Entrevista concedida pelo Presidente da República, Michel Temer, ao Programa Mariana Godoy Entrevista, da RedeTV - Brasília/DF
Jornalista: Olá, boa noite. Nosso programa hoje é um programa especial. Nós viemos até Brasília para fazer uma entrevista com o presidente Michel Temer. Presidente, muito obrigada pela delicadeza e a gentileza de nos receber aqui em Brasília.
Presidente: Eu que agradeço a gentileza do convite, não é? Sabe que eu assisto, muitas vezes, seu programa, e sei que ele tem essa característica de não só tratar dos temas, naturalmente, que interessam ao país e ao povo, mas também tem uma, digamos, uma coisa muito pessoal, que enriquece muito o seu programa. É muito agradável, portanto, participar do programa.
Jornalista: Tem uma certa leveza. A gente vem sem script, sem roteiro. A gente deixa a conversa fluir. Mas eu sei que as pessoas estão muito interessadas em saber que rumos o país vai tomar. Nós acabamos de sair de uma eleição municipal com disputas bastantes acirradas e uma coisa que eu posso destacar, que eu gostaria de destacar com o senhor é que o número de votos em branco, votos nulos e o número de abstenções nas principais capitais como Rio, São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, foi maior do que o número que elegeu o prefeito. O que isso representa, presidente? Como é que o senhor avalia esse comportamento do eleitor?
Presidente: Você sabe que ao longo do tempo, se você fizer a pesquisa dos anos anteriores, também o número de votos brancos e nulos têm sido bastante acentuado. Isso, aliás, traz à pauta exatamente a ideia de que talvez seja preciso fazer mesmo a reforma política e na reforma política, vai entrar em pauta o chamado voto obrigatório ou o voto facultativo. Porque você vê que, apesar do voto ser obrigatório em muitos locais, como você mencionou, vai a 30%, quase 40% de abstenção, voto branco, voto nulo. Então, talvez fosse o caso de começar a examinar a hipótese do voto facultativo, porque aí a pessoa que quer vota, quem não quer não vota. Evidentemente que isso precisa vir acompanhado de uma pregação da cidadania, ou seja, você precisa cada vez mais divulgar pra dizer: olha aqui meu amigo, quando você tem eleição é como se você estivesse dando uma procuração. Você vê: você vai a um advogado, ou você vai a um médico da sua confiança, porque às vezes você vai dar uma procuração ou vai dar a sua saúde para exame do médico. Ora bem, no caso do Brasil, no caso das eleições, você está dando procuração para uma coisa muito mais grave que é dirigir os destinos do país. Seja no caso dos cargos Executivos, ou seja no caso dos cargos no Legislativo.
Então, quando se vai discutir uma tese dessa natureza porque, veja bem, eu tomo a liberdade de dizer que essa sua pergunta induz logo à ideia: será que vale a pena manter ainda o voto obrigatório ou não?
Jornalista: Mas nem tanto em relação ao voto obrigatório, presidente. O que eu fico pensando é o seguinte: é o modelo que está falido? O que está falido é o sistema, é o modelo político? O que é que precisa ser renovado? Precisa de uma reforma política ou os políticos precisam se reformar, mudar?
Presidente: Eu acho, viu Mariana, aqui com muita franqueza, que há naturalmente um mal-estar com classe política, não vamos ignorar isso. E o mal-estar com a classe política gera as mais variadas críticas e, muitas vezes, a crítica vem pelo silêncio vem pela abstenção, pelo voto nulo, não é? Isto nós temos que ter consciência. O que isto nos leva? Nos leva, eu volto ao tema de uma reformulação política do país, primeiro ponto. Mas segundo ponto, sem dúvida alguma, a compreensão da classe política de que tem alguma coisa errada.
Então é preciso refazer os costumes políticos. E o refazimento dos costumes políticos se dá numa discussão, nós vivemos em um Estado Democrático, não é? Se dá por uma discussão que se verifique no Congresso Nacional.
Muitas e muitas vezes eu tenho sido procurado, você sabe que eu passei 24 anos no Parlamento, mas eu tenho sido procurado aqui por líderes que vêm sugerir a eventual participação nossa nessa questão da reforma política. Eu digo: olhe, nós participamos. O Executivo quer que isso aconteça, mas isso tem que tramitar pelo Congresso Nacional. Que é lá que está a representação, digamos assim, mais evidente, do povo.
Jornalista: Porque o povo brasileiro está tão cansado, tão exausto, e vem manifestando isso nas ruas, em ocupações, com manifestações pelas redes sociais, tão cansado. E aí, se depara com a desfaçatez da Câmara de Vereadores, por exemplo, do Rio de Janeiro, que propõe um salário vitalício para os vereadores. Então parece que não há um limite para os abusos. O político tem hoje uma… o brasileiro tem hoje uma imagem do político de alguém que não serve ao povo brasileiro, mas que se serve do povo brasileiro.
Presidente: Se beneficia do mandato, não é?
Jornalista: Se beneficia.
Presidente: Se beneficia do mandato. Para usar essa expressão que é muito corriqueira, você tem que servir ao povo e não servir-se do seu mandato. Eu acho que isto ocorre, eu acho que os políticos têm consciência disso.
Você sabe que tudo isso que está acontecendo, visa exatamente a aprimorar o sistema político. Porque é interessante quando você vai, eu sou da área jurídica e da área legislativa, quando surge uma lei é porque os fatos ocorreram tão repetidamente que num dado momento aquilo tem que se converter em norma jurídica, em norma legislativa.
Eu acho que a classe política toda, sem exceção, tem se apercebido disso. Eu até tomo a liberdade de dar a você exemplos recentes. Você sabe que nós mandamos ao Congresso Nacional uma proposta que limita os gastos públicos.
Ora, numa primeira concepção, e precisamente em face do que você está dizendo, quer dizer, qual é o político que quer limitar os gastos públicos? Porque daí, como é que ele vai lá, arrumar dinheiro para os prefeitos, para a sua base eleitoral, etc. E veja - este é o primeiro sintoma -, veja que nós mandamos esta Proposta de Emenda Constitucional que, sem nenhuma modificação, precisava de 308 votos, teve 366 votos, muito acima daquilo que nós até esperávamos. O que significa isto? Que a classe política está tomando consciência desta realidade que nós estamos conversando aqui. Isso foi em primeiro turno, foi em segundo turno, na Câmara dos Deputados, agora está no Senado, nós vamos aprovar.
Jornalista: O senhor está se referindo à PEC 241, que no Senado vai ser a PEC 55, que é a PEC do limite de gastos. Aliás, sobre essa PEC, presidente, eu tenho aqui uma cópia da carta da CNBB e, se o senhor puder repercutir, também, para as pessoas que pensam, como se manifestou a CNBB, que essa PEC é injusta e seletiva - palavras da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil -, porque não menciona nenhum teto para despesas financeiras como, por exemplo, o pagamento de juros da dívida pública, e que beneficia os detentores do capital financeiro, quando não coloca um teto para o pagamento de juros, quando não taxa as grandes fortunas, não propõe auditar a dívida pública. E, nas palavras, aí usando um pouco de religião, não é, supervaloriza o mercado, em detrimento do Estado. O dinheiro deve servir e não governar. Fica-se a impressão de que é uma proposta que vai tirar dinheiro de coisas sociais, saúde, educação, e vai continuar gastando muito dinheiro com o pagamento de juros da dívida pública.
Presidente: Eu acho interessante isso, viu, Mariana? Me permita interromper. As pessoas acham que este governo é tão desarrazoado que nós todos assumimos o poder para perseguir os trabalhadores, para perseguir os pobres, para acabar com saúde, para acabar com a educação, entendeu?
Veja, o chamado teto dos gastos é um teto geral. Então, você pode gastar, digamos assim, até R$ 100 milhões. Pois bem, mas não existe um teto para a educação, um teto para a saúde, um teto para a cultura, ou o que seja, existe um teto global.
Ora, saúde e educação, só para começar por esse tema, são temas fundamentais para o país, porque são temas importantíssimos para a formação, especialmente para alcançar os setores menos privilegiados do povo brasileiro. Se as pessoas meditassem um pouco, primeiro, se elas lessem a Proposta de Emenda Constitucional, que eu vejo que muita gente não leu, primeiro ponto. Segundo ponto, se eles tivessem o cuidado de parar um pouquinho e dizer: “olha aqui, tem o Orçamento do ano que vem. Vamos ver como é que o Temer fez o Orçamento do ano que vem. Será que ele reduziu verbas de saúde e educação?”, primeiro ponto. Segundo ponto: “será que ele já aplicou o teto dos gastos, como se a Proposta de Emenda Constitucional tivesse sido aprovada?”. Eu respondo logo a segunda questão: nós organizamos um Orçamento para o ano que vem que leva em conta o teto de gastos como se a Proposta de Emenda Constitucional tivesse sido aprovada.
E quando você vai lá, você vê que nós aumentamos as verbas para saúde e educação. Como fazê-lo? Tirando de outras áreas. Se você tem áreas prioritárias, importantíssimas, você tem que privilegiar essas áreas. Você tira de outras áreas para manter o teto geral, primeiro ponto.
