Entrevista exclusiva concedida pelo presidente da República, Michel Temer, concedida à GloboNews - (29min02s) - Brasília/DF
Brasília/DF, 23 de março de 2017
Jornalista: Estamos agora aqui na sala do presidente. Eu estou lembrando, o presidente Lula gostava daquela mesa, o Itamar também. O senhor trabalha mais na mesa ou nessa?
Presidente: Trabalho mais naquela mesa.
Jornalista: Presidente, muito obrigado. Mais uma vez estamos conversando aqui, dessa vez no Palácio do Planalto. O Brasil meio de cabeça para baixo, não é, presidente? O Tom Jobim que dizia: “O Brasil já é de cabeça para baixo, o Rio Grande do Sul, ali, ta”l. Mas agora politicamente, essas coisas todas acontecendo. Como é que o senhor se sente?
Presidente: Eu acho que você disse uma verdade. E eu, muitas vezes, eu uso a mesma expressão dizendo o seguinte: “Nós precisamos reinstitucionalizar o País”. Porque muitas e muitas vezes, viu Roberto, o que há é uma divergência muito grande de instituições, de setores governamentais. E o que é preciso é sempre manter uma certa... manter uma harmonia que a Constituição determina. Não sou eu, não é o presidente da República que determina. E é importante que hoje, pelo menos eu posso dizer sem medo de errar, que cada poder exerce a sua função. O Legislativo, legisla; o Judiciário, julga, jurisdiciona; e o Executivo, executa. Então, esta definição de funções ajuda muito essa reinstitucionalização de que, me parece, o Brasil carece, não é?
Jornalista: Mas como governar com esse presidencialismo de coalizão, com 30 partidos, o senhor tendo que negociar com o Congresso todos os dias, é uma dificuldade, não é, presidente?
Presidente: Não é fácil. Mas você sabe que eu passei 24 anos no Parlamento, e lá eu fiz boas relações, não só relações pessoais, mas relações institucionais. Ou seja, eu tive a compreensão exata da importância do Parlamento para a democracia. Que muitas e muitas vezes se critica o Parlamento, como se critica no geral a classe política, não é? E acho que as críticas muitas vezes são fundadas, mas o que não se pode perder é a relação, volto a usar a palavra institucional, entre o Executivo e o Legislativo. Você veja que, tudo que nós conseguimos fazer nesse pouco tempo de governo, foi com o apoio do Congresso Nacional. Se não fosse um apoio decidido do Congresso Nacional, não teríamos produzido o que produzimos pelo País, volto a dizer, nesse curto período.
Jornalista: Agora, o senhor não acha que chegou o momento de se reinventar, não só a política, mas o senhor mesmo?
Presidente: Olha, eu acho que eu não me reinvento. Você sabe que muitas e muitas vezes, desde do tempo que eu estava na faculdade de direito, as pessoas diziam: “Temer, você precisa ser diferente, mudar o seu jeito”, etc.
Jornalista: Mas não é nesse sentido. É no sentido de, talvez, ser mais propositivo. Porque a população... veja pelas pesquisas, o senhor está bem com o Parlamento, mas com a população, há um distanciamento.
Presidente: Eu sei, eu compreendo perfeitamente isso por uma razão singela: é que eu não pratico atos populistas. Eu faço uma distinção entre o populismo e a popularidade. Quando você pratica atos populistas, são aquelas que agradam de imediato o povo. Mas que geram - eles são bem irresponsáveis -, porque geram um prejuízo posterior muito grande. A popularidade não, a popularidade ela depende do que você faz hoje para ser reconhecido amanhã.
Jornalista: Vai dar tempo? Porque o senhor tem pouco tempo.
Presidente: Vai dar tempo. Você sabe que nós temos tido o reconhecimento de muitas atividades que nós temos desenvolvido. Vou dar um exemplo para você, e digamos que é mais popular ainda. Não é populista, é popular. A questão da liberação das contas inativas do Fundo de Garantia. Dois efeitos isso causa. Um primeiro, são pessoas, milhões de trabalhadores que vão lá apanhar um valor, que estava lá paralisado, para fazer o acha que deva fazer, pagar a sua dívida, viajar, comprar alguma coisa, enfim. E de outro lado, nós injetamos, estamos injetando, quase R$ 40 bilhões na economia brasileira. Então, há fatos que vão sendo reconhecidos pouco a pouco. É o que chamam de atos populares do governo.
