Entrevista concedida pelo presidente da República, Michel Temer, à Rádio Itatiaia - Brasília/DF (14min56s)
Brasília-DF, 09 de novembro de 2016
Jornalista: Presidente Michel Temer, bom dia, obrigado pela presença do senhor aqui na Itatiaia.
Presidente: Bom dia Eustáquio, bom dia a você e a todos ouvintes do Jornal de Itatiaia. Grande prazer, viu.
Jornalista: É um prazer tê-lo aqui como o primeiro veículo de comunicação de Minas Gerais a conversar com o senhor, de forma exclusiva. Presidente, antes da gente entrar nos assuntos propriamente do Brasil, rapidamente eu gostaria que o senhor fizesse uma avaliação sobre esse principal assunto do mundo hoje que é a vitória de Donald Trump, nos Estados Unidos, qual que é a avaliação do senhor, muda alguma coisa na relação Brasil/Estados Unidos?
Presidente: Você sabe Eustáquio, eu tenho dito com muita frequência, que a relação entre o Brasil e os Estados Unidos, assim como os demais países, é uma relação institucional. Ou seja, de Estado para Estado. E nós temos uma tradição democrática - tanto os Estados Unidos, como o Brasil. E evidentemente, quando alguém assume o Poder, seja aqui no Brasil, seja especialmente nos Estados Unidos, onde as instituições são fortíssimas, é claro que o novo presidente que assume terá que levar em conta as aspirações de todo povo Norte-Americano. Eu tenho certeza que lá as coisas irão muito bem. A nossa relação é uma relação institucional. Eu estou mandando cumprimentar o presidente pela eleição, e eu tenho certeza que não muda nada na relação Brasil/Estados Unidos.
Jornalista: Presidente, agora falando dos assuntos aqui do Brasil. Há algum temor do senhor sobre a possibilidade de cassação da chapa Dilma/Temer no Tribunal Superior Eleitoral? O processo apura o recebimento de propina pela chapa nas eleições de 2014. Hoje, inclusive, o Jornal Folha de São Paulo traz uma reportagem informando que a defesa da ex-presidente Dilma envolveu uma suposta propina de R$ 1 milhão de reais, da Andrade Gutierrez, que teria entrado na campanha via PMDB, que é o partido do senhor. E o ministro do Supremo, Gilmar Mendes, declarou ontem que estimativas apontam que a campanha de 2014 do senhor e da presidente Dilma, teve R$ 900 milhões de reais em caixa dois. O que que o senhor pode dizer sobre isso?
Presidente: Primeiro lugar eu quero dizer que não tenho nenhuma preocupação com isso, até porque nós temos sustentado a tese corretíssima de que as figuras institucionais do presidente e do vice-presidente são figuras constitucional e institucionalmente diversas, primeiro ponto. Segundo ponto, a conta, embora apresentada em conjunto, julgada em conjunto, o fato Eustáquio é que elas são apresentadas fisicamente em apartado. E quando se fala em R$ 900 milhões, imagine você o que entrou na conta para campanha do vice-presidente foi R$ 1 milhão de reais, que a empresa veio a nós durante a campanha, ao tesoureiro da campanha, e ofereceu uma colaboração de R$ 1 milhão de reais, espontaneamente. Não tenho nenhuma preocupação com isto. Agora, quero dizer a você, que eu sou e a todos que nos ouve, que eu sou extremamente obediente às instituições. Se um dia, lá para frente, quando todos os recursos eventualmente forem interpostos, o Judiciário decidir no sentido negativo, eu obedecerei imediatamente a decisão do Judiciário. Mas tenho a mais absoluta certeza, a mais absoluta convicção de que isso não acontecerá. Na verdade, eu até lamento. Você mencionou aí agentes do PT, não é? Que teriam dito que uma parte, este R$ 1 milhão dos R$ 900 milhões, entrou na conta do vice-presidente. Eu lamento essa fala porque, evidentemente, a esta altura a vice-presidente não pode ser afastada. Então o que é que fazem aqueles que acham que ainda podem atingir a figura do vice-presidente. Ah, o vice-presidente é responsável, recebeu R$ 1 milhão lá e não disse como recebeu, porque eu estou dizendo que foi espontaneamente concedido à campanha e, portanto, tentam jogar em cima do vice-presidente para ver se o vice-presidente é afastado do Tribunal. Mas isso não acontecerá.