Segundo ponto, no tocante aos direitos sociais, é uma coisa curiosa, durante muito tempo se diziam assim: “ah o Temer vai acabar com o Bolsa Família”. Seria me chamar de, me permita expressão forte, de idiota, não é? Porque eu tenho percebido, e nós todos percebemos, que a sociedade é economicamente multifacetada, você tem gente rica, tem gente média e tem gente pobre e gente paupérrima. Na gente paupérrima, nós temos que prosseguir com o Bolsa Família, mas nós não apenas prosseguimos com o Bolsa Família, que não tinha a revalorização há mais de dois anos e meio, e nós revalorizamos em 12,5% o Bolsa Família.
Outro programa, só para desmistificar um pouco isso, o Minha Casa Minha Vida, e veja que eu estou falando de programas do governo anterior. Porque no geral aqui é o seguinte, o governo chega e diz: “tudo que o governo anterior fez não presta”. Eu digo: não! Há coisas importantes que foram feitas que devem continuar. Então, o Minha Casa Minha Vida, por exemplo, nós não eliminamos o programa, ao contrário, nós estabelecemos um número muito grande ainda de casas para este ano, e um número muito mais volumoso para o ano que vem.
“Ah, mas muito bem, tem estudante pobre aí que não pode pagar universidade, e o Temer vai acabar com o financiamento estudantil”. Sabe o que nós fizemos? É que as pessoas, não sei se todo mundo lê jornal. Nós criamos 75 mil novas bolsas de estudo para o financiamento estudantil.
Percebe? Estou dando esses dados para mostrar como realmente nós estamos incentivando tudo isso.
Nós estamos lançando agora, muito proximamente, aliás, acho que estou praticamente lançando, pelo menos oralmente, aqui no seu programa, o chamado “Cartão Reforma”. O Cartão Reforma é um crédito que se dá a gente que mora em casas pequenas, mais pobres, um crédito de cerca de R$ 5 mil. O sujeito quer cimentar a casa, quer aumentar um quarto, quer melhorar o banheiro, qualquer coisa assim, ele tem crédito de R$ 5 mil, que é o Cartão Reforma, de um lado. De outro lado, concomitantemente com o Cartão Reforma, nós estamos lançando um plano de concessão de títulos de propriedades urbano. Você sabe que nessas urbes, lá em São Paulo, por exemplo, em inúmeros ambientes o sujeito não tem título de propriedade.
Jornalista: O senhor está falando nas comunidades mais simples?
Presidente: Sim, nas mais simples, porque quem é rico ou quem é médio tem título de propriedade. Eu estou dando uma exemplificação do que nós estamos fazendo na área social. Com a reafirmação de que nós não vamos prejudicar saúde e educação de jeito maneira…
Jornalista: O senhor está dizendo que precisa ficar desmistificando uma série de coisas que são ditas?
Presidente: Que faz parte da vida. Se nós não autorizarmos que a oposição se manifeste, nós estamos violando os critérios democráticos. Isso não me assusta, não me incomoda. O que eu acho, que eu tenho dito é o seguinte: eu tenho, talvez, dois anos e dois meses de governo. De vez em quando me dizem: “mas, Temer, você pode ficar impopular”. Eu digo: “Não estou preocupado com popularidade, especialmente, se eu enfrentar um dos dramas centrais do Estado brasileiro hoje, que é o desemprego”. Vocês sabe que nós temos 12 milhões de desempregados. Então, o que é preciso? Aqui sim, aqui entro nesse tópico…
Jornalista: Essa PEC do teto de gastos vai ajudar a compor um cenário que favoreça a criação de novos empregos?
Presidente: Seguramente. Porque dá credibilidade ao país, dá confiança. As pessoas percebem… não se fala sempre em cortar na própria carne? O que o governo está fazendo é isso, dizendo: eu não vou gastar mais do que aquilo que arrecado. Olhe, o Estado, Mariana, é como a nossa casa, se você ganhar R$ 2 mil e começa a gastar 3 mil, num dado momento você vai dizer: “olhe, eu vou parar porque eu não posso gastar R$ 3 mil”. Ora bem, nós temos um déficit hoje, no Brasil, de R$ 170 bilhões. Se você não fizer uns cortes determinados, você fica no déficit e isso gera desconfiança do mercado. E daí eu digo a você: por que o mercado é importante? Como é que você gera emprego?
Jornalista: Por que o mercado é importante? Porque eu vi que com a redução de apenas 0,25 na taxa Selic a gente economiza, só em pagamento de juros da dívida, R$ 1,5 bi. Eu pensei: “Nossa, então porque não corta 5 ou 6, ou 7 ou 10?” Então, por que não uma queda maior nos juros da nossa dívida para a gente pagar menos também? Remunerar menos esse capital e, compreendendo, assim, a crítica que algumas pessoas fazem à escolha de onde tirar o dinheiro.
Presidente: É porque você tem que reduzir os juros com responsabilidade.
Jornalista: Devagarzinho…
Presidente: Devagarzinho.
Jornalista: Mas tão devagar?
Presidente: Não, mas… Porque o juro é todo mês, não é? Todo mês você tem uma reunião do Copom, não é? Então, você tem que ir reduzindo aos poucos. E eu tomo muito cuidado em me manifestar sobre isso, porque, embora o Banco Central não tenha autonomia plena, mas ele tem autonomia operacional.
Jornalista: Sim.
Presidente: E no mercado financeiro, se o presidente da República começar a dar palpite, do tipo, vamos dizer que eu dissesse aqui: “não, precisa aumentar, precisa diminuir 5%”, cria um problema no mercado financeiro brutal, gerador até de inflação, que é uma coisa que você tem que controlar. Então, isto vem sendo feito paulatinamente.
Mas eu quero dizer a você que, para você gerar emprego, você tem que prestigiar o mercado, tem que prestigiar a iniciativa privada. Se você não tiver investimentos nacionais e estrangeiros, se você não tiver a indústria funcionando, o setor se serviços funcionando, o agronegócio funcionando, de onde vem o emprego? O emprego vem disso. As forças produtivas da Nação são o empregador, o empresário, e o trabalhador. Essas são as forças produtivas da Nação. Então, você precisa, realmente, incentivar o mercado, fazendo o quê? Dando-lhe credibilidade. Se você não tiver credibilidade do governo, o sujeito não tira dinheiro do bolso para investir.
Olha, Mariana, eu fiz várias viagens agora, com vistas até a trazer investimentos estrangeiros para cá.
Jornalista: Sim, tem uma matéria no Wall Street Journal, que… Foi no Wall Street Journal ou foi no Washington Post? Tinha uma matéria dizendo que o Brasil estava aberto para negócios.
Presidente: É possível, é possível. E nós estamos abertos a isso. Nós estamos o quê? Levando confiança, dizendo: “olha, o Brasil agora tem estabilidade política…”
Jornalista: Além de levar confiança, a gente precisa levar tanto… Por exemplo, no caso dos estados e municípios, há guerra de incentivos fiscais. Então, para atrair uma empresa para o seu município, o prefeito diz que não vai cobrar o imposto municipal tal, ou o estado faz a mesma coisa. Por que tantos incentivos fiscais? O Brasil já não é um lugar para se fazer bons negócios? A gente ainda precisa dar as coisas, oferecer tanto?
Presidente: Não. E eu digo a você: aí você tocou num ponto que é a chamada “guerra fiscal” entre os estados, o sujeito dá uma vantagem aqui para trazer indústrias e empreendimentos lá para o seu estado. Este é um tema que está sendo tratado intensamente, ao longo do tempo. E eu penso até que numa revisão do Pacto Federativo, numa reforma tributária, porque a gente fala sempre na reforma tributária mas, talvez, numa simplificação do sistema tributário, um dos objetivos centrais é exatamente eliminar a guerra fiscal, não é? Acho que você tem razão nesse ponto.
Agora, também - não é, Mariana? -, nós estamos há pouco tempo aqui. Nós vamos fazendo isso paulatinamente, e incentivando exatamente. No seu programa, nós estamos aqui divulgando exatamente as necessidades do país, não é? Então, veja, quando eu digo: “nós precisamos incentivar a iniciativa privada”, eu não digo por conta própria, não. É porque a Constituição brasileira - as pessoas prestam pouca atenção a isso -, a Constituição brasileira determina o incentivo da iniciativa privada para gerar emprego. Está escrito no texto constitucional, não é?
Então, quando nós fazemos isso… Veja bem, nós já falamos coisas aqui, que é, primeiro, tentar reduzir o déficit público; segundo, reduzir, paulatinamente, naturalmente, os juros até para… Você vê o dado, é impressionante, que você deu. Só de 0,25.
Jornalista: De 0,25 a gente economiza R$ 1,5 bilhão por ano, mas a gente paga R$ 600 bi da dívida pública, vai pagar.
Presidente: Então isso tem que vir paulatinamente. Agora, é interessante como a confiança, eu dou um dado a você aqui que eu lançei, que eu registrei lá Conferência de Óleo e Gás, na semana passada, quando reuniram-se vários investidores numa promoção da Petrobras.
Você sabe que nesse brevíssimo período, Mariana, você veja o que é o mercado. A Petrobras, que era uma empresa desajustada, e hoje começa a ficar a ajustada, o valor de mercado dela aumentou 145% nesses poucos meses. A Eletrobras ela aumentou 200.
Jornalista: Ela se recuperou rapidamente.
Presidente: Rapidamente. A Eletrobras o valor de mercado aumentou para 245%; O Banco do Brasil 98%. Isso é fruto do quê? Fruto precisamente dessas medidas que nós estamos tomando. Por isso eu digo a você, eu respeito muitíssimo…
Jornalista: O mercado também trabalha muito com emoção.
Presidente: Claro.
Jornalista: Essa parte de confiança, ela bem subjetiva.