Agora, a história de você ser populista, não ser populista, reconhecimento, isso vem depois. Eu tenho um período curto de governo, como você sabe, um ano e oito meses, até não estou preocupado com um ano e oito meses, estou preocupado que lá na frente alguém diga: “Olha, esse Temer chegou lá no governo e botou o País no rumo certo.”
Jornalista: Isso para a história?
Presidente: Para a história. Que já me satisfaz.
Jornalista: Agora, o TSE não lhe preocupa porque há uma… acho ele deve julgar em abril, segundo se fala, e parece que as contas estão muito difíceis de separá-las, não é presidente?
Presidente: É. Em primeiro lugar, você sabe que naquela coisa da institucionalidade que eu estava dizendo a você no início, evidentemente qual seja a decisão do Judiciário, não apenas no TSE. Porque você sabe que há recursos dentro do TSE, eventualmente recursos do Supremo Tribunal.
Jornalista: O senhor fará os recursos necessários?
Presidente: Claro. Mas, quando o Judiciário decidir em definitivo, eu serei o primeiro a cumprir a decisão. Você sabe, você falou em contas separadas, nós temos, os meus advogados têm sustentado essa tese. Porque nós tínhamos, na verdade, contas separadas. Elas são julgadas em conjunto, mas as contas são prestadas separadamente, primeiro ponto. Segundo ponto, o que se discute lá é o problema da arrecadação, da validade, moralidade, ou invalidade, ou imoralidade, da arrecadação. Evidentemente que a arrecadação que veio para minha campanha, que é uma coisa modestíssima, cerca de 5% do valor da campanha, essa prestou-se contas, a arrecadação foi legítima, eu não saberia dizer como foi a arrecadação geral.
Jornalista: Presidente e essas acusações, todos os delatores, o senhor lá com o Yunes no Palácio, recebendo dinheiro, quero dizer, não no Palácio, mas recebendo depois. Como o senhor responde?
Presidente: É, o receber dinheiro é que não pode ser dito, não é? Porque na verdade muitas e muitas vezes o que acontece é o seguinte: o delator, ele menciona um fato, e acho que mencionado o fato, este fato há de ser apurado. E para ser apurado, você precisa indagar, inquirir, e isto se faz por meio de um instrumento chamado inquérito. E veja, Roberto, quando acontece isso, você tem um inquérito que primeiro é um inquérito administrativo, feito, no geral, pela Polícia Federal, nos casos da Lava Jato. Depois do inquérito, o promotor vai verificar se arquiva o inquérito ou se denuncia ou se pede o inquérito judicial. Quando ele pede o inquérito judicial -, no caso, quem tem foro privilegiado, ao Supremo -, o Supremo vai verificar se determina o inquérito judicial ou não. Determinado, é novamente feito, volta ao Ministério Público. E o Ministério Público vai verificar se denuncia ou manda arquivar. Se denunciar, a denúncia tem que ser aceita; se aceita, daí que começa o processo em razões, contrarrazões, etc. Isso é útil para o País? Eu digo: não. Esses fatos todos não deveriam acontecer. Quando se fala em reinventar, eu acho que nós podemos, sim, reinventar o modelo ético do País. Isto eu não tenho a menor dúvida.
Mas quanto ao problema judicial, ao problema processual, nós temos que esperar essas medidas de natureza judicial. E até acrescento, se me permite: como as coisas agora vão indo para o Judiciário, elas tomam um ritmo de muito naturalidade, porque daí você tem acusação, tem defesa, tem prova, contraprova. Eu acho que será útil para o processo.
Jornalista: Hoje, o procurador está denunciando mais nove ministros, quer dizer, dois terços do seu ministério. Aliás, eu não vou lhe provocar, mas eu acho que o senhor nem saberia me dizer o nome de todos os ministros que o senhor tem, que são tantos não é? Mas enfim, passemos. O senhor tem dois ministros muito ligados, o Padilha e o Moreira Franco. O Padilha eu sei que faz um papel muito próximo ao senhor, junto ao Congresso, e o senhor já estabeleceu que se o inquérito... se houver inquérito todos serão afastados. Isso não lhe atrapalha muito?