Jornalista: Presidente Michel Temer, o ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha e o ex-presidente da Odebrecht, Marcelo Odebrecht, devem fazer uma delação premiada. Inclusive a do Marcelo Odebrecht já está confirmada. Eles devem fazer uma delação premiada que pode incluir figuras importantes da política, de vários partidos, até do governo. Como é que o governo federal está lidando com essa possibilidade?
Presidente: Com a maior tranquilidade, pelo seguinte: Eu tenho dito, redito, afirmado, reafirmado, que nós precisamos aprender no Brasil que há três Poderes da República: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Esta é uma matéria que cabe ao Judiciário com naturalmente, a participação do Ministério Público, da Polícia Federal, portanto nós não podemos… À vezes me perguntam: "Isto não vai paralisar o governo?". De jeito maneira. Porque, na verdade, o Executivo tem as suas tarefas, não pode paralisar o País por causa disso e o Judiciário está cuidando daquilo que lhe compete. Então o Judiciário está cuidando disso com muita adequação, com muita segurança, de modo que não há porque preocupar-se em relação a isso no tocante ao governo. Quem eventualmente venha a ser incriminado.. E me permita dizer, muitas e muitas vezes a delação, convenhamos aqui, o que que significa a delação? Significa que alguém mencionou o nome de outrem. Quando alguém menciona o nome de outrem, o que acontece é que surge uma investigação. Investigação feita pela Polícia Federal. Subsequentemente a esta investigação, se houver dados concretos, você manda ao Ministério Público, para o Ministério Público propor o inquérito, que significa a continuação da investigação no plano judicial, ou seja, o inquérito visa inquirir, indagar. Quando vai ao inquérito, vamos dizer que seja alguém com foro privilegiado, o Supremo vai aceitar ou não aceitar o inquérito. Se aceitar o inquérito, daí vem a chamada denúncia e daí o Supremo aceita ou não aceita a denúncia. Se aceitar a denúncia é que começa o processo e daí tem razões, contrarrazões, contestações, etc. É um longo processo. De vez em quando me perguntam: "Mas isso paralisa o governo?". De jeito nenhum. Cada um exerce a sua função no nosso sistema constitucional.
Jornalista: Presidente Michel Temer, em relação a ações do governo. Há uma polêmica muito grande no País sobre a PEC, Proposta de Emenda à Constituição do limite de gastos, aprovada na Câmara, já passou para o Senado agora. Vários setores estão insistindo que essa PEC vai congelar investimentos em áreas importantes, como Saúde e Educação. A oposição, inclusive, chama essa proposta de PEC da morte. Como é que o senhor avalia isso, essas críticas?