Presidente: Eu respeito muitíssimo a manifestação.
Jornalista: Da CNBB.
Presidente: Claro, sem dúvida alguma.
Jornalista: Mas existe algum projeto, por exemplo, nessa reforma Tributária de algum tributo sobre lucros e dividendos?
Presidente: Nós estamos, veja bem, nós estamos tentando evitar tributo. Porque nós já temos uma carga tributária muito intensa. Você veja que se nós tivéssemos…
Jornalista: O nosso país é um dos poucos países da OCDE que não tributa lucros e dividendos.
Presidente: Isso nós vamos cuidar pouco a pouco. Apenas nós temos muita preocupação com a história da carga tributária. Porque se nós tivéssemos fazendo esse programa há um ano atrás, nós estaríamos falando da CPMF.
Você lembra que a CPMF tomou conta do país? Contra, a favor, federações, empresas, etc, etc. Você, depois que eu assumi não ouviu mais falar em CPMF. Porque nós estamos fazendo um corte nos gastos públicos de molde a impedir exatamente a exacerbação, o crescimento da tributação, não é?
Jornalista: Porque também o povo brasileiro acho que está tão cansado, tão exausto de ver que só paga conta, só paga conta, paga conta.
Presidente: É verdade, tem toda razão. E nós precisamos... Agora também vou lhe dizer, viu, Mariana, essas coisas não se fazem de um dia para o outro. A confiança mesmo é uma coisa que vai aos poucos. Eu, por exemplo, passei quatro meses como presidente interino. É claro que as pessoas olhavam: “será que esse governo vai ficar ou não vai ficar?” Quando se efetivou, isso está completando agora, praticamente dois meses de efetivação, não é? Mas até devo registrar que nesses quatro meses de interinato, eu agi como se fosse presidente efetivo. Porque eu fazia uma distinção entre a figura do presidente da República e a Presidência da República. Ora, quem está exercendo a Presidência da República deve fazê-lo como se fosse um presidente efetivo. Nós fizemos muita coisa. O que nós aprovamos, Mariana, nesse período, no Congresso Nacional… Vou dar um exemplo a você, vou dar um exemplo para você: quando se definiu o déficit fiscal de R$ 170 bilhões, essa matéria foi aprovada às 4h30 da manhã, com quórum no Senado e na Câmara, o que é uma coisa ímpar. O que significa isto? O estrangeiro, o investidor estrangeiro, o investidor nacional, o povo que está assistindo, vai dizer: “olha, esse governo aí tem credibilidade. O pessoal fica lá até as 4h30 da manhã…”, não é?
Jornalista: Está trabalhando.
Presidente: Está trabalhando. Olha aqui, vou lhe dar um outro dado: o Rodrigo Maia marcou o segundo turno dessa Proposta de Emenda Constitucional do teto dos gastos, para uma segunda-feira antevéspera do feriado. E você sabe que aqui, segunda praticamente não tem trabalho. Quando a terça é véspera de feriado, normalmente só coisas suaves. Pois muito bem, ele marcou a proposta, no segundo turno, numa segunda-feira. Na segunda-feira, 485 deputados na Casa para dar a votação do segundo turno.
Jornalista: As as pessoas estão assistindo a TV Câmara,a TV Senado, estão acompanhando com muito mais empenho.
Presidente: Não é verdade? Não é verdade? Então, isso significa o quê? Significa uma interação - e olha, é uma coisa importantíssima o que eu vou dizer: uma integração entre o Executivo, o governo, e o Legislativo, não é? Que é importante, nós vivemos numa democracia, o Congresso tem que ser ouvido, não é?
Jornalista: Presidente, a gente vê também algumas manchetes… Claro que eu sou jornalista e, às vezes, a gente gosta mesmo é da notícia ruim. Mas eu preferia fazer um programa só com notícias boas. E, vira e mexe, a gente ouve falar sobre crise institucional, uma crise entre os Poderes, há uma crise institucional, o Judiciário pode fazer isso, interferir no Legislativo dessa maneira. O senhor é chefe do Executivo. Eu li o livro do Fernando Henrique Cardoso e vi algumas observações que ele fazia sobre lidar com os ministros, os egos, e eu achei muito divertido tudo aquilo. Eu não vou perguntar especificamente sobre alguém em particular mas, assim, como é governar com tantas notícias e nesse momento tão delicado?
Presidente: Eu considero… Não vou exagerar, dizendo que é divertido, mas eu vou dizer que é razoável. Numa democracia, você tem esses conflitos, não é? Conflitos, muitas vezes, que podem parecer até conflitos entre Poderes. Mas eu tenho dito com muita frequência, o seguinte, Mariana, e eu vejo que está pegando, as pessoas falam muito em independência dos Poderes, não é? Mas a Constituição determina: harmonia e independência entre os Poderes. Então, toda vez que há uma desarmonia, o que eu digo é o seguinte: toma cuidado, porque isto é inconstitucional. Se a Constituição determinou a harmonia, quando o Estado foi criado, por que os Poderes têm que trabalhar em conjunto? Porque como um Poder só não pode legislar, executar e jurisdicionar, julgar, criam-se três órgãos no Poder. Mas nós somos todos transitórios. O poder mesmo é do povo.
Então, quando há uma interação dos Poderes… e veja, até lhe digo: na semana passada nós fizemos uma reunião dos três Poderes do Estado para tratar de um tema que também angustia o povo brasileiro, que é segurança pública. Eu disse: olhe, não é possível que só o Executivo trate disso, porque muita coisa depende de lei e muita coisa depende da jurisdição. Falei com a ministra presidente Cármen Lúcia, falei com o Renan Calheiros, falei com o Rodrigo Maia. E fizemos uma reunião muito produtiva a respeito da segurança pública.
Então, quando você me diz: “como é que é isso?”. É trabalhoso, não há dúvida. Mas, acho que para quem respira democracia, para quem respira essa ideia de que os Poderes são harmônicos e independentes, que as pessoas são diferentes, que tem oposição. Quem não suporta oposição não leria jornal, por exemplo, porque todo dia tem uma notícia desastrosa da oposição. É natural isso. Eu administro bem. Eu acho que são coisas que não me incomodam.
Jornalista: O senhor é muito diplomático.
Presidente: Não é que eu seja diplomático, é que a vida pública exige educação, em primeiro lugar educação cívica, não é verdade? E há pessoas desarrazoadas que… aliás, tem um ditado espanhol que diz: “Se quieres conocer a Juanito dale un carguito” . Então, a pessoa tem que saber que aquele cargo que ele ocupa é um cargo que derivou, digamos assim, de uma conjuntura política, ele não foi iluminado por uma centelha divina e Deus veio e colocou. Isso é do tempo do direito divino dos reis. E o direito divino dos reis surgiu por causa disso, quando começaram contestar o soberano os politicólogos de então disseram: "não, olha aqui, o rei não é um representante da vontade do povo, ele é um representante da divindade”. E muita gente pensa dessa maneira. Pensa que chega ao poder e tem absoluta autoridade que logo resvala para o autoritarismo, que é a falta de diálogo.
Quando eu falo do meu governo, eu digo: o meu governo se pauta, fundamentalmente, pela ideia do diálogo. Diálogo entre os Poderes, diálogo entre empresariado, diálogo com os sindicatos, diálogo com os setores religiosos. Acho que fundamentalmente é isso.
Jornalista: Fundamentalmente diálogo e educação, então.
O Brasil está vivendo um ano bastante delicado, tivemos um processo de impeachment, temos um novo presidente até 2018 e algumas das reformas estão sendo feitas por medidas provisórias, por projeto de Emenda Constitucional. Por que a educação do Ensino Médio mudar por medida provisória, presidente?
Presidente: Por uma razão singelíssima, Mariana, que você vai logo entender: você sabe que essa questão da reforma do Ensino Médio, está sendo tratada no Congresso há muitíssimo tempo.
Você sabe que eu fui três vezes presidente da Câmara dos deputados, e a última delas em 2009, 2010, etc. E a todo momento se falava na reforma do Ensino Médio. Até vou contar a você uma coisa muito pessoal, uma coisa curiosa: nós estamos restabelecendo nessa reforma do Ensino Médio, uma coisa que existia no passado.
No passado era assim: quando você ia para as faculdades de ciência humanas - direito, literatura, filosofia, etc -, você fazia o curso Clássico nos últimos três anos do Ensino Médio. Quando você ia para engenharia, medicina, você fazia o curso Científico. Portanto, nos últimos três anos você teria uma especialização de matérias para se preparar para a universidade. Isso acabou ao longo do tempo.
Então quando se falou muito da reforma do Ensino Médio, eu não sou especialista na matéria, mas tenho notícia. Falou-se muito nisso, em recuperar a ideia de você antes de entrar na universidade, você faz uma opção. Então você se especializa mais em certas matérias.
E é interessante que, ao longo do tempo, eu percebia lá o seguinte: projetos e projetos de reforma do Ensino Médio não iam adiante. Quando o Mendoça Filho me falou desse assunto, disse: “olha, presidente, acho que era melhor fazer uma medida provisória”. E essa medida provisória é praticamente cópia de projetos de lei que estão tramitando no Congresso Nacional.
Primeiro, esclarecer certas inverdades. Todo mundo diz: “acabou educação física, acabou aula de artes”. Não é verdade, nos primeiros anos do Ensino Médio você tem regularmente essas matérias.