Presidente: Na verdade ocorreu o seguinte: primeiro, que são dois ministros que me auxiliam muito. Eles têm uma experiência política, administrativa e uma força governativa muito acentuada, primeiro ponto. Segundo ponto, é que em um dado momento, Roberto, eu resolvi estabelecer uma regra, qual é a regra? E volto à questão da denúncia, se em um dado momento...
Jornalista: … a virar réu, eu falei inquérito.
Presidente: ...até convenhamos, são dois momentos. Quando o Ministério Público denuncia, eu já afasto provisoriamente. Porque pode ser que a denúncia sequer seja aceita. Se aceita a denúncia e transformar-se em réu, daí eu afasto em definitivo.
Jornalista: Por enquanto são apenas investigados, não foram denunciados?
Presidente: Exatamente. Quando denunciados, há afastamento provisório. Considerados réus, portanto recebida a denúncia, afastamento definitivo.
Jornalista: Pensando nas crises que o Brasil já viveu, estou me lembrando aqui da alta inflação, e o Fernando Henrique alí com o Itamar, presidente, ele, o ministro da Fazenda, chamou aquele grupo da PUC, jovens, e fizeram o Plano Real. Foi uma reinvenção. O senhor está com uma equipe boa, mas gente antiga. O senhor não pensa buscar uma juventude, novas ideias, trazer coisas novas para lhe auxiliar?
Presidente: Olhe, você sabe que mesmo na área econômica, eu não vou chamar ninguém de antigo, porque o ministro é razoavelmente jovem, não é? Mas há uma equipe muito jovem na área econômica auxiliando o ministro Meirelles, o ministro Dyogo, no Planejamento, não é? E nas outras áreas de governo, Roberto, tem gente muito jovem. Você pega o ministro de Minas e Energia, você sabe quantos anos ele tem? 32.
Jornalista: A juventude às vezes está na cabeça.
Presidente: Exato. Aqui é o caso de juventude de que tem uma cabeça muito boa para governar. O Bruno Araújo, o Mendonça, são pessoas jovens com uma qualificação profissional, governativa, extraordinária, não é? Então, digamos assim, eu sei que é preciso chamar os jovens, porque eles muitas vezes redimensionam os fatos antigos. E é o que tem acontecido no governo. Se eu pudesse relacionar tudo que foi feito, você veria quanta coisa foi feita nesse pequeno período.
Jornalista: Agora, a crise na verdade, não é presidente? É uma crise política. Outro dia o senhor foi visitar o presidente Lula, uma visita de pêsames, mas conversaram de política, sobre política, porque é impossível dois políticos se encontrarem e não conversarem. Queria saber como foi a conversa. Eu sei que ele está à sua disposição. O senhor pensa em chamá-lo, ele, Fernando Henrique, esses que estão atuantes ainda, para que haja um pacto, mas enfim uma maneira de se passar esses turbilhões todos?
Presidente: Olhe, eu penso, Roberto, até por sugestão dele, ex-presidente Lula. Porque quando fui visitá-lo, eu tomei a cautela de ligar para o doutor Kalil e dizer: “Olhe, consulte o presidente Lula, se eu posso visitá-lo, ou se não convêm visitá-lo”. E ele disse que receberia com muito gosto. Até eu fui com vários ministros fazer uma visita. E na conversa que tivemos, ele disse: “Olhe, Temer precisamos conversar mais. Nós nos conhecemos há tanto tempo, conversar. O Fernando Henrique esteve aqui, demos um abraço. Acho que os ex-presidentes deveriam conversar.” Eu até tomei a liberdade, bati no joelho dele e disse: “Presidente, eu vou aproveitar essa sua oferta, porque é fundamental você trazer a experiência daqueles que já passaram pela Casa”. Num dado momento eu vou verificar se há essa disposição ou se a disposição continua, eu chamarei os ex-presidentes para governar. Não tenho a menor dúvida... para ajudar.
Jornalista: Quando o senhor disse que a transposição é do povo brasileiro, eu vi que ele não gostou muito. Na verdade, começou com Dom Pedro II. Fui ler outro dia, depois Getúlio Vargas. Mas foi o Lula que tirou do papel, a Dilma timidamente e o senhor está continuando.
Presidente: É. Convenhamos que é do tipo, uma coisa que tem acontecido muito no País, não é? As chamadas discussões inúteis, não é verdade?
Jornalista: Quem fez.