Presidente: Eu chamo de PEC da vida. Você sabe que vai lá, na sua casa, não sei o quanto você ganha, mas vamos supor que você ganhasse R$ 2 mil reais por mês. Quando você começa a gastar R$ 3, R$ 4 mil, você diz: " precisamos parar um pouquinho, precisamos recompor as finanças". Ora bem, o Estado é mais ou menos, mal comparando, como a sua casa, a minha casa. Nós temos um déficit de R$ 170 bilhões, isso significa quase 70% do PIB. Nas projeções que estão sendo indicadas, se nós não cuidarmos da contenção de gastos, em 2023, 24, será 100% do PIB. Ou seja, o Estado brasileiro irá à falência. Então, a PEC dos gastos, é uma coisa, contenção dos gastos é uma coisa fundamental para o País. Até por uma razão interessante, Eustáquio, as pessoas não lêem a Proposta Constitucional ou tem má vontade, não é? Porque o grande tema é dizer: "Olhe, o teto agora da Saúde vai diminuir; Saúde não vai ter dinheiro; a Educação não vai ter dinheiro". Como se, na verdade, nós tivéssemos assumido o governo para acabar com Saúde e Educação no país. E, mais ainda, eu tenho recomendado que as pessoas leiam o Orçamento que nós mandamos para o ano que vem. E nós mandamos um Orçamento, Eustáquio, como se PEC já tivesse sido aprovada em definitivo. Portanto, admitindo o teto. Mas o teto é geral, não é um teto em função da Saúde, em função da Educação, em função da Cultura; é um teto geral. Então quando você, como fizemos no Orçamento do ano que vem, nós aumentamos as verbas para Saúde e Educação, evidentemente, tendo em vista o teto geral, nós fomos obrigados a tirar de outros setores. Ou seja, nós teremos setores prioritários no governo. Você veja, o Congresso Nacional tem dado um apoio extraordinário, a votação que demandava 308 votos na Câmara, teve 366 votos. Ou seja, o Brasil está preparado, o Congresso, o Executivo, e o país mesmo, para conter os gastos públicos. E é a primeira coisa que se cobra: "Olha aqui, primeiro o poder público viu o que que pode fazer consigo, para depois pensar, vamos dizer assim, em impostos, coisas dessa natureza".
Jornalista: Presidente, mas têm estudiosos analisando a PEC como prejudicial para o Brasil, inclusive eu queria perguntar para o senhor, por exemplo, no ano que vem ou daqui há alguns anos, com esse limite de gastos, vamos citar o exemplo da área de Saúde, se tiver uma grande epidemia, um grande problema de saúde pública no Brasil e houver esse teto de gastos, como é que os recursos podem ser alocados para a Saúde já que haverá esse teto?
Presidente: Quem conhece o Orçamento sabe que podemos alocar mais recursos para a Saúde nesse exemplo que você está dando, não tem nenhuma dificuldade. É claro que, ao alocarmos para Saúde, como o Orçamento é revisável apenas pela inflação do ano anterior, nós vamos ter que tirar de outros setores. Isso não há a menor dúvida. Mas nós não vamos jamais prejudicar Saúde e Educação. Esta é uma coisa falaciosa, então quando você diz: "tem especialistas, que falam isso", Eu posso dizer: "e tem especialistas que falam o contrário". Percebe? Eu recomendo que façam uma leitura dessas matérias.
Jornalista: Presidente Michel Temer, eu quero falar com o senhor agora sobre reforma da Previdência. Tem uma resistência muito grande das centrais sindicais, em relação à proposta, sobretudo em relação a idade mínima de 65 anos para homens e mulheres. O texto vai ser enviado ainda esse ano ao Congresso Nacional? O governo está falando em um entendimento com as Centrais Sindicais, mas poderia ceder em algum ponto, regra de transição, aposentadoria rural? O governo, por exemplo, pretende acabar com a aposentadoria especial, como de professores e policiais, colocar todos na mesma regra? O senhor antecipou que o governo quer igualar a aposentadoria dos setores público e privado. As novas regras vão igualar políticos, por exemplo, especificamente deputados, senadores nessas regras?
Presidente: Vamos igualar a todos, viu Eustáquio. E agora nós temos, como você disse, fortíssimas regras de transição. Essas regras de transição significam que estas coisas serão feitas ao longo do tempo. Porque nós vamos fazer uma coisa, digamos, absorvível que o povo possa absorver, que a classe política possa absorver, mas nós vamos fazer isso. Essa questão da idade, é uma coisa curiosa, você sabe que, ontem eu estive na CNI e fizeram uma pesquisa sobre previdência. A grande parte da população é favorável à reformulação da Previdência, sob o mesmo fundamento, Eustáquio. Se não fizer isso, você viu o que aconteceu no Rio de Janeiro ontem? A questão da Previdência. A Previdência quase quebrou o estado do Rio de Janeiro. O que vai acontecer no Brasil daqui uns anos é exatamente isso. Este ano nós temos um déficit da Previdência de R$ 150 bilhões de reais, nenhum país aguenta isso. Ano que vem serão R$ 180 bilhões. Então, se você não fizer alguma coisa para arrumar a casa, não há como consertar as coisas. E claro, você vai me perguntar: "Mas é uma reforma que vai tramitar tranquilamente?". Eu digo: não. Haverá muita discussão. E como nós vivemos em uma democracia - não é? - às vezes as pessoas pensam que, se o Executivo propôs um projeto, não pode haver modificação nenhuma. Nós vamos propor um projeto e isto vai ser discutido amplamente pelo Congresso Nacional. E o Congresso Nacional vai definir se mantém isso, se mantém aquilo, não mantém.