Agora, que é triste e decepcionante, é saber de gente que está no Ensino Médio e que não sabe somar, não sabe subtrair e, evidentemente, não fala o português. Aí, é complicado. Então você tem que se aprimorar em certas matérias, por exemplo, matemática, português, fundamental. São matérias tidas como obrigatórias, primeiro ponto.
Segundo ponto, eu disse: olha eu vou aceitar fazer por medida provisória porque eu sei que isto vai mobilizar o Congresso Nacional e vai mobilizar em definitivo uma discussão sobre a reforma no Ensino Médio. E você sabe que até ocupação de escola se dão, não é?
Jornalista: Sim.
Presidente: Eu não sei se os rapazes que estão lá, se eles conhecem devidamente o que está sendo feito. Mas não importa, o que importa é que mobilizou o país e, especialmente, mobilizou o Congresso Nacional.
Ainda recentemente eu disse, o Rodrigo Maia trabalha nessa hipótese, eu disse: “olha, se quiserem, está aí a medida provisória em vigor, está sendo debatida, mas como tem projeto de lei lá, quase igual à medida provisória, ao final, se quiserem, botem em votação o projeto de lei, não tem importância nenhuma. A gente tem que ter a paternidade disso, se é por medida provisória ou não. Mas a grande vantagem foi que a medida provisória deflagrou em definitivo uma discussão que vai modificar o Ensino Médio no país.
Jornalista: Sobre as invasões nas escolas, as escolas ocupadas por alunos que protestam contra a reforma do Ensino Médio e também contra a PEC 241, essas invasões vão evitar que quase 200 mil alunos consigam fazer a prova do Enem. E houve até um pedido de adiamento do Enem nacional para que seja mantida uma isonomia. Qual é a sua opinião a respeito?
Presidente: Olha, em primeiro lugar, lamentar que essas escolas ocupadas… Evidente - não é, Mariana? -, o debate pode dar-se no plano da ideia, mas acostumou-se aqui, no Brasil, a debater no plano físico, ou seja, você ocupa escola, você derruba… quebra portas de bancos, você destrói carros, é o argumento físico, quando o argumento há de ser um argumento de ideias.
Evidentemente, a matéria está colocada, todos que estão protestando… e, veja, há pessoas, também, da área de educação que também comentam o assunto. Isto poderia, por exemplo, formatar-se da seguinte maneira: nas universidades, nas escolas, os professores convocariam especialistas para debater com os alunos, etc, etc.
Bom, estou dizendo isso, mas também não dá para vencer essa coisa, digamos, do protesto físico de um dia para o outro, primeiro ponto. Segundo ponto é que são milhões a fazerem o Enem, e o Ministério da Educação já deu uma solução: as escolas que estiverem ocupadas não vai poder fazer o Enem, faz-se o Enem numa outra data. Ou seja, aqueles que hoje são prejudicados pelas ocupações, não o serão, logo pelo dia 2 ou 3 de novembro, de dezembro, perdão, quando em outras escolas, se não estiverem desocupadas [ocupadas], serão feitos os exames do Enem, não é? É a solução que se deu, não tinha outra solução.
Jornalista: Agora, presidente, sobre essa relação de Legislativo e Executivo, o senhor tem uma relação boa agora, com o Rodrigo Maia. O senhor é favorável que ele continue na presidência da Câmara?
Presidente: (incompreensível) perguntou. Você sabe que eu tomo muito cuidado nisso, não é? Porque eu tenho uma base…
Jornalista: Porque qualquer palavra do presidente… não é?
Presidente: E eu tenho uma base parlamentar, hoje, de cerca de 18 partidos. Então, eu tomo muito cuidado, porque eu quero a integridade, a indenidade dessa base parlamentar, para que nós possamos aprovar, como estamos aprovando, os projetos indispensáveis ao país, que gerem emprego, que gerem crescimento, não é? É isso que nós estamos fazendo.
Jornalista: Então, não é que o presidente não queira falar alguma coisa, ele não pode ferir susceptibilidades também, não é? A gente tem que lembrar que esse programa vai para o Brasil inteiro, gera aspas, gera manchetes. Então, a gente tem que ser muito cuidadosos aqui nas colocações.
Presidente: Eu sempre luto pelo seguinte, até como eu sou muito amigo dos líderes e de todos, não é? Eu digo: olha se vocês conseguirem fazer uma candidatura única, seria o ideal para a Câmara dos Deputados, para o país e, naturalmente, para o governo.
Jornalista: Então vamos falar agora sobre a reforma na Previdência? Por que o senhor mencionou o rombo no Orçamento, a Previdência também tem uma previsão de rombo. E a Previdência é um assunto também delicado, porque ele envolve diferentes beneficiários desse patrimônio. Tem, também, uma diferença muito grande entre o trabalhador normal e os funcionários públicos e os militares.
Eu gostaria que o senhor falasse um pouco sobre a discrepância que existe entre essas contribuições e depois benefícios. E se o brasileiro que hoje está trabalhando e que no futuro próximo virá a se aposentar, pode ficar tranquilo de que ele vai ter uma renda compatível com uma vida digna depois de tantos anos de trabalho.
Presidente: Bom, o primeiro ponto, não é Mariana é o seguinte: não adianta você manter o sistema atual, para que daqui a cinco ou seis anos, aqueles que hoje estão trabalhando e se aposentem e os que já se aposentaram, venham bater às portas do poder público e poder público diga: não tenho como pagar. Aliás, uma circunstância, eu não estou falando apenas palavras, estou falando coisas concretas. Você veja o que está acontecendo em vários estados da federação brasileira.
Jornalista: Rio Grande do Sul, quebrado. Rio de Janeiro, quebrado.
Presidente: Sabe pelo o quê? Pela Previdência. Porque o sujeito vai receber o salário e não consegue receber; Vai receber a pensão e não consegue receber. É fruto do quê? Do déficit acentuadíssimo da Previdência, não só nos estados, como na União Federal.
Então, eu confesso a você que o último projeto da Previdência ainda está sendo montado pelos técnicos e não me foi apresentado em definitivo. Quando me for apresentado em definitivo, eu vou verificar o que eu mantenho, o que eu não mantenho. Mas certas coisas...
Jornalista: Está incluído nesse estudo também a aposentadoria dos políticos?
Presidente: Igualmente, essa até vou responder a você. Nós vamos parificar, nós vamos assemelhar, nós vamos tornar iguais tanto a Previdência geral, que diz respeito aos trabalhadores, como a Previdência pública. Porque você sabe que há uma diferença até de idade no tocante ao setor público e o setor privado. E de igual maneira em relação à classe política. Eu volto mais uma vez a dizer: veja como a classe política está se modificando, ela tem consciência disso hoje, é uma coisa que eu posso dizer com toda tranquilidade, sem que isso, digamos, atrapalhe o nosso governo.
Então vai haver essa parificação, primeiro lugar. Segundo lugar…
Jornalista: O mesmo teto?
Presidente: Certamente será. Agora, outro tema é o tema da idade. Este eu posso avançar um pouquinho porque, evidentemente, é preciso ter uma idade mínima. Agora, nós não queremos violar direitos de quem já os adquiriu. Não vai haver isso. O que pode haver - é uma hipótese que está sendo levantada - é o seguinte: quem tem menos de 50 anos de idade e está trabalhando, talvez venha a ser alcançado por um limite de idade. Vamos dizer 65 anos, estou apenas figurando e exemplificando. Mas quem tem mais de 50 anos vai ter uma regra de transição. Então, o sujeito teria que trabalhar mais 15 anos, mas ele pode se aposentar daqui há oito anos. Então, muito bem, em tese faltariam sete anos. Muito bem, esses sete anos vão representar uma faixa de transição em que ele, ao invés de mais 7, ele vai trabalhar mais sete anos e cinco meses, quatro meses, uma coisa mais ou menos assim. Para quê? Para que seja uma coisa que não agrida o indivíduo, mas que possa preparar o futuro. Porque no futuro, eu volto a dizer a você, se nós não fizermos esta reformulação, que tem outros dados, você não vai ter dinheiro para pagar aposentado e, de repente, você não tem dinheiro para pagar salários.
E acrescento mais: os países europeus que eu visitei, que estiveram comigo, todos eles já fixaram idade. Portugal, esteve comigo aqui o primeiro-ministro e o presidente agora semana passada, lá é 66 anos, idade mínima. Eu, pessoalmente até quero ver se faço uma pequena diferença - coisa que não tem sido feita nos demais países - entre o trabalho do homem e o trabalho da mulher, a idade do homem e da mulher, por causa do tal 3º turno, porque a mulher sempre tem um trabalho extra na sua casa.
Jornalista: E tem mesmo, no Brasil principalmente.
Presidente: E tem, claro, claro, claro. Então, eu estou muito atento a isso. Mas não me trouxeram ainda o projeto definido. Quando me trouxer eu vou examinar e vou mandar para o Congresso.
Jornalista: Quando trouxer, é muito importante... esses esclarecimentos são muito importantes com o público, detalhe por detalhe, porque são coisas que tiram a esperança das pessoas.
Presidente: E você sabe que embora possa ter resistências, e terá, mas você precisa asfaltar o terreno. Então, antes de mandar a reforma da Previdência eu quero chamar, por exemplo, as centrais sindicais, que normalmente são contra. Mas eu quero chamá-los, conversar com eles, eu tenho um bom diálogo, quero mostrar que é fundamental para o país. Depois, quero chamar os líderes da Câmara e do Congresso. Quero divulgar pela imprensa, naturalmente, explicar o que é a Previdência.