Presidente: … o que importa é que a água chegou lá. E quando chegou em Monteiro, no Rio Paraíba, que era um rio, digamos assim, já quase seco, foi uma coisa emocionante, porque aquilo virou um rio caudaloso. E eu vi a alegria da população de lá. Então, entra a discussão: ao invés de discutir a água que chegou lá; quem é o pai daquela matéria. O Lula fez o trabalho dele sem dúvida alguma. Como fez a ex-presidente Dilma, com menor intensidade, não é? Tanto que nós tivemos que chegar... e quando o ministro Helder Barbalho me comunicou que nós teríamos a chance de concluir o chamado Eixo Leste, que leva a água para Pernambuco e Paraíba, eu falei: “Vamos investir”. Investimos muitos milhões neste breve período para fazer essa inauguração. Agora, convenhamos, Roberto, aquilo... quem quiser ter a paternidade que tenha. Eu não invoquei paternidade. Eu invoquei a paternidade de quem realmente a merece, que é o povo. Porque eu disse: não existe um dinheiro que é público e um dinheiro que vem de impostos. Quando nós conseguimos fazer isto, foi porque vocês pagaram. Então, a paternidade é do povo brasileiro.
Jornalista: Presidente, nós não entramos ainda em um assunto em que essa semana gerou não só prejuízos ao País, quanto um escândalo nacional, que é a questão da carne. Queria saber como o senhor viu essa questão toda desde o anúncio e como está gerindo essa crise?
Presidente: Eu vi com certa tristeza cívica, viu, Roberto. Porque veja bem: nada como lidar com números, não é? Você tem - vou repetir o que eu fiz ao longo do domingo em várias oportunidades -, você tem 4.838 plantas frigoríficas no País. 21 foram, enfim, três interditadas e 18 ou 19, estão sendo investigadas, deste número expressivo que mencionei. Você tem 11.300 servidores no Ministério da Agricultura. A questão envolveu 28 ou 30 servidores que estão sendo investigados.
Então, essa matéria deveria ser levada em conta a sua porção mais diminuta. Vamos investigar, é punível, nós não estamos aqui dizendo que, se houver irregularidades não deve ser punido, ao contrário.
Jornalista: Espetacularizaram, o senhor acha.
Presidente: Isto é que não fez bem. Porque gerou um problema internacional. Você veja: eu próprio fui muitas vezes à China. Eu era o presidente da Cosban, Cosban é a Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível, e conseguimos introduzir a carne lá na China, pouco a pouco, na Rússia...
Jornalista: Uma luta!
Presidente: Foi uma luta. Não é só minha não. 20, 30 anos para que nós conseguíssemos manter um contato com 150 países que importam a carne brasileira. E vou dar um dado interessante que deve ser ressaltado: nesses seis meses houve 838 mil partidas de carne, de proteína animal, para os países. Você sabe que apenas 184 foram reexaminadas quando chegaram? Mas só no aspecto apenas burocrático. Não era questão sanitária. Questão de rotulação, de embalagem, nada mais do que isso. Então, de repente faz-se um espetáculo com este episódio, cria problema internacional. Você veja, nós exportamos para China, quase US$ 2 bilhões por ano. E a China suspendeu agora, por uma semana apenas. E apenas relativamente aos 21 frigoríficos.
Jornalista: O senhor mantém o apoio ao diretor-geral da Polícia Federal?
Presidente: Mantenho. Eu não vejo razão para tirá-lo... aliás, isso seria uma tarefa, digamos, do ministro da Justiça.
Jornalista: É que ficou meio… um episódio meio tisnado...
Presidente: Você sabe que, é interessante, o Osmar Serraglio foi deputado muito tempo. E eu sei como é deputado de uma região, como ele era lá do Paraná. Acontece uma coisa em um local qualquer, o sujeito liga para ele e diz: “deputado, está acontecendo isso aqui”, e ele como deputado, representante da região, liga para alguém, e diz: “olha o que está acontecendo aí etc, etc,”
Jornalista: Grande chefe.
Presidente: Grande chefe é uma expressão, enfim, cada um usa a expressão que deve usar. Que acha que deva usar. Mas então não há, digamos assim... e foi ruim divulgar como se fosse uma coisa criminosa. Quando ele, enquanto deputado, só fez uma coisa, digamos, representante daquela, do estado do Paraná.
Jornalista: Agora, este estilo no Brasil, dos parlamentares indicarem fiscais, essa promiscuidade com o Estado, não leva à isso, presidente?