Jornalista: Ainda esse ano, presidente, será enviado o projeto?
Presidente: Este ano. Enviarei este ano. Agora, evidentemente que a discussão geral e a eventual aprovação será no ano que vem, não é, Eustáquio?
Jornalista: Presidente Michel temer, para a gente encerrar a nossa entrevista, eu queria que o senhor falasse sobre essas ocupações de escolas que estão ocorrendo desde o início do mês de outubro. Principalmente com relação ao protesto dos estudantes é contra a PEC dos gastos, que a gente falou agora Há pouco e a reforma do Ensino Médio. Como o senhor encara essas ocupações, são legítimas, não são? Houve adiamento do ENEM em algumas escolas, por causa dessas ocupações, eu queria uma avaliação do senhor.
Presidente: Nós não damos importância a elas, viu Eustáquio. A pior coisa é quando acontece isso e você dá muita importância. Você veja que, aliás interessante eu estava falando há pouco disso, com o deputado Laudivio, e nós comentávamos um pouco sobre isso - o Laudivio é de Minas Gerais - e nós comentávamos sobre isso. E eu dizia: "Olhe, o pessoal que ocupou, ocupou alguns estabelecimentos de ensino, mas tem 8 milhões e tantos de alunos, praticamente 3 ou 4%, que não puderam fazer a prova". E, em consequência disso, o ministro Mendonça Filho marcou uma nova prova para 3 e 4 de dezembro. Portanto ninguém terá prejuízo, sem embargo, dos chamados ocupantes terem prejudicado muitos que desejariam fazer a prova logo no mesmo dia, isso não tem problema nenhum, nós estamos fazendo uma grande reforma do Ensino Médio, desejada há muito tempo e jamais feita no país.
Jornalista: Mas o senhor é a favor ou contra a essas ocupações presidente?
Presidente: Eu sou contra, evidentemente. Quer dizer, eu tenho dito o seguinte, interessante o Brasil ao invés do argumento oral, do argumento verbal, do argumento intelectual para mostrar: "Olha, aqui está errado por causa disso", tem o argumento físico, então as pessoas ocupam fisicamente, as pessoas entram na escola, se você for perguntar lá exatamente o que é que estão combatendo, quais são os dispositivos do texto legal que estão sendo combatidos, não sei se todo mundo conhece não, viu Eustáquio, é uma ocupação, digamos assim, de natureza física, como eu estou dizendo a você. Por exemplo, as escolas poderiam perfeitamente chamar especialistas para discutir esse tema. Vamos discutir esse tema, ver como é que é etc. Mas não, logo ocupação física e ponto final. Não há mais discussão. Evidentemente eu sou contra, mas tomo um cuidado extraordinário para não dizerem que pelo menos no âmbito federal haja alguma espécie de violência. Nossa pauta é a pauta do diálogo, do convencimento. Convencimento na sua expressão mais correta. Convencer significa: vencer com. Nós queremos vencer conjuntamente com todo povo brasileiro.
Jornalista: Presidente da República Michel Temer, a Itatiaia agradece a entrevista do senhor, a disponibilidade em atender a Itatiaia nesse 09 de novembro, o primeiro veículo de comunicação a conversar de maneira exclusiva com o senhor depois que assumiu o governo, no dia 12 de maio. Obrigado, bom dia para o senhor, boa semana, sucesso no governo.
Presidente: Muito obrigado, um abraço em vocês aí.
Ouça a íntegra da entrevista (14min56s) do presidente da República