Jornalista: Presidente, uma aposentadoria de um político é mais de sete vezes maior do que a média da aposentadoria de um brasileiro normal.
Presidente: Mas isso vai mudar. Eu sei.
Jornalista: Então, esse tipo de diferença é que revolta mesmo o povo brasileiro.
Presidente: Está claro e está certo. Tanto que nós vamos reformular isso. Nós vamos reformular, e volto a dizer a você: com a compreensão da classe política.
Jornalista: O Brasil tem uma expressão, eu ouvi há pouco, eu não conhecia: “isso é uma jabuticaba”. Porque jabuticaba é uma frutinha que só existe no nosso país, então tem algumas coisas que só acontecem no Brasil e aí dizem: “isso é uma jabuticaba”. A Justiça do Trabalho é uma jabuticaba brasileira, ela só existe no Brasil? A Justiça do Trabalho, ela cria algumas distorções tão grandes. E, além da Justiça do Trabalho, os funcionários públicos, especificamente os do Judiciário. Eu soube, por um blog, por um site de notícias, que uma servidora do Judiciário, na Bahia, que é uma recepcionista que tem um salário médio de R$ 5 mil, conseguiu uma aposentadoria de R$ 27 mil. Se esse tipo de situação continuar, o Judiciário também quebra o Brasil.
Presidente: Claro, não tenha dúvida disso. E o Judiciário sabe disso. Você sabe que a ministra, a presidente Cármen Lúcia tem essa preocupação, nós já pudemos conversar sobre isso. E este é um tema, digamos, geral, no Brasil. Há certas distorções… Você está dando um exemplo que, na verdade, é uma distorção, não é?
Jornalista: É uma distorção, é.
Presidente: Há outras tantas distorções, não é?
Jornalista: Mas elas acabam criando um precedente, abrindo um precedente judicial. Imagine se outras pessoas conseguirem o mesmo…
Presidente: Claro. E por isso que nós precisamos harmonizar esse sistema. Quando eu digo da parificação entre as várias categorias, eu estou exatamente tentando, nós estamos tentando impedir isso, exemplos dessa natureza, para acabar com as jabuticabas.
Jornalista: Para acabar com as jabuticabas. A Justiça do Trabalho custa para o Brasil, no mesmo período em que ela pagou R$ 8 bilhões em benefícios para os trabalhadores que estavam entrando na Justiça, ela custou aos cofres públicos R$ 17 bilhões. Não há aí, também, uma conta que ser refeita, uma coisa na ponta do lápis?
Presidente: Eu li essa notícia, sabe? Mas…
Jornalista: Foi um comentário no final da revista Veja, foi o JB, não foi? Foi o Buzo, foi.
Presidente: José Roberto Buzo. Agora, o que acontece é o seguinte: também você não pode, digamos, evitar, primeiro, o litígio trabalhista, é difícil você evitar. Segundo, que não haja um órgão incumbido de resolver esse litígio. Eu acho que a Justiça do Trabalho presta um relevante papel. Eu não posso comentar esses dados, porque eu não tenho esses dados, digamos, orçamentários, do Judiciário. É claro que se pode caminhar para um sistema de arbitragem na Justiça do Trabalho, quem sabe diminui esse curso, não é?
Jornalista: É que o senhor sabe que o que vira notícia é o que está fora da curva, não é? Saiu fora da curva vira notícia, vira comentário e ganha mais atenção.
Presidente: Porque hoje também tem uma coisa, você sabe que o trabalhador pode fazer o acordo no sindicato. Então, muita coisa não vai mais para o Judiciário, o trabalhador e o empresário fazem acordo no próprio sindicato. É uma coisa útil.
Jornalista: A gente pode aproveitar e falar da flexibilização das leis trabalhistas, porque assim já desmistifica, também, algumas outras crenças. Porque eu acho difícil das pessoas não compreenderem que isso vai, sim, gerar novos empregos.
Presidente: É evidente, está nos nossos planos. E está nos nossos planos, é interessante, nós… Até eu quero registrar um fato. Eu cheguei ao governo pautado por um projeto que nós elaboramos quando era presidente do PMDB. Nós lançamos um documento chamado “Uma ponte para o futuro”, que trata de todos esses temas que nós estamos tratando aqui. Entre eles, a reforma, ou a readequação trabalhista.
E é interessante, veja como as ideias são importantes, viu Mariana, porque ao longo do tempo o que se verificou é o seguinte: primeiro, já há dois acórdãos do Supremo Tribunal Federal permitindo a negociação coletiva, convenção coletiva sobre o legislado. Quer dizer o acordado sobre o legislado, não é?
Jornalista: Vale mais o que ficou combinado do que o que está escrito na lei?
Presidente: Pronto. Outra coisa, você sabe que nos últimos tempos a própria senhora ex-presidente, ela editou uma medida provisória para garantir o emprego e foi muito adequado. O que dizia essa medida provisória? Para manter o emprego o empregador poderia reduzir o salário em 30% desde que o empregado, o empregado quer dizer, a convenção coletiva entre empregados e empregadores aceitasse.
Qual é a vantagem desse sistema, ou qual foi a vantagem desse sistema? O primeiro foi manter o emprego. Não há coisa mais indigna do que o sujeito perder o emprego. Segundo, é que você garante a arrecadação, porque quando o sujeito sai do emprego não tem mais a contribuição previdenciária, por exemplo. E, terceiro impede gastos para o poder público. Porque se ele se desemprega, tem que pagar o seguro-desemprego.
Então foi uma medida muito adequada. E o que era isso? Era o acordado sobre o legislado. Nós queremos, digamos assim, solidificar, concretizar isso que vem sendo feito paulatinamente. E, olha, com toda franqueza eu acho que é muito fruto dessas ideias que nós pregamos no passado por meio da chamada “Ponte para o futuro”.
Mas também deixa eu dizer, essas coisas, você precisa fazer uma coisa de cada vez, não dá para fazer tudo de uma vez, não é?
Jornalista: Só se a gente estivesse numa monarquia.
Presidente: É, daí sim. Ou em regime ditatorial.
Jornalista: Presidente, vamos falar um pouco sobre privatizações. Essas oportunidades de negócios no Brasil incluem também privatizações? O que seria privatizado?
Presidente: Olha, nós temos a ideia de privatizar muita coisa. É preciso levantar os imóveis da União. Por exemplo, eu sei que o INSS, por exemplo, tem inúmeros, mas muitíssimos imóveis inteiramente não utilizáveis. Eles podem perfeitamente ser passados para a frente.
Jornalista: Prédios.
Presidente: Prédios. Primeiro ponto. Segundo ponto, nós estamos trabalhando muito nas chamadas concessões, não é? Eu criei até uma secretaria executiva especial, dirigida pelo Moreira Franco, para cuidar das concessões. E a essa altura nós já colocamos 34 órgãos para serem concedidos, sendo que quatro deles já estão praticamente ajustados para serem concedidos.
As linhas de transmissão - eu vou dar uma notícia -, as linhas de transmissão foram leiloadas agora, há uma semana, 10 dias atrás, e o Fernando Bezerra Filho me ligou no dia do leilão, eram 24 linhas de transmissão, felicíssimo…
Jornalista: Linhas de transmissão de energia.
Presidente: É, de energia. Dos 24, 21 foram leiloados. Deu R$ 11 bilhões e 600 milhões. Tudo isso ajuda o nosso Estado, não é? Então, eu quero muito, nós queremos muito fazer as concessões, ou onde for necessário privatizar, nós vamos privatizar. Evidentemente, eu não estou falando de saúde, segurança, educação, não é? Mas onde for possível privatizar, nós vamos privatizar. E o mais, nós vamos conceder.
Jornalista: E o senhor pensa, o governo pensa em privatizar o Aquífero Guarani, por exemplo?
Presidente: Não, isso… Há estudo sobre isso, viu? Mas eu não tenho, ainda, uma convicção sobre isso. E nem tenho estudos finais, não é?
Jornalista: Grandes áreas de terra no Brasil para serem exploradas por mineração. Por exemplo, a gente tem uma enorme reserva de Nióbio no Norte do país, poderiam ser privatizadas, também?
Presidente: Podem ser concedidos.
Jornalista: Podem ser concedidos.
Presidente: Concedidos, perfeitamente.
Jornalista: Algumas pessoas se ressentem do fato de estrangeiros poderem adquirir grandes proporções de terra brasileira.
Presidente: Não sei, sabe que está sendo estudado aqui no governo. Eu, pessoalmente, não tenho objeção, desde que você tenha instrumentos reguladores dessa utilização porque, evidentemente, o estrangeiro que comprou, ele não vai, um dia, pegar a terra e levar para o seu país, não é? Não é possível. Fisicamente é impossível.
Então, com a regulação adequada, eu, pessoalmente, não tenho objeção. Isso até derivou, Mariana, de um parecer dado, há tempos atrás, pela Advocacia-Geral da União que, de alguma maneira, impediu a aquisição de terras por estrangeiros, não é? Mas se você tiver uma regulamentação adequada, não há objeção.
Jornalista: Presidente, falando de estrangeiros e de terras, a gente pode falar um pouco sobre os nossos vizinhos. Mas eu gostaria de comentar com o senhor, já que a gente falou também sobre alguns boatos e algumas informações que circulam pelas redes. A advogada que teve um papel de bastante proeminência durante o processo de impeachment, a advogada Janaína Paschoal, se manifestou nas redes sociais preocupadíssima com a instalação de uma base russa na Venezuela, e com o Putin estar tão próximo do Brasil e até, possivelmente, para uma invasão. De onde vem esse tipo de medo?