Presidente: Não é bom. Tanto não é bom, que eu fiz aprovar uma lei de controle das estatais. Você sabe que até à minha gestão as indicações para a condução das estatais, eram todas indicações que poderiam ser até de políticos.
Jornalista: …acredito que até que lhe seguraram, porque o senhor queria indicar dois para...
Presidente: ... sim, que tinham militância política. E é proibido pela lei que nós fizemos aprovar. E portanto, logo foram... nós pedimos, vamos botar apenas técnicos. Todas as estatais foram ocupadas por pessoas sem... não sem qualificação administrativa, com muita qualificação administrativa, mas sem militância política.
Jornalista: Eu li essa semana um artigo do José Casado, que é um grande jornalista, falando que a Anvisa poderá ter problemas agora. É bom o senhor dar uma olhada nisso. Diz que tem 1.600 reclamações, produtos, remédios...
Presidente: É. Aí é um problema da burocracia. É um problema da burocracia que nós estamos tentando resolver.
Jornalista: Estas agências estão bem…
Presidente: De igual maneira. Eu vou dar um exemplo para você. O Instituto Nacional de Propriedade Industrial, há um número infindável de pedidos de patentes. O ministro Marcos Pereira, quando assumiu, examinou esse aspecto e me disse: “Olhe, lá há pedidos de patentes há mais de dez anos.” E como a tecnologia hoje é muito avançada, o que acontece é que se der a patente hoje, já não vale mais. Porque a tecnologia avançou tanto, que aquela patente, o pedido de patente, perdeu o significado. Nós acabamos de colocar mais 140 pessoas lá, para analisar rapidamente esses pedidos.
De igual maneira na Anvisa. Você sabe que eu sei, chega a mim, a demora muitas vezes das aprovações. Há até uma ideia, mera ideia, que está sendo simplesmente examinada, por enquanto - porque hoje quando a gente diz uma coisa, a pessoa diz: “O presidente disse que…”-, e eu estou dizendo que é uma mera hipótese que há de ser examinada.
Jornalista: Aliás, no Brasil, tudo cai na cabeça do presidente. O presidencialismo é muito forte neste sentido.
Presidente: Mas tem que ser assim, a cultura é essa, vamos enfrentá-la, não é? Uma das hipóteses seria nesses países bastante avançados, que exigem rigorosos testes. Se o remédio já foi aprovado nesse país, talvez pudesse ser utilizado aqui até uma fiscalização feita pela Anvisa. É uma mera hipótese que está sendo examinada.
Jornalista: Presidente, entrando um pouco nas curiosidades. Se divulgou que o senhor conversou com o presidente Trump pelo telefone, ele disse assim: “Quando você estiver aqui em Washington, passa aqui.” É uma forma meio estranha, né, de diplomacia.
Presidente: Mas ele disse mais...
Jornalista: Lá no Rio a gente fala muito “passa lá em casa”. Mas não é para passar quando fala assim.
Presidente: Mas ele disse mais. Ele disse o seguinte: “Quando quiser me telefone e eu tomarei a liberdade de lhe telefonar. Porque eu quero muito ter um contato muito próximo, naturalmente com o Brasil, com você, com os empresários brasileiros”. Anteriormente, havíamos trocado aí o primeiro telefonema, eu que dei a ele, quando ele venceu as eleições, e nós acordamos que proximamente iríamos fazer uma reunião de empresários brasileiros com empresários americanos. Mas de fato ele disse: “Olhe, quando vier a Washington, nós vamos estar juntos”. Eu disse: “Presidente, quando achar conveniente, os nossos diplomatas ajustarão”.
Jornalista: Não há viagens marcadas, não é?
Presidente: Não. Neste momento nada marcado.
Jornalista: Nas curiosidades ainda, o que que houve com o Alvorada? O senhor saiu em uma semana. Foi rápido.
Presidente: Você sabe que eu primeiro, claro...
Jornalista: Deixaram fantasmas lá?
Presidente: Não. Você sabe que nos primeiros quatro meses eu era interino, eu tenho seis meses de presidente efetivo. Portanto, nem cogitei disso, primeiro ponto. Segundo ponto, resisti muito a ir para lá porque eu estava muito habituado ao Jaburu.
Jornalista: O senhor gosta do Jaburu.
