursos formalíssimos, não é? Sempre se espera do presidente da República a formalidade absoluta. Mas eu senti - viu, Sérgio? - nesse ambiente tão agradável, tão fraternal e tão construtivo, intelectual e artisticamente, que eu não vou fazer discurso.
Se vocês me permitem, eu vou contar um pouco dos meus desejos desde muito criança, em que eu queria ingressar na área cultural. E tentei em vários momentos. Eu começo contando que, aos nove anos de idade, eu assisti um filme chamado À Noite Sonhamos, que é a vida de Chopin, com Cornel Wilde, Merle Oberon na figura da George Sand, não é? E eu fiquei impressionadíssimo porque o Cornel Wilde, num dado momento, Boni, estava no piano, piano branco, e cai lá uma gota de sangue, tuberculoso que ele ficou. E eu quis, saindo de lá, aprender a tocar piano. Foi a primeira, digamos assim, tentativa de ingresso no mundo cultural.
Mas eu morava numa cidadezinha muito pequena no interior de São Paulo. Tinha 15, 20 mil habitantes. Evidentemente, não se tem nenhuma escola de piano, não é? Eu insisti muito com meu pai e meu pai acabou me inscrevendo numa escola de datilografia. E eu… Mas eu confesso que eu ia datilografar com a minha velha professora, dona Irene, mas eu fechava os olhos e datilografava com os 10 dedos, como se estivesse tocando piano. Foi a minha primeira tentativa. Aliás, eu tenho, com muito orgulho, um diploma de datilógrafo com dez anos de idade, não é? Esta foi a minha primeira tentativa.
A segunda tentativa deu-se quando eu pretendia ingressar no jornalismo, e eu vi que muitos aqui se dedicam a essa atividade. E logo aos 18, 19 anos, estando eu na faculdade de Direito, eu consegui um emprego no jornal Última Hora - me recordo disso - ficava na avenida Prestes Maia. Eu ia lá à noite, das 7 às 11 da noite, mas eu imaginava o jornalismo aquela coisa do jornalista na rua, colhendo dados, notícias, etc, mas logo acharam que eu deveria exercer um papel que até hoje acho que não existe mais, um papel de copydesk. Me botaram com uma máquina de escrever para pegar as reportagens e dar forma definitiva à reportagem. Eu confesso que aquilo acabou me desanimando um pouco porque eu imaginava uma vida mais romântica no jornalismo, não é? E me botaram numa função, digamos assim, burocrática. Então, tempos depois, eu também abandonei essa hipótese.
Depois, mais tarde, bem mais tarde, eu… E eu, lá em Tietê, não havia livraria, mas tinha biblioteca municipal, e eu ia muito à biblioteca e lá pegava os livros de Machado de Assis, José Alencar, Manoel Maria Neto de Macedo, Manoel de Macedo, enfim, todos os autores clássicos daquela época, para fazer leitura. E eu pensava aqui comigo: um dia eu serei escritor, eu vou querer escrever. E, portanto, estaria… seria uma forma de ingressar no mundo da cultura.
Mas, interessante, a vida foi levando de uma tal maneira que eu acabei me formando, fazendo Direito, ingressando numa universidade e me transformei num técnico do Direito Constitucional. Foi uma coisa muito mais árida, digamos assim, do que a atividade de pianista ou jornalista ou de escritor. E assim a vida me encaminhou.
Mas ainda, quando deputado federal, eu, no avião, eu apanhava o guardanapo e escrevia alguns pensamentos, alguns poemas, e escrevia para mim, de mim para mim. Mas um dia, um amigo leu aquilo e me disse: “Olhe, eu acho que você deve escrever isso, publicar, porque” - até ele disse - “você é muito cerimonioso, um jeito quase metálico, isto aqui vai humanizar a sua figura”.
Eu pedi a ele que fizesse - ele era poeta - pedi a ele que fizesse uma apreciação muito verdadeira. Amigo que era, poderia dizer-me: “Olha, arquiva isso daí, não pensa em ingressar na área cultural porque você não tem jeito”. Mas o fato é que ele levou para casa, para ler, se encantou com aquilo e até me disse: “Olhe, se você não tiver quem prefacie, eu apreciaria prefaciar”. Daí eu falei: “Muito bem, vou publicar”. Quando ele mandou o prefácio, foi tão enaltecedor que a minha primeira tentação foi publicar só o prefácio para que os meus poemas não desmoralizassem o prefácio.
Então, estou contando aqui três momentos determinados da minha vida em que eu tentei de toda maneira ingressar na vida cultural. Quem sabe até, Sérgio, se eu tivesse ingressado, quem sabe eu poderia ser um dos agraciados nesse momento. Mas não consegui. A vida levou-me para outros caminhos de modo que é com alegria imensa, com uma recordação, portanto, estou aqui recordando o passado, e isto que essa solenidade me trouxe, eu que com toda franqueza, nos tempos de 15, 16 anos, decorei o Navio Negreiro inteiro, Operário em Construção, de Vinícius, e outras tantas poesias, que eu declamava nas festinhas da faculdade. Não vou me atrever a fazer isso aqui. Mas, tudo isso indica aquela coisa que eu senti hoje dos escritores, jornalistas, produtores, poetas, artistas que aqui receberam o prêmio. Então, ao cumprimentá-los, ao dizer da grande satisfação que eu tenho de ter o Sérgio Sá Leitão como ministro da Cultura. E vocês vejam que eu não precisei falar dos feitos do governo porque ele, no discurso, elencou todos os feitos do nosso governo. Mas soube também postular, em nome da cultura. Portanto, é um bom administrador que defende a cultura brasileira e, por isso, merece um aplauso de todos vocês.
Mas, viu, senadora Martha, como o Sérgio sabe reivindicar, eu, tal como fiz na vez passada, no ano passado, eu prometi a questão do Recine, do audiovisual, e nós realizamos. Eu quero prometer ao Sérgio e a todos vocês que eu vou reverificar o orçamento para a Cultura para aumentar o valor para este ano.
Muito obrigado a vocês.
Ouça a íntegra (07 min46s) do discurso do Presidente Michel Temer