Presidente: Eu acho que, com todo respeito, é uma coisa que… é claro que eu respeito a opinião, primeiro lugar. Segundo lugar, isso ainda é, digamos, é quase boato. Não há nada, que eu saiba, não há nada concreto em relação a isso. Em terceiro lugar, a Rússia também mudou muito.
Eu, recentemente na reunião dos BRICS, tive a oportunidade de sentar-me ao lado dele, eram cinco chefes de Estado, eu me sentei ao lado dele e verifiquei uma coisa curiosa, Mariana: a situação da Rússia é muito parecida com o Brasil. A dívida bruta, por exemplo, da Rússia, equivale a 69% do PIB. O déficit fiscal equivale a 1,7% do PIB. Nós aqui, representa 70%, a dívida bruta, do PIB, e cerca de 1,88 o déficit em relação ao PIB. Então, ele se interessou muito… até registro um fato: ele sabia da PEC do teto dos gastos, perguntou muito sobre… sabia que foi aprovada por uma significativa maioria e teve muito interesse nisso. Eu até estou mandando traduzir para o russo a PEC dos gastos para mandar para ele. Ou seja, a Rússia, não sei se instalada lá, e invadiu o Brasil, mas essas coisas são complicadas, eu acho que não. Enfim, pelo menos não temos essa preocupação.
Jornalista: O Brasil com seu governo mudou de posição em relação à Venezuela, antes uma posição de distanciamento, até por razões diplomáticas, talvez, ou ideológicas, mas agora de uma posição um pouco mais crítica.
Presidente: É. Aí houve o seguinte: quando nós assumimos o governo, nós designamos o José Serra para o ministério, mas logo eu disse: eu quero universalizar as relações do país. Nós não podemos segmentar as relações por critérios ideológicos ou por critérios físicos. Nós tínhamos aqui uma relação com alguns países, não sei, tenho impressão que nos distanciávamos um pouco de outros países. E eu disse: “bom, primeira coisa, nós vamos universalizar as relações do Brasil, como convém a qualquer país”, primeiro ponto. Segundo ponto, no caso da Venezuela o que houve foi uma reunião, isto eu conversei com o presidente Macri quando estive na Argentina, e ele também quando esteve aqui, com o presidente do Uruguai, com o presidente do Paraguai. O que acontece é que, para ingressar no Mercosul plenamente, é preciso cumprir determinados requisitos. E a Venezuela entrou sem ainda haver cumprido plenamente esses requisitos. Daí porque houve uma, digamos assim, uma insurgência dos demais países do Mercosul, mas que se restringiu a isso: olha aqui, se a Venezuela cumprir esses requisitos até dezembro, muito bem, será admitida como membro pleno do Mercosul.
Agora, o Brasil tem muita preocupação com o que acontece na Venezuela, até porque tem repercussão aqui. Você sabe que o número de venezuelanos que tem vindo aqui para o Brasil é muito grande. Em primeiro lugar para adquirir mantimentos, etc. E nós até tivemos uma preocupação humanitária. Você sabe que nós oferecemos remédios para a Venezuela, e é interessante, não foi admitido.
Jornalista: Sério?
Presidente: É, não chegou a ser admitido. Até o Serra depois…
Jornalista: Houve uma recusa da oferta de remédios?
Presidente: É. Depois o Serra procurou aquela entidade, a Cáritas, para ver se por meio da Cáritas seria possível… é uma ajuda humanitária. Portanto, o Brasil está preocupado sob o foco humanitário, o foco humano, e sob o foco político. Nós queremos que haja tranquilidade absoluta na Venezuela. Isso é o que nós desejamos.
Jornalista: Sob o foco humanitário, o Brasil recebeu, depois do terremoto no Haiti, recebeu muitos refugiados de um desastre natural, mas recebe, também, refugiados da guerra na Síria. Vai continuar recebendo da mesma maneira?
Presidente: É verdade. Continuará. Na conferência da ONU onde eu tive oportunidade de me manifestar, fazer um discurso, eu disse claramente que nós estávamos recebendo refugiados haitianos, naturalmente, da Síria. Refugiados haitianos é de desastres naturais. Há uma certa dificuldade de compreensão, acha que refugiados é só quem foge da guerra. Mas enfim, são pessoas que vêm para o Brasil. E que nós já tínhamos recebido cerca de 2.500 refugiados sírios e que já abrimos a hipóteses de receber mais 3 mil imediatamente.
Ainda agora eu recebi um cardeal patriarca da igreja síria e ele, aflito com a situação da Síria, e perguntando se nós poderíamos receber mais refugiados, além de naturalmente pleitear que o Brasil lute pela paz na Síria. Eu contei exatamente esse episódio a ele. Acho que o Brasil tem feito um bom trabalho em matéria de proteger aqueles que tentam se refugiar no país.
Jornalista: Bom, sob esse cenário que a gente montou aqui em uma das salas do Palácio do Planalto, que tem essas lindas peças que vêm do Vale do Jequitinhonha, representando as mulheres, as mães brasileiras. A gente vai fazer mais um intervalo e volta no próximo bloco para falar um pouco sobre a situação da mulher no Brasil e para conhecer um pouco melhor o lado pessoal do presidente Michel Temer.
E a gente volta com a entrevista exclusiva com o presidente Michel Temer, esta semana em Brasília, aqui o Programa Mariana Godoy Entrevista.
A gente estava falando, presidente, sobre as relações com outros países. E eu vou perguntar: para o Brasil, o que seria melhor, uma vitória de Hillary ou de Trump? Porque acho que vem aí Donald Trump presidente.
Presidente: Pergunta difícil, não, Mariana? Pelo seguinte: porque a relação nossa com os Estados Unidos, como qualquer outro país, é uma relação institucional, de país para país. Então fica difícil ter, o presidente da República ter preferências por um ou por outro. O que nós queremos é que, eleito quem seja, que a relação com o Brasil seja uma relação produtiva. Agora, evidentemente, que nós sempre procuramos estabelecer diálogos democráticos, onde houver participação por meio do diálogo acho importante para o país. Mas é a única consideração que eu posso fazer. No mais, é uma relação institucional.
Jornalista: O senhor acredita que o Donald Trump possa ganhar? Porque assim, as pessoas acham que é tão... seria tão impossível, mas ele está empatado, praticamente empatado nas pesquisas, até aparece um pouco a frente em algumas pesquisas. Nada é impossível nas eleições.
Presidente: Nada é impossível, não é? Às vezes a gente não consegue dizer nem quem vai ganhar aqui em uma eleição municipal. Fica difícil dizer quem vai ganhar lá, não é?
Jornalista: Então, por falar em aqui, em Brasil, seria possível que o senhor fosse candidato em 2018 para dar continuidade ao trabalho que vem fazendo?
Presidente: Não. Eu tenho dito com frequência que eu quero é produzir um bom trabalho nesses dois anos e dois meses, colocar o Brasil nos trilhos para que quem venha depois possa encontrá-lo nos trilhos. Essa é a única coisa que eu quero.
Jornalista: Então se o senhor vai fazer um bom trabalho, colocar o Brasil nos trilhos, depois vai entregar de bandeja para qualquer um? PMDB vai ter um candidato em 2018?
Presidente: Aí eu já não sei. Aí nós vamos esperar. Eu nem quero antecipar isso, porque nós temos que esperar é 2018. Você vê, a eleição é em outubro de 2018.
Jornalista: Quanta coisa muda em dois anos, não?
Presidente: Pois é, veja bem, como é que nós vamos antecipar? Porque isso prejudica o país. Antecipação dessa discussão é prejudicial para o governo e para o país. Então o que eu posso…
Jornalista: E às vezes até para os nomes que a gente for falando, porque aí já começa o bombardeio.
Presidente: Até para os nomes. O sujeito vai sendo queimado, não é? Ao longo do tempo. É melhor ficar em silêncio.
Jornalista: Mas eu precisava perguntar, não é? O senhor é parlamentarista. Muito dos políticos com quem eu converso são parlamentaristas, as pessoas que mais estudam o sistema de governo acreditam que esse seria um sistema mais fácil de governar o país. Será que há possibilidade de entrarmos nessa discussão, também?
Presidente: Eu acho que é possível. Como você acabou de dizer, há muitos agentes políticos que são parlamentaristas. Você pode discutir numa reforma política, quem sabe para aplicar em 2018, ou quem sabe até em 2022, você pode discutir esse tema.
Eu acho que isso aí resolve. Você veja o caso do impedimento agora há quatro, seis meses atrás, foi traumático. As pessoas litigaram demais, discutiram demais, não viram com naturalidade aquele impedimento. Porque as forças políticas se antagonizam.
No parlamentarismo não, se acontecer um desastre com o governo, você muda o governo com a maior tranquilidade, não há objeções que ocorrem no presidencialismo. Até porque, é interessante, nos Estados Unidos isso não acontece. Nos Estados Unidos, como as instituições são muito sólidas, quando acontece alguma coisa para o presidente, ninguém imagina discutir que o vice-presidente não pode assumir, isso deixaria qualquer americano corado, vermelho. Aqui não, aqui sempre há uma crise, sempre foi assim na história do Brasil. Então, no parlamentarismo você tem soluções naturais. E eu acho que seria útil para o país.
Jornalista: A gente está com essas imagens bonitas aqui, representando as mães brasileiras, eu gostaria que o senhor desse uma mensagem também de esperança para as mães, para as mulheres que cuidam dos filhos pequenos, para quem trabalha, para o trabalhador brasileiro.