Presidente: Gosto muito. E depois, quando insistiram muito, que eu deveria por uma questão, digamos assim, simbólica, eu acabei indo. Mas confesso a você: nós estranhamos muito, eu fiquei uma semana lá, quase três noites sem dormir. Aí eu disse: “Olha, é melhor voltar para o Jaburu e eu deixo ao Alvorada para recepções, jantares, encontros políticos, não é?” E estou muito feliz lá no …
Jornalista: O senhor é supersticioso?
Presidente: Eu não sou supersticioso, mas também não deixo de acreditar em certas energias. Aquela velha história das bruxas… que las hay, las hay.
Jornalista: Quer dizer, o senhor não se sentiu bem lá. Tinha um clima…
Presidente: Não, não me senti à vontade. Confesso. Talvez pelo tamanho do Palácio, sabe? Se fosse... não quero dizer que seja modéstia minha, se fosse pelo deslumbramento, eu ocuparia o Palácio. Maravilha, uma coisa enorme, cheia de, enfim, possibilidades, facilidades, mas eu preferi ficar no Jaburu, que é uma casa, eu me sinto mais confortável lá.
Jornalista: O senhor vai muito a São Paulo, é a sua terra, o senhor viveu sempre lá, é cercado ali por uma elite, pessoal da Fiesp. O senhor acha que são bons conselheiros?
Presidente: Olhe, eu acho que é preciso ouvir a todos. Tanto que, embora você falou em Fiesp, etc., eu ouço muito os empresários. Como ouço muito os sindicalistas. Ainda ontem, tive uma reunião aqui com o pessoal da Força Sindical. Ouço todos os setores. Porque o diálogo é a peça fundamental para o nosso governo. Acho que já tive a oportunidade em conversas individuais de lhe dizer isso. O que me ajuda muito é o diálogo. Diálogo que eu mantenho com o Congresso, diálogo que eu mantenho com setores sociais, é o que ajuda a governar. Se você se encastelar aqui, você não consegue saber o que está acontecendo no País.
Jornalista: Não falamos das reformas ainda. Não é? Previdência, parece que já houve aí um certo, começou a entrar água aí no que o senhor queria, não é? Não é fácil negociar Previdência. Aliás, há muita notícia: vão tirar os trabalhadores, direitos adquiridos. Como é que o senhor...
Presidente: Uma boa pergunta que você me faz, permite-me esclarecimento. Primeiro ponto é o seguinte: você se recorda que desde o momento que eu tomei posse, eu queria muito prestigiar a autonomia dos estados. Porque eu sempre sustentei que nós temos uma federação capenga, uma federação de pé quebrado. Ou seja, os estados não têm autonomia suficiente e nem pode exercitá-la. Por que é que eu fiz ao longo do tempo? Vejam, o primeiro passo foi, exata e precisamente, a questão da dívida, renegociação da dívida dos estados. Eu falei: “Vamos renegociar”. Aquilo estava rodando aqui, Roberto, por dois anos, não se solucionava. Nós renegociamos com grande vantagem para os estados. Entrou a história da repatriação; a multa deve ser dividida? Vamos dividir com estados e municípios. Tudo isso, atento ao princípio federativo.
Eu só falhei num ponto: quando nós mandamos a reforma da Previdência, nós invadimos uma competência do estado membro da federação…
Jornalista: Por isso o senhor tirou as professoras, agora…
Presidente: Tirei tudo aquilo que é administração estadual, é a chamada competência residual do estado. Aliás, uma das poucas competências que o estado tem. Ora bem, quando você fixa que em nível federal, em nível constitucional, uma determinação para o estado agir desta ou daquela maneira em relação à Previdência Social, você está interferindo na autonomia do estado. Eu me dei conta disso, primeiro, sob o foco jurídico; e sob o foco político, eu percebi que os deputados e senadores, com que eu tenho mantido muitas reuniões para aprovar a Previdência, me diziam: “Olha, a pressão vem dos servidores locais, e isto é uma matéria do governo local”.
Então, ontem eu declarei: olhe aqui, esta matéria fica por conta dos estados, e por uma razão singela: há estados que já fizeram a reforma previdenciária, há estados que não querem e não precisam fazer, e há estados que querem fazê-la. Então, o estado é quem decidirá, de acordo com as peculiaridades locais… isso facilita muito, se me permite, a aprovação da reforma previdenciária que, no plano federal... porque a nossa questão é questão federal, portanto, o déficit é federal. Eu perguntei para o Meirelles antes, para a área econômica: isto embaraça o ajuste fiscal? Zero, não há embaraço nenhum.