O senhor mencionou, agora há pouco, as dificuldades de governar e o trauma que foi o processo de impeachment, o seu governo também está sempre... o seu governo não, qualquer governo estaria. Nós temos no país, hoje, a Operação Lava-Jato com vários políticos presos, com outros citados, alguns indiciados, a iminência, talvez, de o presidente do Senado vir se transformar réu em algum processo, porque são 11 contra ele no STF, Eduardo Cunha que já foi presidente da Câmara preso. Como é que é governar o país com a Operação Lava-Jato no calcanhar?
Presidente: É muito fácil, você sabe que a Lava-Jato, ela tem essa denominação que é uma, enfim, o nome que se deu a ela, mas ela se passa no Judiciário e no Ministério Público, não tem nada a ver com o Executivo. Se nós formos dar atenção à Lava-Jato, quer dizer, “o governo precisa paralisar porque tem um processo contra fulano, beltrano, etc”, você está prestando um desserviço ao país, e está violando, mais uma vez, estou sendo repetitivo, o princípio da separação de Poderes. O Executivo não tem que interferir nessa matéria, o Legislativo não tem que interferir nessa matéria, porque essa é uma matéria do Judiciário. Tanto que tudo se passa, seja no Supremo Tribunal Federal, ou seja no Juízo de primeiro grau, mas é no Judiciário. E o agente provocador é, muitas vezes, o Ministério Público, que tem essa função. Então, nós devemos, isto é uma coisa importantíssima, Mariana...
Jornalista: O senhor mantém a tranquilidade, a serenidade.
Presidente: Precisa. Porque senão você vai paralisar o governo: “ah, porque fulano de tal, porque fulano disse isso, beltrano disse aquilo”, não é?
Jornalista: É, mas capa de revista: delação da Odebrecht mantém os políticos de cabelos em pé. Eduardo Cunha vai delatar ou não? Quer dizer, é o meio do...
Presidente: Tudo bem. Quando alguém delatar e a delação for comprovada, muito bem, as coisas se consolidam. Mas vou dizer a você, entre a delação, a delação significa, alguém disse uma coisa de outrem, só isto. Porque, a partir daí, você tem processos que começam com uma investigação, você tem um inquérito, que é para inquirir, para indagar. Depois da investigação, você tem o recebimento da denúncia ou não recebimento da denúncia. Se recebida a denúncia, você tem defesa, contra defesa, acusação, aquilo leva anos para decidir. Como é que você vai paralisar o país porque um sujeito foi depor e disse: “ah, eu arrumei um dinheiro para fulano de tal”. “ah, então vamos para o país”. Não pode. Realmente, nós, o povo brasileiro, nós temos consciência disso. O Judiciário vai cumprir seu papel, o Ministério Público cumpre seu papel e o Executivo e o Legislativo vão cumprir o seu papel.
Jornalista: Qual é o país que o senhor deseja para o seu filho, para sua esposa criar o Michelzinho? Qual é o país que o senhor deseja para o Michel, quando ele for um adulto? Que Brasil o senhor imagina?
Presidente: Um país em que, em primeiro lugar, ele tenha emprego, que ele tenha chance de trabalhar, primeira coisa. Que muitos lamentavelmente, hoje, não estão tendo essa chance. Em segundo lugar, um país pacificado, porque você veja que, de uns tempos para cá, violando até o espírito do brasileiro, porque o brasileiro é muito conciliador, não é verdade? De uns tempos para cá, começou a haver uma divisão no país entre A, B, C, etc, que é uma coisa ruim para todos nós.
Jornalista: Ah, isso é um fenômeno mundial.
Presidente: Heim?
Jornalista: É um fenômeno mundial.
Presidente: Eu não acho que seja não, viu.
Jornalista: Essa polarização, essa coisa de direita.
Presidente: Mas é uma polarização política. Aqui há uma polarização, digamos assim, raivosa, não é? Isto é que é ruim para o país. O que eu quero, portanto, quando você pergunta, lá no futuro, eu quero um país pacificado, que as pessoas se entendam, as pessoas argumentem, contra-argumentem, controvertam lá as suas ideias, mas que seja isto, um país pacificado. Eu vou lutar muito para isto. Aí eu falo sempre nessa história, as pessoas que não levam muito a sério mas, quem sabe, pregando bastante, as pessoas dizem: “puxa, é preciso mesmo, precisa ter harmonia, tranquilidade”.
Jornalista: A gente veio para Brasília, está no Palácio do Planalto. O Palácio do Planalto é o lugar onde o presidente trabalha. Agora aonde é que o senhor vive aqui em Brasília? Ainda está no Palácio do Jaburu?
Presidente: Estou no Jaburu ainda.
Jornalista: Vai ficar no Jaburu ou vai para o Palácio da Alvorada?
Presidente: Não, você sabe que para mim tanto faz ficar no Jaburu ou ficar no Alvorada, mas realmente as pessoas têm me falado o seguinte: olha, você morar no Alvorada tem uma certa simbologia. O presidente da República mora no Alvorada. Eu tenho... O que eu tenho feito nos últimos tempos é usar o Alvorada para vários eventos, eu faço muitas reuniões lá no Alvorada. Agora, talvez até o fim do ano...
Jornalista: Mostra a piscina do Alvorada para o Michelzinho que ele vai querer morar lá.
Presidente: Acho que sim. É possível.
Jornalista: Aquela piscina é linda. O Fernando Henrique gostava muito daquela piscina.
Presidente: É, dizem que nadava muito, não é?
Jornalista: Nadava muito lá.
Presidente: É verdade.
Jornalista: O senhor costuma fazer exercícios também durante...
Presidente: Eu caminho.
Jornalista: Só caminha?
Presidente: Só. É a única coisa que eu faço.
Jornalista: Mas tem piscina no Jaburu também?
Presidente: Tem. Tem piscina. Tem piscina boa, até. Mas eu não nado não, sabe? Falta de hábito. Porque a natação é um exercício que movimenta todos os músculos do corpo, não é? É uma coisa útil. Eu confesso que não tenho o hábito.
Jornalista: Já que a gente está falando um pouco sobre a vida pessoal, eu gostaria que o senhor falasse um pouco sobre a sua infância no interior de São Paulo, em Tietê. Eu tenho uma certa nostalgia da minha infância no interior de São Paulo, em Amparo, das fazendas de café, da pracinha em frente à Igreja da Matriz, com o Coreto, eu peguei também essa vida no interior. O senhor foi um menino do interior?
Presidente: Fui. E não só do interior, como eu morava em uma chácara. Você sabe que eu morava, digamos assim, fora do perímetro urbano. Então, para ir à escola, eu andava uns cinco ou seis quilômetros. Acho que isso que me acostumou à caminhada. Eu andava lá. É interessante, até vou contar um episódio. Eu tinha um irmão mais velho, nós éramos oito irmãos, mas hoje somos apenas dois, e o acima de mim, eu era o último, ele era muito religioso, e ele me levou à missa, no primeiro dia eu tinha uns sete anos de idade. E lá, nos vitrais da igreja, em Tietê, tinha as virtudes, e uma delas me chamou atenção, era a temperança, eu fiquei com aquilo na cabeça, cheguei em casa, Mariana, peguei o dicionário do meu irmão, e fui ver o que era temperança. E temperança era equilíbrio, tempero, moderação. Às vezes as pessoas dizem: “Ah, você é muito conciliador, você reúne todo mundo”. Eu tenho a impressão que aquele ato religioso foi determinante para minha formação. Acho que a história do tempero, do equilíbrio, nasceu naquele dia, porque eu nunca mais me esqueci. Eu fiquei com isso na cabeça, fui ver o que era, e você vê que hoje, alguns anos depois, estou me lembrando disso.
Jornalista: E temperança, então, marcou?
Presidente: Foi o que me marcou.
Jornalista: E qual é o seu defeito então, presidente, pessoal?
Presidente: Acho que é não ousar demais. De vez em quando, até escrevi um dia, se eu pudesse, ousaria mais. Mas agora é tarde, não tenho mais como ousar.
Jornalista: Bom nunca é tarde. Deixa eu pegar aqui, “Anônima Intimidade”. Esse é o livro que o presidente Michel Temer escreveu, é um livro pessoal, como ele diz. Ele escreveu tantos livros didáticos ou técnicos, esse livro é pessoal. E o senhor diz: “Me leva para a adolescência, a idade dos 15, 16 anos”, por que te leva a uma fase mais romântica?
Presidente: É onde você ainda estava esperando muita coisa da vida, não é? Eu acho que por isso me recorda muito. Aliás, como eu tinha 15, 16 anos, eu achava sempre que ia ser escritor. Uma coisa curiosa, eu lia muito. Eu tinha uma professora de português, lá em Tietê não tinha livraria, mas tinha a biblioteca municipal, e a dona Sara Martins Bonilha era a minha professora de português e, naquele tempo, você fazia redação. Quer dizer, quando você estava na primeira série, não era como hoje, você dava redação, descrição, você escrevia muito.
Jornalista: Muito, de ficar com dor na mão.
Presidente: É, e ela lia as minhas narrações e disse: “Michelzinho, você precisa ler, vai à biblioteca, pega uns livros, etc”, e eu ia à biblioteca. Interessante, você sabe dos 11 aos 15 anos mais ou menos eu li todo o Machado de Assis, todo o José Alencar, o Joaquim Manuel de Macedo, confesso que sem muito aproveitamento. Porque uma coisa você ler o Machado de Assis hoje, outra coisa é ler nos... Mas aquilo deu uma informação. Então a ideia que eu tinha é que eu seria escritor, mas depois, curioso, eu vim…
Jornalista: Qual o seu autor preferido?
Presidente: Ah, eu leio muito, eu tenho muitos, tenho muitos, muitos brasileiros, Machado de Assis, eu acho que… Mas tem muitos, eu leio muitos autores estrangeiros.
Olha, há poucos dias eu estava na Índia e eu disse para o primeiro ministro, e ele não tinha lido, eu disse: “olhe, quem quer conhecer a história da Índia, lê um livro do doutor espanhol chamado Javier Moro, que escreveu um livro chamado 'O Sári Vermelho', que conta a história desde a Indira Gandhi que era filha de Nehru, do Rajiv Gandhi que era casado com uma italiana, Sonia Gandhi, e toda a história da Índia”. E depois escreveu, até um livro curioso, foi a melhor biografia que eu vi de Dom Pedro I. O mesmo Javier Moro escreveu um livro chamado "O Império é Você", é muito interessante. Mas eu leio muito.
Jornalista: Que livro o senhor indicaria para um estrangeiro que queira conhecer o Brasil? Por que eu tenho um amigo inglês que veio para cá e disse assim: “eu nunca consegui entender o Brasil e o brasileiro, até o dia em que eu li Macunaíma”, e eu fiquei chocada. Aí, eu falei: “nossa, você pegou muito pesado com a gente”. Mas essa foi a opinião dele. Que livro o senhor indicaria para um estrangeiro que traduzisse o Brasil?
Presidente: Se fosse em num determinado período eu indicaria "Casa-Grande & Senzala", de Gilberto Freyre. O livro do Caio Prado Júnior, "O Brasil Contemporâneo" [Formação do Brasil Contemporâneo], uma coisa assim, são livros que vão mostrando o que é o Brasil. Mas, ao mesmo tempo você pode pegar livros de um período, houve um período até que os militares participavam muito da política. Por exemplo, ler o livro do Lott, é um livro chamado “O Soldado Absoluto”, que dá história dele, dá muita a história do Brasil. Ler aquela trilogia do Lira Neto, o Getúlio, a vida de Getúlio indica muito o que é o Brasil. Você tem muitos livros, fora os livros de história. Mas livros, digamos, romanceados, mas que revelam o que é o Brasil. Acho que ele poderia abandonar um pouco Macunaíma.
Jornalista: Nesse livro o senhor tem alguma poesia que seja para a Marcela?
Presidente: Todas.
Jornalista: Todas? Ah, que legal. Deixa eu ver aqui. “Quando parei para pensar, todos os pensamentos já haviam acontecido”.
Presidente: É verdade. Tem um aí, que diz assim: “Percebido por todos, desapercebeu-se de si. Quando ele apercebeu-se de si, todos os desaperceberam”. São coisas assim.
Jornalista: Tem um ‘quê’ de pessoa aí, nessa. Deixa eu ver uma: “Entrelinhas. As linhas não valem, valem as entrelinhas, são as que leio quando escrevem ou quando falam. Nas linhas há máscara, entre elas a verdade”. Esse aqui é bom para a política, hein?
Presidente: É, porque você sabe que eu não levo em conta o que eu ouço, eu levo em conta o que o sujeito está falando, a intenção. Tanto que, muitas vezes, se diz: “Temer, eu tenho dois assuntos para tratar”. Eu digo: “vá logo ao segundo”. Porque o primeiro é sempre preparatório para aquele que é o principal. E é verdade isso, pode observar, quando alguém disse para você: olha eu tenho dois assuntos, pode ver. O primeiro, ele apresenta: “olha, você vai indo muito bem, você, que coisa extraordinária, etc”. Depois vem um segundo que é o que o trouxe a você.
Jornalista: Eu nunca…
Presidente: Então, vale as entrelinhas.
Jornalista: Eu nunca me importo muito com o que a pessoa diz, eu vejo mesmo o que ela faz.
Presidente: Pois é.
Jornalista: Também fico só observando.
Presidente: Tem que ver as entrelinhas.
Jornalista: Qual é a sua poesia mais romântica?
Presidente: Daí?
Jornalista: É.
Presidente: Acho que aí, tem uma chamado “O Relógio”, que é uma coisa que me recorda muito, porque eu morava naquela chácara, como disse a você, e lá havia um relógio. Quando eu era pequeno - faz tempo, não é? - já aquele relógio tinha uns 40 anos na parede da chácara, e quando eu me mudei para São Paulo, fiz minha vida em São Paulo, etc, meus pais faleceram, muitos faleceram, eu fui um dia à chácara e falei: “puxa eu vou levar esse relógio para minha casa em São Paulo”. Levei o relógio e botei na sala e curiosamente, toda vez que descia a escada, eu olhava para o relógio, eu achava que ele batia fraco, as batidas fracas como se tivesse triste. Disse: é interessante, ele deve estar triste, eu vou levar de volta para chácara. Daí eu levei para chácara, botei lá e daí senti que as batidas eram fortes, como naquela época. Ele me perguntava, quando descia: puxa, mas depois de 120 anos, na minha velhice, mudar de lugar?
Então quando voltou, parecia que as batidas eram fortes. Evidentemente, quando terminei essa historinha, esse poema, disse, será o relógio ou serei eu, não é?
Jornalista: Às vezes dá vontade de voltar para casa, não é? O senhor tem uma esposa mais nova, Marcela, bonita e que tem uma voz muito doce. Ela é uma moça romântica também?
Presidente: É. Para ela se apaixonar por mim, tem que ser romântica, não é? Mas ela é muito. Nós estamos casados há 14 anos e ela é muito suave e muito discreta, o que me agrada muito. E também confesso, todos dizem que ela é muito bonita, eu concordo. E me ajuda muito, com essa suavidade, com essa tranquilidade. Ainda agora, ela está, ela não tem cargo nenhum, de vez em quando dizem, o Temer está contratando a esposa, está contratando coisa nenhuma. Ela não tem nada aqui no governo, evidente, mas está ajudando o chamado Programa Criança Feliz, que trata de criança de zero a três anos.
Jornalista: E de que maneira ela o ajuda? Só com esse ambiente familiar suave?
Presidente: É, com ambiente familiar muito suave, o Michelzinho muito divertido, traquinas às vezes, aquilo ajuda muito, especialmente agora que mudaram para cá.
Jornalista: Presidente, eu gostaria de pedir ao senhor que autografasse esse livro para mim. Nós vamos lhe dar um livro de poesias do Fernando Pessoa. Ele tem uma coletânea que chama “Desassossego”, eu acho que combina bastante com essa posição. Essa é uma caneta que eu ofereço para o senhor, é uma tinteiro, tem que ser se ela está já com a carga, para o senhor assinar para mim. E essa é a coleção de citações e pensamentos do Fernando Pessoa, e esse é do "Desassossego", que eu acho que tem tudo a ver com o cargo do governo, ou com uma posição no Executivo, aqui no Brasil.
Agora, o senhor pensa em escrever um livro sobre esse período na Presidência?
Presidente: Você sabe que eu não penso muito nisso não, viu Mariana, eu penso, em, um dia, isto é verdade, quando eu parar eu quero escrever um romance.
Jornalista: Um romance?
Presidente: É.
Jornalista: Uau! Um romance policial ou só um romance romântico?
Presidente: Não, um romance que é, na verdade… É interessante, o primeiro livro que você escreve, aqui são poemetos, etc, mas o primeiro livro, isto eu verifico em todos os escritores, o primeiro livro é um pouco a repercussão da sua vida. O Saramago, por exemplo, quando ganhou o prêmio Nobel de literatura, ele fez um discurso curiosíssimo. Ele disse que ele foi criado pelos avós, que eram muito pobres, moravam em uma quinta lá em Portugal. E criavam porcos até, para poder sobreviver, e ele conta episódios… ele diz: olhe um dia eu vi meu avô abraçando as árvores da Quinta, perguntei, eu tinha seis anos de idade, perguntei o que ele estava fazendo. Ele disse: olha, eu estou me despedindo das coisas que eu mais gosto, porque eu vou embora logo. E ele morreu uma semana depois.
E daí ele conta que ele nunca foi autor dos personagens, os personagens é que o fizeram autor. E daí ele vai relatando a obra dele, mostrando quais os personagens que o fizeram autor daquela obra, etc, etc.
Então, digo eu, se eu conseguir escrever um dia, eu vou me recordar muito, desde os três anos de idade, e daí ficcionar, não é?
Jornalista: Da sua vida, da sua própria experiência, é. Dizem, também, que todo mundo tem um livro dentro de si. Dois pouquíssimos têm, mas pelo menos um, né? Que é o da vida, da própria vida.
Presidente: Que é o da vida. Você vê a Françoise Sagan, quando escreveu “Bom dia, tristeza”, era um livro maravilhoso, mas no fundo eram as sensações dela. Depois ela escreveu mais dois ou três, já não é a mesma coisa.
Jornalista: Presidente, muito obrigada. Obrigada pela entrevista. Falamos sobre o Brasil. Dos próximos anos e dos próximos meses. Que em 2018 a gente consiga ...
Presidente: A gente consiga ter novidades para fazer um novo programa.
Jornalista: O senhor é do PMDB, não é? Está bem na fita, como a gente costuma dizer. Muito obrigada. E mais uma vez agradeço muito.