Jornalista: O senhor disse que gritam mais os que ganham mais. Mas não é bem assim, os mais fracos sempre acabam perdendo, não é, presidente?
Presidente: Porque são influenciados. Por uma razão singela: você sabe que nós temos cerca de 60%, 63% de … até lamento dizer, mas são pessoas que ganham o salário mínimo. E o mínimo da aposentadoria é o salário mínimo. Então, você já tem 63% que ganham o máximo, primeiro ponto. Segundo ponto, os que ganham mais, costumam dizer que é preciso trabalhar 49 anos para poder se aposentar. Data vênia, é falso. É falso pelo seguinte: você quando tem o mínimo de 25 anos de contribuição, você pode se aposentar com 65 anos. Daí, você se aposenta com 51% mais 25 [%]. Você parte de 76%. Se você trabalhou 35 anos, você já vai para mais dez pontos.
Jornalista: O que não pode é acontecer como acontecia antes - inclusive o senhor que se aposentou cedo -, todo mundo se aposentava muito cedo.
Presidente: É. Eu costumo dizer, eu sou exemplo claro de como a precocidade é prejudicial para o sistema da Previdência. Porque olha aqui, passados 20 anos… nós estamos aqui trabalhando. Você é muito mais jovem, mas eu estou aqui trabalhando. Você vê como a precocidade é... Embora eu tivesse cumprido todos os requisitos da época, evidentemente. E mais ainda, na época, a expectativa de vida era muito menor. A expectativa de vida aumentou muito. O que é uma das razões para a reforma previdenciária.
Jornalista: Está uma discussão muito grande sobre a questão da reforma política. As tais listas, já está tisnada, não é, presidente? Porque está todo mundo achando já, na sociedade, que querem fazer as listas para que os deputados, senadores, os que já têm mandatos, os que estão sendo investigados, continuem. Qual é a sua opinião sobre a reforma política?
Presidente: Você sabe que há tempos que eu sustentei sempre o chamado distritão, ou seja, voto majoritário para a eleição de deputados federais representando os estados. Esta tese não passou no Congresso Nacional. E neste momento, quando se pensou na lista, eu até não tenho tanta simpatia pela lista fechada ou a lista modelada... mista, que seja, porque, na verdade, não há mais financiamento público de campanha. Então, quando as pessoas pensam na lista… dizer: olha, é preciso um dinheiro público, e o dinheiro público só pode estar conectado, só pode se juntar à ideia de uma lista de candidatos. Portanto, o dinheiro vai para o partido. Mas eu senti, você tem razão, que há muita resistência a isso. Se eu pudesse - não quero também ingressar nas questões do Congresso Nacional -, mas eu pudesse dizer, eu diria: a melhor fórmula é a fórmula do voto majoritário. Agora, reitero, a manter-se a impossibilidade de qualquer contribuição e a levar-se adiante…
Jornalista: Mas isso é um problema. Como é que vai se fazer a campanha?
Presidente: …como é que vai fazer campanha… a levar-se adiante a ideia de um fundo público, esse fundo público só pode se destinar a partidos e não a candidatos.
Jornalista: Chegamos a 2018?
Presidente: Espero que sim. Eu, por mim eu tenho certeza que sim. Evidentemente... eu sempre exerci, Roberto, tarefas difíceis, ninguém nunca me entregou uma tarefa fácil.
Jornalista: Quer dizer, o senhor não é fraco como a presidente Dilma falou?
Presidente: Não. Se eu for fraco e consegui fazer o que eu fiz pelo País, eu prefiro ser fraco do que ser forte. Porque os que se dizem fortes destruíram o País. Então, nesse sentido, eu prefiro a fraqueza à fortaleza. Mas fraco eu não sou não. Você sabe disso, você acompanhou a minha vida, eu fui secretário da Segurança Pública duas vezes em São Paulo, graças a Deus, com muito sucesso. O que significa fortaleza. É que as pessoas confundem, sabe o que é, educação cívica, educação pessoal com eventual fraqueza. Eu não vou mudar meu jeito não. Sempre deu certo assim, eu vou continuar assim.
Jornalista: Presidente, muito obrigado.
Presidente: Obrigado a você.
Ouça a íntegra da entrevista (29min02s) do presidente.